A promoção do livro exige um esforço contínuo, mas não é necessariamente visível – Ana Cordeiro

PorAntónio Monteiro,23 abr 2022 4:14

Ana Cordeiro, Coordenadora do Plano Nacional de Leitura
Ana Cordeiro, Coordenadora do Plano Nacional de Leitura

O Dia Mundial do Livro e o Dia do Professor Cabo-verdiano que se assinalam este sábado, 23, deram mote a esta conversa com a Coordenadora do Plano Nacional de Leitura. Para Ana Cordeiro estas duas efemérides estão intimamente relacionadas, pois, na sua perspectiva, não se consegue promover o livro sem apoio dos professores.

A Coordenadora do Plano Nacional de Leitura (PNL) começou por dizer que se mostra avessa à comemoração de dias nacionais e internacionais, defendendo que os assuntos devem ser trabalhados de uma forma contínua, às vezes até pouco visível, enquanto que a comemoração dos dias dá muita visibilidade a um assunto, mas são esquecidos logo a seguir. “Às vezes o efeito é o contrário daquilo que nós pretendemos. Portanto, todo o trabalho que envolve o livro, a educação, a formação de professores, a propriedade e a produção intelectual são áreas que exigem um esforço contínuo, permanente, mas que não é necessariamente visível”.

Entretanto, reconhece que até agora houve pouca divulgação do PNL, lançado oficialmente no mês de Março último numa cerimónia presidida pelo ministro da Cultura e das Indústrias Criativas, Abraão Vicente, e pela Secretária de Estado para o Ensino Superior, Eurídice Monteiro.

“Está a falhar um elemento essencial do Plano que eu penso que estará pronto muito brevemente que é o site do PNL de Cabo Verde. É um dos elementos fundamentais deste Plano a existência de um site que seja, de facto, o polo divulgador de informações, de sugestões, onde as actividades do próprio Plano poderão ser divulgadas”, esclarece.

Neste site vão constar uma série de elementos informativos e também uma área de recurso. “Nós queremos que o site seja para os professores e para os pais um lugar onde podem obter informação e sugestões de leitura. Queremos que nesse site se comece a criar a primeira biblioteca digital cabo-verdiana. É um site que, ao crescer, irá divulgar as actividades que são feitas, colocar em rede projectos importantíssimos que existem, e que as pessoas nem sabem que eles existem. Portanto, acho que vai ter um papel importante na dinamização das actividades de leitura”, indica a Coordenadora.

O que é o Plano Nacional de Leitura?

O Plano Nacional de Leitura – Cabo Verde 2020-2030 tem à partida o objectivo de aumentar a literacia entre os jovens e promover bons hábitos de leitura transversalmente em todas as faixas etárias. Trata-se, porém, explica Ana Cordeiro, de um trabalho continuado, pois “os planos nacionais de leitura são planos para toda a vida. É um trabalho que nunca acaba. O que se vai estabelecendo são prioridades diferentes”.

“É um trabalho que nestes primeiros 10 anos estabeleceu-se como prioridade o trabalho com crianças sobretudo do ensino básico, porque é um trabalho que tem que ser feito nas escolas e com o apoio dos professores. É evidente que isso não exclui que se trabalhem outras áreas, outras faixas etárias, mas a prioridade é esta. E é um trabalho que vai ser menos visível, porque vai ser feito nas escolas”.

Um trabalho em rede

Conforme o documento-base, o PNL é um trabalho em rede de Escolas, Rede de Bibliotecas Escolares, Rede Pública de Bibliotecas e um dos seus pontos fortes é o trabalho com as bibliotecas municipais. “Nós queremos envolver as bibliotecas municipais neste Plano. Queremos criar a figura da Biblioteca amiga do Plano Nacional de Leitura, sendo elas também a promover actividades em conjunto com o Plano”.

Entretanto, como dá conta o mesmo documento, o PNL assenta numa realidade sócio cultural que, se por um lado, será o seu suporte, por outro, é a imagem dos constrangimentos e falhas que o Plano deve ser capaz de superar.

Entre os constrangimentos, o estudo refere que a rede de bibliotecas no país é ainda muito reduzida, não apenas em termos quantitativos mas, sobretudo, no plano qualitativo, pela qualidade dos acervos e tipos de serviços que as bibliotecas conseguem oferecer. “A rede é constituída pela Biblioteca Nacional de Cabo Verde, pelo Arquivo Histórico e pelas Bibliotecas Municipais (BM). A estas dezassete bibliotecas (algumas serão mais propriamente salas de leitura) podemos acrescentar uma meia dúzia de bibliotecas dependentes de Centros Culturais e algumas salas de leitura comunitárias”, lê-se no documento.

Rede de Bibliotecas Escolares

Vários estudos têm demostrado que as Bibliotecas Escolares (BE) têm contribuído para debelar as assimetrias culturais e sociais, facilitando o acesso ao livro a todos os alunos.

Entretanto, se em Cabo Verde praticamente todas as Escolas secundárias possuem BE, elas padecem de vários constrangimentos que vão desde a falta de pessoal, pobreza do acervo, falta de mobiliário e, essencialmente, ausência de uma política pedagógica que potencie a sua utilidade e importância. Por isso, algumas estão fechadas.

Neste sentido, Ana Cordeiro anunciou que o PNL já definiu as áreas de foco do Plano e uma delas é a Rede Nacional das Bibliotecas Escolares. Este projecto continua a ser implementado com o apoio da Cooperação Portuguesa e do Ministério da Educação que está a formar professores, bibliotecários, mas ainda existem no país poucas bibliotecas escolares. Desta colaboração, salienta a Coordenadora, já foram implementadas doze Bibliotecas Escolares em instituições do Ensino Básico.

Professores sem hábito de leitura

Outro handicap com que se depara a implementação do Plano Nacional de Leitura no ensino básico e pré-escolar, que é o ponto de partida do PNL, é a necessidade de se trabalhar com professores que fizeram toda a sua carreira escolar praticamente sem terem lido um livro, como nota Ana Cordeiro. “E até mesmo sem terem lido manuais escolares. Há uma geração aqui em Cabo Verde que até falta de manuais escolares teve. Estudavam por apontamento. Portanto, esta geração que praticamente fez toda a sua formação sem contacto com o livro tem dificuldade em trabalhar o livro”.

Projecto Balaio da Sophia

Por isso é que no projecto Balaio da Sophia, que é um conjunto limitado de livros, mas com vários exemplares do mesmo livro para que na sala de aula todas as crianças tenham os livros, os balaios são acompanhados de uma série de sugestões de leitura e de actividades para o professor realizar na sala de aula. “Nós sentimos que eles precisam desse apoio. E uma das coisas que o site precisamente prevê é ter gravada acções de formação sobre actividades de leitura em sala de aula. Portanto, ter também esse lado formativo para apoiar os professores”, conclui Ana Cordeiro. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1064 de 20 de Abril de 2022. 

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Autoria:António Monteiro,23 abr 2022 4:14

Editado porAntónio Monteiro  em  24 abr 2022 10:17

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