O Hotel Iberostar, situado na praia de Chaves, na ilha da Boa Vista, foi aberto ao público em Dezembro de 2009. Tem 276 quartos e uma capacidade para receber até 607 turistas. A sua taxa de ocupação é de cerca de 70 por cento, mas baixou em 2014 para cerca 68 por cento. Entre as causas Juan Pujol aponta a incidência do IVA para o turismo que passou de 6 para 15 por cento, a introdução da taxa turística, o ébola e o encerramento do Aeroporto da Boa Vista às 18h30. O director do Iberostar acredita no potencial turístico de Cabo Verde, mas chama a atenção para a necessidade de maior comunicação entre o ministério e os operadores. “Acho que se comunicássemos mais as coisas iriam muito melhor”.
Expresso das ilhas – A taxa de ocupação do Iberostar baixou em 2014. Quais as razões?
Juan Pujol – Foi o resultado uma conjugação de factores. O IVA para o turismo que era de 6 por cento, aumentou para 15 por cento e este ano aumentou mais 0,5 para ajudar a ilha do Fogo. O golpe foi bastante grande para os operadores porque foi necessário refazer os contratos e aumentar os preços. A introdução, em 2013, da taxa turística de 2 euros por dia para pessoas maiores de 16 anos afectou também os nossos clientes. Outro factor para a queda do número de hóspedes tem a ver com o facto de o Aeroporto da Boa Vista fechar já às 18h30 da tarde, por falta de iluminação. Os operadores sentem-se afectados por os seus aviões não poderem fazer tantas trajectórias de ida e volta à ilha da Boa Vista como desejariam. E isto traz problemas. O surto da epidemia do Ébola, em 2014, foi outro factor que contribuiu também para a descida do número de turistas, embora Cabo Verde e a Boa Vista em particular não tenham registado nenhum caso. O que está a afectar [a taxa] este ano é a existência de destinos, como as Caraíbas, cujo preço do pacote é mais baixo relativamente a Cabo Verde.
O Governo quando decidiu aumentar o IVA e as taxas sobre o turismo levou em conta os mercados concorrentes?
Não sei porque, na verdade, o governo não nos ouviu quando decidiu aumentar o IVA ou a taxa turística. Quem se reuniu com os operadores foi o Presidente da República que esteve na Boa Vista. Mas afinal quem decide tudo é o primeiro-ministro. Portanto, foram tomadas decisões importantes para o sector do turismo, sem que o governo tivesse ouvido os operadores.
Bom, o governo não é obrigado a ouvir os operadores.
Na verdade o governo não tem que consultar, porque a lei é lei e eles ditam a lei. Mas acho que se nos tivesse consultado, conheceriam os nossos problemas. Saberiam que os pacotes são mais baixos em outros mercados e que há outros destinos que não têm taxa turística; há destinos que estão a baixar os vistos. Em Cabo Verde temos muitas potencialidades, é um destino novo. É um destino com grande potencial, mas há que actuar agora. Não podemos esperar mais. Eu sei que o IVA para o sector turístico era mais baixo e o governo quis harmonizá-lo. Mas deve-se ter em conta que há destinos em que o IVA para o sector turístico é mais baixo que o IVA geral, como é o caso da Espanha. E porquê? Porque o turismo é o motor do país.
Acha que com estas medidas fiscais poderemos estar a matar a nossa galinha dos ovos de ouro?
Nós dizemos mais ou menos o mesmo. Tenho a impressão de que a cada ano as autoridades estão a constringir mais a galinha dos ovos de ouro. Pode parecer que um aumento do IVA em mais 0,5 por cento não é nada, mas temos que ter em conta que o turismo é um sector muito sensível. Chaves é uma das praias mais bonitas que eu já vi alguma vez, mas no mundo há muitos destinos de sol e praia. Por isso acho que deveríamos explorar mais o turismo de cultura, de experiência e de surpresa dos nossos clientes. Mas para isso é necessário mais investimentos na ilha da Boa Vista.
Mas a taxa turística que passou a ser cobrada em 2013 é justamente para estruturar a oferta turística no país. Nota-se isso na Boa Vista?
Na ilha da Boa Vista não. Não noto investimentos nas estradas para chegar às povoações do Norte, para que o turista possa acender mais facilmente a todas as povoações. É um percurso difícil e pesado para os nossos clientes. Temos que facilitar e facilitar é construir estradas melhores.
Então não se vê para onde vai esse dinheiro na Boa Vista? São receitas superiores a 600 mil contos anuais.
Eu não sei para onde vai. Sei que a Câmara Municipal está a fazer um centro de arte e cultura em Sal-Rei. Está a trabalhar muito nesta vertente e mantemos uma grande parceria com a edilidade local, porque a nossa responsabilidade social é muito grande. Nós tentamos colocar aquela pequena pedrinha para o desenvolvimento da ilha. Em 2014 fomos distinguidos pela Câmara da Boa Vista pelo nosso contributo para o desenvolvimento do município. Entre outras acções realizamos, em Junho de 2014, nas instalações do Iberostar, o primeiro fórum do turismo na ilha da Boa Vista. Participaram os mais importantes operadores turísticos e contou com a presença do Presidente da República e de vários ministros.
