Pois é, Carlos. Claramente. Eu escolhi entrar.
Nela seguimos caminho, e vamo-nos cruzando com várias pessoas que como nós fizeram tal escolha.
Há os com que nos aproximamos mais e que para além de partilharmos o mesmo estado-música, acabamos por acrescer-lhe a amizade.
Chalo Correia, foi claramente um dos que escolheu entrar na tal estrada – cruzamo-nos, conhecemo-nos em Cabo Verde, partilhamos momentos musicais em conversas, trabalhos e festivais.
Vive a música, mas sobretudo a sua Angola musical, dos Sembas, Kazukutas e de toda a herança deixada pelos “Cotas” que vai pesquizando, rebuscando e nelas se vai baseando para moldar o que faz.
Chalo Correia tem mais de 20 anos a cantar, sozinho ou em grupo, mas sempre acompanhado do seu violão e harmónica, nunca deixando de parte os instrumentos tradicionais angolanos como a Dikanza – dos quais fala com propriedade, desde as suas sonoridades e origens até à maneira como são construídos.
Por entre palcos, festivais, pesquisas e muita conversa “com os mais velhos” lança o seu primeiro álbum “Kudihohola” só em 2015. Basta ver um espetáculo do cantautor e percebe-se o porquê de algum tempo sem gravar. Chalo para além do concentrado de informação que traz sobre a música, é um comunicador nato. Quando em palco, os dois abraçam-se e o resto é viagem que, entretanto, já tem também o público arrebatado e com ele a celebrar as sonoridades de Luanda e outras zonas mais que o músico vai deixando em cada momento… e são vários e diversos. Engolem o tempo.
Da experiência – a ligação com a qualidade e o disco começam a trazer os prémios e nomeações mais mediáticos ao músico: no ano seguinte vale a nomeação para concorrer em duas categorias, sendo uma delas a de melhor música popular, nos prémios da Angola Awards Music realizado em Luanda.
Em 2017 continua a produção discográfica e lança “Akuá Musseque”, que na altura já me tinha despertado muita atenção, tendo eu deixado neste espaço, o seu destaque.
À imagem do primeiro álbum, voltam os prémios e nomeações no “Angola Music Awards” só que em cinco categorias.
Apesar do reconhecimento, também da indústria musical mais “mainstream”, o compositor, cantor, músico instrumentista não foge à linha por ele traçada mais de duas décadas antes, tornando-se cada vez mais marcante o seu papel de promotor da cultura angolana.
Lançou no ano passado o seu mais recente trabalho de originais – “Dibessá”. O disco resulta numa viagem sonora aos ritmos que se tocavam ao vivo em Luanda nas décadas de 60 e 70.
A sonoridade do cantautor vem se mantendo um considerável legado inspirado nos “Clássicos de Angola” como: Ngola Ritmos, David Zé, Urbano de Castro, Kiezos, entre outros.
Músicas das décadas de 60 e 70 influenciam-no na criação de uma marcante abordagem de forte base tradicional, numa linguagem muito peculiar e essencialmente acústica. Inclusive, rodeia-se ainda, quando toca em formato grupo, de conhecedores dos ritmos abordados, como é o caso do percussionista Galeano, falecido há pouco tempo. Vai mais longe quando também recorre a músicos portugueses e também partilha ritmos, como é o caso de João Mouro – a guitarra que trabalha com frequência com Chalo.
Nos seus temas tem a harmónica como a sua imagem de marca, é deste instrumento que o seu som se define particularmente enquadrado nos estilos musicais da sua terra natal e por entre a Kazukuta, Kilapanga,Merengue e o Semba segue estrada, adaptando-se naturalmente a alguma contemporaneidade necessária.
Chalo está durante a primeira semana de Agosto em Cabo Verde, e espero que leve nuances musicais daqui, e que um dia num dos seus trabalhos ainda haja ritmos tradicionais de Angola e Cabo Verde juntos em trabalhos criados.
A tal estrada-música continua Chalo, e a tua missão também. Foi escolha tua.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1079 de 3 de Agosto de 2022.