“Badiu” de Dino D`Santiago apresentado na Praia

PorDulcina Mendes,4 dez 2021 8:25

O artista cabo-verdiano Dino D`Santiago esteve em Cabo Verde para fazer a apresentação do seu mais novo disco intitulado “Badiu”. A apresentação foi primeiramente feita na cidade Praia e só depois disso é que será apresentado no resto do mundo.

A apresentação do disco aconteceu no dia 20 de Novembro no Palácio da Cultura Ildo Lobo, na cidade da Praia, num ambiente de muita alegria. O disco, esse, foi disponibilizado nas plataformas online no dia 26 de Novembro.

O Expresso das Ilhas esteve na apresentação e falou com o artista sobre esse seu novo trabalho discográfico.

Dino D`Santiago conta que a escolha do título “Badiu” foi uma decisão muito importante. Inicialmente teve receio que as pessoas não entendessem que não era para separar a nação crioula entre “badius” e “sampadjudos”, barlavento e sotavento, mas explicar a origem do “badiu”.

“Dessas pessoas escravizadas que saem da zona da Gâmbia e Senegal e que vem para este pedaço de chão, mais propriamente, para a Cidade Velha e que, devido aos ataques dos piratas que aconteceram esses homens conseguiram fugir e foragir no interior de Santiago a quem se deu o nome depreciativo de ‘badiu’, uma adulteração de vadio no sotaque do Norte de Portugal, que era o do grupo populacional português que habitava a ilha. `Badiu’’ é, assim, um termo historicamente depreciativo mas que a partir do século XX foi sendo reapropriado e promovido a símbolo de resistência nacional e orgulho”, conta.

Dino destaca que o disco veio para resgatar essa história onde o batuque e o funaná continuam a ser o centro. “E o que outrora foi considerado música do diabo e, por isso, proibida, hoje é dançada e cantada por todo o lado fora de Cabo Verde. Sinto, contudo, que as pessoas precisavam conhecer a história e perceber que o que dançam sem qualquer preconceito outrora foi censurado e foi um som de resistência e de resiliência do nosso povo. Daí essa homenagem à jornada do povo “badiu”.

Para além de pretender valorizar a história do badiu, o artista homenageia o filho Lucas e a avó. “Para mim é sempre mais verdadeiro quando consigo contar as histórias na primeira pessoa, do que vivi e experienciei. Senti as crenças de uma família, numa educação bastante severa e que, dentro das suas limitações, soube dar muito amor e conduzir-me a um futuro onde posso escolher o que quero ser. É assim que fiz questão de homenagear a minha avó e o nascimento do meu filho. E sinto-me feliz por isso”.

O artista conta que sente que “Badiu” é um disco onde mostrou a sua vulnerabilidade, “mas graças ao acompanhamento da minha Psicóloga e do meu Terapeuta de Desenvolvimento tive coragem para trazer assuntos que em outra altura não traria porque é sempre difícil quando mostramos a nossa vulnerabilidade”.

O disco nasceu durante a pandemia e Dino confidenciou-nos que ficou durante um mês numa casa na zona de Sintra, juntamente com os produtores, músicos e alguns amigos a escrever as canções, e dessa experiência surgiram 37 temas dos escolheram 12, “os que honravam o `badiu` e sinto que a história está bem contada”.

E ao contar a história do ‘badiu’, Dino não esqueceu do pano de terra, cuja fotografia reproduz na capa do álbum, “algo que também representa esta resistência e resiliência, o simples pano de terra que tem uma história incrível”.

“É bonito personificar a história do disco com o pano de terra porque esse pano também carrega uma carga simbólica e é o reivindicar de algo que também um dia nos foi tirado. Eram corpos negros a serem comercializados em troca de tecidos, panos e especiarias, e isso simbolicamente é forte e trágico, mas prefiro olhar para a história com os pés no agora e no que posso fazer para mudar o futuro”, sublinha.

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Nascimento do filho Lucas

Conforme nos conta, sempre sonhou com esse dia pois sempre quis ser pai. “Foi um sonho, quando o Lucas nasceu percebi que aquilo era muito mais do que uma ansiedade do que uma necessidade de cumprir um calendário, então quando ele veio – não pude assistir ao nascimento dele por causa da pandemia – e foi para casa é amor todos os dias”.

“É nele que penso, quando penso no futuro da humanidade e no que quero deixar como legado. Quero aprender com ele e mais do que ensiná-lo alguma coisa, quero aprender, porque as crianças vêm com uma missão e vêm sem filtros. O sim e o não de uma criança são sempre verdadeiros e sem condição”, salienta.

E explica que está a aprender a viver novamente, a olhar para os reflexos da verdade que o seu filho transmite.

Com 12 canções, o disco traz estilos como batuque, funaná, tendências de sons que saem de África, um pouco de zouk, sempre de um prisma de fusão entre o tradicional e os sons contemporâneos e os ritmos que são nossos.

O disco contou com a produção de Branko, Toty Sa’Med, Tristany, Sirscrach ou Valete, participações vocais de Slow J, Lido Pimenta, Rincon Sapiência e Nayela.

Para Dino D’Santiago, a música só faz sentido se sair lá do fundo e se reflectir o que vem na alma e a forma como sentimos a vida.

Shows

O show de apresentação deste disco será no dia 2 de Abril de 2022, no Coliseu de Lisboa. Mas a primeira apresentação aconteceu na terra dos pais. “Agora sabendo que Cabo Verde ouviu primeiro que o resto do mundo cumpre a narrativa do disco, não podia ser melhor. Não podia ser em outro espaço e nem em outra ilha, e simbolicamente no Palácio da Cultura Ildo Lobo estou feliz”, conta.

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O artista avisa que o show em Cabo Verde também será em 2022, mas ainda não sabe ao certo em que trimestre, “será no trimestre que todas as condições estiveram reunidas para poder trazer todas as pessoas que estiveram comigo, nessa caminhada”.

Este disco inspirado na jornada do povo “badiu” do interior da ilha de Santiago, traz temas como “Badia”, “Lá Fora”, “Voei de Mim”, “Lokura”, “Esquinas”, “Nha Kodê”, “Utopia”, “Gentis Grandi”, “Corvo”, “Txuputi”, “Kretcheu” e “Pé Ratxadu”.

Um dos 100 afro-descendentes influentes do mundo

Dino confessou que foi uma surpresa saber que é um dos 100 africanos mais influentes do mundo, porque não estava à espera desse reconhecimento. “Para mim foi uma surpresa, como é que um escritório em Nova Iorque ligado à ONU está atento ao que nós estamos a fazer, foram incríveis”.

E contou que recebeu uma carta, logo pensou que era para inscrever para assistir a algum evento ou outra coisa qualquer, mas quando abriu e começou a ler, “disse uau, então enviei lhes um email a perguntar se realmente tinham certeza disso e responderam que sim, foste mesmo reconhecido pelo grupo de júri, e fiquei muito feliz”.

“Já imprimi para deixar com os meus pais, penso muito nos meus pais e no Lucas, porque no fundo são a minha família mais próxima. Penso que os nossos pais passaram para nos criar, e de repente o filho tem este reconhecimento. Então dedico esse reconhecimento a eles. Estou mesmo abençoado dos pés à cabeça”, conta. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1044 de 1 de Dezembro de 2021.

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Autoria:Dulcina Mendes,4 dez 2021 8:25

Editado porDulcina Mendes  em  6 set 2022 23:27

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