Cabo Verde recebe cerca de 500 mil turistas por ano, uma cifra muito inferior a destinos como Seychelles e outros. O que tem feito o governo para atrair mais turistas, pois o boom que se regista agora não é eterno.
De facto tivemos um grande boom nas ilhas de Sal e Boa Vista e o governo trabalhou para alargar o turismo, caso contrário não estaríamos aqui. Mas tivemos um ano [2014, queda na ordem dos 5,5] em que tudo parou e esta tendência mantém-se ainda. Na minha opinião, o sector turístico devia crescer todos os anos, mas houve um momento em que paramos. E agora não vemos esse desenvolvimento turístico. A ilha da Boa Vista parou. Sei que o governo atribuiu grande importância ao sector turístico, mas acho que agora estancamos. Aqui na ilha da Boa Vista não vemos mais investimentos. Paramos: temos uns cinco hotéis grandes e alguns hotéis pequenos em Sal-Rei, mas não há mais nada.
A ilha parou por causa da crise financeira internacional?
A crise internacional pesou, mas penso que agora que os países europeus começam a sair da crise devia-se criar incentivos ao investimento turístico. Anteriormente o governo e as câmaras municipais criavam estímulos ao investimento turístico, através da devolução do IVA ou outras medidas fiscais. Que incentivos existem hoje não posso dizer porque como director do Hotel Iberostar não participo nas reuniões do governo. Na minha percepção a ilha parou. Como disse, a crise financeira internacional condicionou o desenvolvimento turístico, mas a partir de agora Cabo Verde tem que trabalhar se quiser incrementar mais o turismo.
E isso não se consegue com o aumento de taxas e impostos?
Não, acho que o governo deve criar incentivos aos operadores para que possam voltar a acreditar nas ilhas de Cabo Verde e investir mais. O aumento do IVA acontece em todos os países do mundo. Acontece em Portugal, acontece na Espanha, todos subimos o IVA. Com a crise os impostos em Espanha subiram também. Só que Cabo Verde poderia ter aumentado o IVA, mas paulatinamente e não de 6 por cento para 15. Devia-se ter subido de 6 para 9 para ver como funcionava e depois subir mais um pouco e quando o turismo estivesse consolidado no país podia-se aumentar mais 3 por cento e ninguém notava absolutamente nada. O problema é que os aumentos vieram todos de uma vez.
Foi o motivo para 5, 5 por cento dos turistas procurem outros destinos?
Exactamente. Por exemplo, quando os turistas chegam à nossa recepção e pensam que já está tudo incluído no pacote e dizemos-lhes que têm de pagar ainda a taxa turística, ficam um pouco surpresos. Não é pelo valor da taxa, mas pela obrigatoriedade de pagar mais uma taxa.
A TUI, a maior agência de viagens europeia, mostrou-se na altura preocupada com o aumento das taxas de vistos, do IVA e de pernoita...
Acho que ninguém gostou da medida. É que Cabo Verde já é um destino caro e ainda aumentamos mais.
Que perfil devia ter o ou a ministra do Turismo para que as coisas funcionassem melhor?
Eu acho que o ministro ou a pessoa que se encarregasse do Turismo tinha que ser uma pessoa que percebesse 100 por cento do turismo e que soubesse que o turismo é uma área muito sensível e que uma pequena taxa de 2 euros por dia pode influenciar muitíssimo. Os clientes são muito sensíveis e agora viajam para todo o mundo e se lhes vendem um pacote que é mais barato, com mais ou menos as mesmas horas de voo, eles sempre escolherão o país mais económico.
Cabo Verde tem um ministério só para a Cultura. Da mesma forma, não podia criar um ministério só para o Turismo?
Não sou daqui, mas Cabo Verde tem uma grande cultura. O que acontece é que não se tira partido da sua riqueza e diversidade cultural. Não estou a falar do Iberostar, porque temos música cabo-verdiana e dedicamos um dia da semana à cultura e culinária cabo-verdianas. Os nossos clientes têm cultura cabo-verdiana dentro do hotel, mas fora do hotel devia haver maior oferta: mais excursões, mais actividades culturais. Acho que neste aspecto não exploramos tudo. Os clientes podiam conhecer mais a ilha e não ficarem dentro do paraíso que é o hotel.
E o ministério só para o Turismo?
Acho que devia haver um ministério só para o Turismo e um ministro que se ocupasse a 100 por cento do turismo. Porque o turismo abarca tudo: não apenas hotéis, restaurantes; são taxistas, museus, folclore e o meio envolvente. Por isso acho que deveria haver um ministério só para o turismo.
Critica-se muito o sistema tudo incluindo, porque não deixa muito ao país. Qual é a sua opinião?
