A obra, nascida de uma longa caminhada artística e pessoal, é o reflexo profundo da sua vivência cultural, social e política, com especial destaque para a identidade linguística e musical do Fogo.
Com mais de três décadas de experiência como letrista, tendo iniciado em 1989 com o lançamento da canção “O Destino de Belita”, interpretada por Cesária Évora, Alberto Alves acumula no seu currículo cerca de 40 composições, gravadas por nomes de referência da música cabo-verdiana, como Mirri Lobo, Djosinha, Bana e Assol Garcia.
Numa entrevista ao Expresso das Ilhas, Alberto Alves explica que este novo projecto não tem nada dos trabalhos feitos musicalmente, tratando-se de uma colectânea de poemas inéditos, desenvolvidos principalmente entre 2016 e 2020.
“Durante o período da pandemia, escrevi muito. Foi um momento difícil, mas que resultou numa produção tão extensa que acabei por dividir o projecto em dois livros. Este primeiro reúne poemas inéditos, e o segundo, previsto para o próximo ano, será composto por poemas já musicados”, conta.
Uma caminhada multifacetada
O título do livro reflecte o percurso multifacetado do autor, da música à política, da religiosidade à militância cívica e cultural, e procura valorizar o crioulo do Fogo, tanto na forma falada como na sua expressão escrita em Alupec.
“Este trabalho é uma resposta ao público, um compromisso com o povo cabo-verdiano, especialmente com os imigrantes que acompanham o meu percurso. É um contributo humilde para a valorização da nossa língua nacional”, salienta Alves.
Com uma forte ligação à terra natal, o autor pretende que “Arbisa D’um Jornada” seja também um testemunho linguístico da variante foguense do crioulo, cuidadosamente acentuado e estruturado para respeitar essa expressão regional.
Legado e expectativas
O autor espera que o livro venha a ser reconhecido como um contributo para o estudo da língua cabo-verdiana e para o reforço da identidade cultural nacional.
Com o lançamento a coincidir com o cinquentenário da independência de Cabo Verde, Alberto Alves pretende deixar uma marca que vá além da política e da música, tocando também a literatura e o património linguístico do país.
“Agora resta saber como o público, os leitores e os estudiosos da língua cabo-verdiana vão interpretar este trabalho. Mas acredito que é um momento ideal para contribuir com algo que valorize as nossas raízes”, conclui.
Além de convidar o leitor a mergulhar na vivência, cultura e idiossincrasia da ilha do Fogo, e também do próprio autor, Arbisa d’um Jornáda tem a particularidade de reunir mais de oito dezenas de poemas, escritos na língua materna cabo-verdiana, designadamente na variante do Fogo, contribuindo, deste modo, para a valorização e difusão da nossa língua e da variante foguense, em particular.
Ainda com este propósito, a obra, cujo prefácio e posfácio foram escritos por Lívio Lopes e Artur Santos Pina Cardoso, respectivamente, inclui, na sua parte final, um glossário com aproximadamente duas centenas de palavras e expressões idiomáticas da ilha do Fogo.
No prefácio, Lívio Lopes considera que a obra é literária e de “grande vulto”, e pretende envolver-nos na razão que o poeta conhece e professa, com alma e coração, “para a satisfação de todos nós que o admiramos”.
Já no posfácio, Artur Cardoso escreve que estamos perante uma colectânea de “estórias” da história que importa ler, reler, discutir e deixar como legado para os nossos netos. “Estou convencido de que alguém há-de, um dia, descodificar esta obra, desmontando a sua visão holística, de um tempo passado, mas que está presente na nossa vivência, na nossa cultura e na nossa idiossincrasia enquanto povo”.
O livro contém, igualmente, pinturas internas a preto e branco e uma a cores, feitas por Valdir Alves e Ronilson Garcia Montrond.
Da poesia à música
Apesar das exigências do cargo político, Alberto Alves continua ligado ao universo musical. O seu mais recente trabalho foi a composição “Sonho de Imigrante”, incluída no último álbum da cantora foguense Assol Garcia. O autor considera que a sua escrita, mesmo na poesia, mantém o estilo cadenciado e popular, típico do Fogo, que permite uma fácil adaptação musical.
“A minha escrita é feita para ser cantada: tem ritmo, tem talaia baxu, tem quadras, tem colá. E muitos artistas ainda me procuram para criar temas. Mesmo com as obrigações parlamentares, continuo a escrever com esse propósito”, afirma.
Lançamento
A obra será apresentada esta sexta-feira, dia 25, às 17h00, na Casa da Bandeira, em São Filipe, e no domingo, dia 27, às 15h30, no recinto da Feira do Café, nos Mosteiros. Em seguida, haverá lançamento na cidade da Praia (em data a anunciar) e nos Estados Unidos, no mês de Agosto, onde vive há 36 anos.