E o burro sou eu?

PorLeonardo Cunha,15 jul 2022 12:07

Muita tinta já correu sobre o episódio do burro a transportar a bola de futebol no estádio municipal da Boa Vista, por ocasião do início da partida na final do campeonato nacional em Cabo Verde. Correndo o risco de parecer mais um texto sobre algo plenamente já abordado, esta reflexão irá tentar abordar a ideia do “burro” como uma das mais originais dos últimos tempos dentro do espetáculo desportivo em Cabo Verde.

Por tradição, a comissão organizadora da final do campeonato nacional de futebol em Cabo Verde, decide o formato da entrega da bola para o pontapé de partida do jogo. No passado já tivemos o Mitú Monteiro e o seu filho no Sal e também a entrega a cavalo (acompanhado ao som de tambores) em Santo Antão. Desta vez a ideia foi bastante diferente e gerou grande discussão.

O que torna diferente esta opção é a mistura entre a tradição, sendo que o burro é um animal com grande significado para “as gentes” da Boavista e a personalidade carismática deste animal. O que não salta à primeira vista é um caracter simbólico que o animal carrega da resiliência da população da ilha que está em franco crescimento. Os locais quiseram prestar a devida homenagem ao animal. Igualmente, é importante destacar a originalidade da opção.

Contudo, o que torna ainda mais especial esta opção? É o próprio fenómeno da discussão que se gerou. Reparemos que depois de um tempo de pandemia com um largo hiato nas atividades desportivas, o que era mesmo preciso era um catalisador para a criação de um foco de atenção ao que se passa à volta do “field of play” (campo de jogo).

O que quero afirmar aqui é que era preciso ter uma expressiva capacidade de originalidade, para captar a atenção das massas dentro de um fenómeno de características agregadoras inerentes ao desporto. Um pouco por toda a parte (e principalmente alem fronteiras), foi este o motivo de discussão, fazendo comparações que não são comparáveis e a lançar uma animação muito necessária.

O que o burro veio mostrar é a mais pura ligação entre Desporto, Cultura e Tradição. Quem diria que um simples burro a entregar uma bola fosse capaz de despertar a consciência para a condição da cabo-verdianidade à volta de um fenómeno desportivo. O desporto como meio social transversal tem esta qualidade de evocar a identidade cultural.

Num outro aspecto, na perspetiva de gestor, foi uma oportunidade de ouro que foi criada. Em termos de alcance mediático e de foco na marca (no sentido lato) foi algo com enormes resultados através de um investimento reduzido. Henry B. King afirmou “Falem bem ou falem mal, mas falem de mim!”. Em marketing, existem gestores que aplicam este princípio de forma que possam gerar o brand awareness (consciência de marca), desde que depois isso não condicione a perceção de brand equity (valor da marca).

É preciso ser um excelente gestor de marca para que depois da criação da consciência da marca se possa manter a confiança do consumir e que o valor da marca se mantenha igual com um “public generated content.” (conteúdos gerados pelo consumidor). Repare-se que depois de instalado a discussão à volta do sucedido e a reação provocada, vivemos um momento de multiplicação de conteúdos de esclarecimento e normalização do (importante) valor do acontecimento. A marca está na cabeça do consumidor. Um bom marketeer para conseguir elevar o alcance de um acontecimento e ao mesmo tempo garantir que o mesmo terá no final uma perceção positiva por parte do espectador é algo complexo e difícil de obter. Como diria o Scolari, resta-me perguntar… e o burro sou eu?

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Desporto

Autoria:Leonardo Cunha,15 jul 2022 12:07

Editado porAndre Amaral  em  16 jul 2022 8:23

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