Velô – a criatividade sem idade, em cultura e posteridade

PorPaulo Lobo Linhares,15 ago 2022 7:57

Há muitos anos atrás, quando os aniversários não eram comemorados em restaurantes, mas sim nos quintais das nossas casas, onde se misturavam avós, filhos e netos de todos os amigos e as festas terminavam inevitavelmente em tocatinas, uma me terá ficado ainda hoje na lembrança. Teria eu pouquíssimos anos e a festa era em casa do meu avô.

Havia violões e quem cantava era o nosso Primo Ildo Lobo. Por entre várias músicas, ficou-me marcada uma que falava em “morar na filosofia”… e “fazer rimar amor e dor”…. também falava qualquer coisa de “botei na balança e na peneira…”. Obviamente que não percebia nada do que era dito, mas o certo é que a música me acompanhou vida fora.

Pois é… a única coisa que sabia e percebi da música é que era cantada pelo Ildo, com uma cara muito séria e sentidamente embalado, pelo que para mim… deduzi ser uma música importante por algum motivo.

E foi. Com o passar dos anos vim a perceber que a tal música era afinal um tema de um dos discos da minha vida. O disco chama-se “Transa” e quase tem a minha idade. O compositor, músico e instrumentista que fez o disco passou também a ser meu “amigo”. Só que com ele me cruzei uma vez, num pós-espectáculo, mas ele não imagina o quanto já falamos… muito e muitas vezes. Já foram horas infindáveis onde ouço o que ele diz. Continua a ser.

Fez no dia 7 de Agosto 80 anos e chama-se Caetano Emanuel Viana Telles Veloso… Caetano Veloso, Caetano, Velô, enfim… um dos que me ensinou a perceber que a palavra “génio” pode estar bem juntinho de nós e facilmente traduzível pelo “normal” – algo que quase diariamente está por perto.

Foram já alguns os artigos que deixei neste espaço a falar de Caetano. Lembro-me que o último foi sobre o seu mais recente disco: “Meu Coco”. Mas se viesse aqui falar de discos seria mais complicado, pois cada um deles tem para mim uma estória e muitos a história. Qual escolheria?… a doçura pré-tropicalista de “Domingo” ou a própria revolução tropicalista de “Tropicalia: Panis et Circencis”? “Caetano e Chico” ou “Maria Bethania e Caetano Veloso”? ou “Dois amigos” (obviamente com Gil) ou o “Ofertório” com Moreno, Zeca e Tom” ...voaria com o “Araçá Azul”?… iria buscar doces memórias de infância da novela “Tieta” ou a introdução mais marcada da percussão Baiana do “Livro” e “Noites do Norte”… ou o instrumental único do “Circuladô”?... o “circulado” ou o “circulado Vivo”... enfim… será que optava por um dos discos onde Caetano dá o salto na formação das suas bandas de suporte e passa a tocar com “os colegas dos filhos”?

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Tudo isso é válido, meu mestre. Tudo em si faz sentido: os discos que ouvi, os vídeos que vi, os espectáculos que vi, vivi e os que sonhei ver e ainda os livros que li.

Contudo, acredito que hoje – pela primeira vez – não será dia de falar de discos, dos que me encantam, mas sim de referir o encanto que um dos meus heróis musicais já deixou e vai deixando em mim… desde a primeira vez que o ouvi sem nem saber quem era e gostei… até hoje – claramente um dos pedaços da minha alma-musical.

Prefiro sim, rematar com pinceladas de cor-amor, pintando este artigo com a referência do mais recente espetáculo que Velô deu com os filhos e a inseparável Bethania. Que beleza…

Também dizer, que o meu filho já canta a música de Tom, o filho do meu amigo Caetano. É a vida a seguir o seu caminho…

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1080 de 10 de Agosto de 2022. 

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Autoria:Paulo Lobo Linhares,15 ago 2022 7:57

Editado porAndre Amaral  em  16 ago 2022 17:24

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