Mas se Teté é certeza, no que acima foi referido, ganha brilho quando acrescentamos a Frontwomen rara que é, a compositora e sobretudo a bandeira que traz com ela desfraldando o título “Mulher”. Sim, para mim é uma das figuras que mais traduz a palavra: “Mulher-música” …em arte pura.
Continuando, ainda há lugar para a magia com que conta a música de Cabo Verde com pequenas “storinhas” que vai contando e que vão desde a altura em que espreitava os mais velhos a tocar até os pormenores musicais das mornas que tanto sabe e ama!
Voltando à discografia, ou aos momentos musicais de Teté, dois discos da sua vasta e diversificada colecção, ficam em pequeno destaque pelo seu encanto.
As cores de “menino das ilhas” salta de imediato à vista – na verdade uma caixinha de música infantil cheia de surpresas. Nela cabem as vozes-Simentera de Leninha França e Teresinha Araújo que com os seus doces timbres misturam-se com o que Teté desenhou para o disco e em embalo tudo se transforma. Se Teresinha e Leninha já traduziam muita da cor que certamente Teté imaginava – mais cores e nuances aparecem neste disco na “enorme” Sara Sarita. Se vozes, cantares e encantares traduziam as cores que pintavam as ilhas tão pequeninas que cabiam num botão, a ordem do pequeno mundo-disco em construção é sugerida pelo “adulto” Paulino Vieira.
Tanta beleza num dos grandes temas do (raro) universo da música infantil de Cabo Verde. Único até hoje, onde sobretudo Teté embala a ela própria, parecendo que após o suninha kel ta faze nené…el ta kontinua ta kanta…
Desnecessário será falar do trabalho de Teté – cantora e compositora nos Simentera, mas permitam-me saltar até ao ano de 2015 e chegar de mansinho às “Mornas ao Piano”.
Lembro-me de ter escrito sobre o álbum anos atrás nesta coluna (no Recomendações para ouvir do Expresso da Ilhas nº 865 de 2018) e também ter-me referido ao disco como “uma caixinha de música que contém mornas no seu interior e que, vamos ouvindo, uma por uma” e que, “abrindo tal caixinha, vão saindo cores de acordo com a Morna que ouvimos, começando por um lindo passeio pela Cidade do Mindelo”.
Interessante ponte entre duas caixinhas de música: uma que se encontrava na areia de uma praia de uma ilha pequenina e outra que duas décadas depois contém a mesma essência, mas as cores já não eram de lápis ou tinta que (en)cantavam, mas sim de notas e músicas que pintavam lugares, cidades, personagens e sentires.
Pois, a caixinha é a mesma, mas de outra das tantas gavetas que Teté Alhinho guarda no seu armário de criatividade.
Olhando para o percurso de Teté é caso para se perguntar: quem disse que a música tradicional é coisa estagnada? Teté é a prova de que a tradição se inova. Sim, claro que dá trabalho – mas isso é típico dos apaixonados por música, os tais que veem sempre a música acima de tudo.
Assim, no meio da ponte construída pelas duas caixinhas de música, fica a minha vénia a Teté Alhinho – provavelmente uma das compositoras com mais marca na nossa música, um dos maiores símbolos da mulher-compositora Cabo-verdiana. Venham muitos mais anos, storias, mornas, pianos, barcos di papel que trazem neles batuku, Mindelos que serão sempre d´Mãe Auta e dos muzguers d´Praça Nova…rumo a futuros e sempre colado à nossa música em constante tradição e coração.