Depois da tempestade, a dúvida. Dirigentes, clubes e autoridades admitem uma época desportiva atípica em São Vicente, com não mais do que condições mínimas para muitas modalidades.
No futebol, os treinos arrancaram oficialmente esta segunda-feira, 28 de Setembro, distribuídos pelos campos de Chã de Alecrim, Bitim, Craquinha e Salamansa, os que menos sofreram com a passagem da Erin. Perante os danos significativos no Adérito Sena, os jogos terão lugar no sintético do Centro de Estágio da Federação Cabo-Verdiana de Futebol (FCF), local onde as intervenções necessárias são mínimas.
Segundo Franklin Spencer, presidente do Mindelense, o foco passa por criar uma base que permita o início da época e a preparação dos atletas.
“Havia alguns clubes cépticos sobre se deveríamos ou não realizar a época desportiva no Centro de Estágio. A maioria dos clubes foi a favor. A nossa preocupação, fundamentalmente, é a nível social. Devemos colocar em primeiro lugar a questão social, a ocupação destes desportistas, porque, de facto, poderíamos perder boa parte deles para o próximo ano”, refere.
Nuno Leite, presidente do Amarante e membro da comissão ad hoc criada para acompanhar os trabalhos de recuperação das infra-estruturas desportivas, sublinha que o grande desafio será alinhar todas as vontades.
“Eu diria que o principal objectivo é conseguirmos sincronizar os interesses dos clubes, da Câmara Municipal e da Federação. Tem de haver boa vontade, tem de haver disponibilidade, têm de existir recursos para esse efeito. De resto, há um plano com datas. Vai depender da disponibilidade de recursos para as obras que são necessárias”, adianta.
Fora do centro, também muitas perguntas e nenhuma certeza. No Calhau, uma das localidades mais afectadas pelas cheias, a direcção do clube local reconhece os constrangimentos e diz fazer tudo para manter vivas as actividades. O presidente, Diolando da Luz, assegura que a época está a ser preparada.
“Há vários anos que não temos campo no Calhau. É muita despesa vir do Calhau para a cidade e, com os impactos das chuvas, ficou mais difícil. Este ano, estamos a ver uma certa dificuldade nos apoios, as pessoas perderam as suas hortas, os seus animais”, recorda.
Ouvida pelo Expresso das Ilhas, a Associação Regional de Futebol de São Vicente indica um “reajuste na logística” para permitir as melhores condições de trabalho possíveis a todas as equipas inscritas, com a possibilidade de novas mudanças ao longo da temporada.
Em Setembro, numa visita a São Vicente com uma missão da FIFA, o vice-presidente da FCF, Joel Barros, vincou o empenho de todas as partes para que as provas regionais tenham lugar, admitindo que dificilmente o Adérito Sena voltará a reabrir ainda este ano.
Outras modalidades
Nem só o futebol foi atingido pelo mau tempo. Atletas de outras modalidades tiveram os seus planos de treino comprometidos. É o caso do atletismo, que voltou a ficar sem pista de tartan — inaugurada em Março, depois de anos de reivindicações.
Hélder Pio, presidente da Associação Regional de Desporto Adaptado de São Vicente, não usa eufemismos: a situação é muito difícil. Os treinos estão a acontecer na rua.
“Após as chuvas, fizemos uma pequena reunião e os atletas estão a treinar na via pública, na Lajinha e na Enapor. É difícil, por causa da movimentação de pessoas e carros. Uma pessoa cega não consegue treinar sozinha, tem de ter acompanhante e, ainda assim, treina condicionada”, diz.
Os atletas preparam-se para participar no 13.º Campeonato Nacional de Desporto Adaptado, originalmente agendado para o final de Agosto, em São Vicente. A competição terá nova data e novo local.
Autoridades
Da parte da Câmara Municipal, o vereador José Carlos fala numa época anómala.
“A haver campeonato [de futebol], será com condições mínimas, mínimas mesmo (...). Equipas e associações também irão fazer um esforço e todos juntos estamos empenhados em podermos fazer a nossa época desportiva”, avança.
Adelino Duarte, delegado do IDJ na ilha, aponta o futebol como a modalidade mais afectada e antecipa um pequeno atraso no arranque das provas.
“As épocas desportivas abrem a 1 de Outubro. Acho que dificilmente a época começará como previsto, mas acredito que venha a acontecer (...). Acredito que tudo irá correr bem, mesmo com algum atraso. Quando se perde uma época, o recomeço é sempre difícil”, declara.
“As outras infra-estruturas [que não os campos de futebol], podemos dizer que estão em condições normais”, explica.
*com Lourdes Fortes e Fretson Rocha
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1244 de 01 de Outubro de 2025.