Eu também queria que os nossos clientes saíssem do hotel. Mas nós optamos pelo sistema tudo incluindo (TI), porque, em primeiro lugar o cliente pede o TI e o operador turístico quer o TI porque para o cliente é mais fácil chegar ao hotel e não ter que pagar mais nada. Outra questão é sair e gastar dinheiro. Não há muitas ofertas fora do hotel, este é o real problema. Se os nossos clientes quisessem comer fora, não haveria restaurantes suficientes. Mas eu mando os nossos clientes jantar em restaurantes que eu conheço. Para mim seria melhor que os nossos clientes saíssem todos os dias, porque teríamos menos gastos com a electricidade, menos gasto com a água e menos gasto com a comida: o cliente fica contente com o hotel e também fica contente com a ilha. E qual a vantagem? Fidelizávamos os clientes, porque o turismo vive dos clientes que vão e voltam; voltam a trazem mais pessoas. Temos clientes que vieram sós e agora vêm com a família inteira. Porquê? Porque são clientes que gostaram da ilha, fizeram excursões e ficaram cativados pela famosa morabeza do povo cabo-verdiano. Infelizmente temos apenas 4 por cento de clientes regulares. É muito pouco. Tínhamos que atingir a fasquia de uns 20 a 25 por cento. Outra vez, nós temos o sistema TI, porque fora do hotel não há infraestruras para acolher os turistas.
A segurança é também um outro factor?
Eu sei que não acontece nada aos turistas quando vão até Sal-Rei. Mas o problema é a iluminação. A primeira impressão, quando um turista sai, sobretudo à noite, é que tudo está muito escuro. E ele não conhece o país, não conhece as pessoas e prefere ficar dentro do hotel. Além da questão da segurança, temos que falar também da saúde. Pelo menos na Boa Vista falta um bom hospital para que se o turista adoecer possa ser devidamente atendido. Se houver um caso de emergência à noite não temos nenhuma forma de evacuar o turista para o hospital da Praia ou de São Vicente. Mas não existe, se acontecer algum caso com um nosso cliente, teremos um grande problema.
Quanto é que recebe o governo por cada turista do sistema tudo incluído?
Recebe o visto, a taxa turística e a taxa aeroportuária. É muito.
O Lonely Planet, a maior editora do turismo no mundo, alerta sobre a violência na Praia, S. Vicente e em certos locais na Boa Vista. Preocupam-o estas notícias?
Preocupam sim, porque os turistas dizem ‘ vamos a Cabo Verde, mas não podemos sair do hotel’.
E acha que preocupam as autoridades?
As autoridades da ilha sim. Posso dizer que a Câmara Municipal e a Polícia preocupam-se. Não posso falar do governo, porque não sei.
Não temos ainda uma Polícia Municipal, a Polícia é Nacional.
A Polícia Nacional daqui da Boa Vista. Falo muito com o Comandante da Polícia da Boa Vista, com o presidente da Câmara Municipal e exponho-lhes a possibilidade de que se assalte o hotel. Isso seria o pior que podia acontecer. Porque se os turistas deixarem de se sentir seguros dentro do hotel, então seria o fim.
Os recentes assassinatos a turistas na Tunísia tiveram algum impacto em Cabo Verde?
Cabo Verde vai sempre atrás dos outros países. Porque tivemos a oportunidade de trazer todas aquelas pessoas que tinham comprado o destino Tunísia. Afinal somos um destino que está perto da África. Somos um destino com todos esses encantos da natureza, de ilhas turísticas mais ou menos exóticas e é isso que atrai os turistas para a Tunísia. Mas acho que corremos sempre atrás do prejuízo. Os outros países são mais rápidos a tomar decisões e apanham primeiro os turistas e nós só ficamos com os últimos resquícios. Temos que estar mais atentos; no momento em que acontece uma coisa assim temos que comunicar imediatamente com o exterior. É o mesmo que aconteceu com o Ébola. Aqui em Cabo Verde estávamos todos tranquilos, mas o problema é que não comunicamos com o exterior. Não comunicamos com os países emissores. E nesses países diziam ‘Cabo Verde também tem a bandeira vermelha’. Tínhamos que dizer aos países emissores ‘olhem, as ilhas de Cabo Verde não têm nenhum caso de Ébola’. Ou seja, precisamos de um ministério do Turismo que quando acontecem crises como na Tunísia, abram as portas e digam ‘senhores, Cabo Verde está aqui. E podemos assumir; temos bons hotéis, temos boa cultura e temos belas praias’.
O que é necessário fazer?
Acho que tem que haver um vínculo mais próximo entre os operadores turísticos e o ministério do Turismo. Por exemplo, o ministério telefona aos hotéis e dize: ‘olhem, aconteceu um problema na Tunísia, o que podemos fazer? Já entraram em contacto com os vossos operadores turísticos que tinham que voar para Túnis? Nós da nossa parte [do ministério] vamos fazer uma campanha de marketing para todos os países emissores para dizer que Cabo Verde tem as portas abertas para acolher os vossos turistas’.
E isso não acontece?
Isso não acontece. Nós os operadores comunicamos, mas não há um apoio do ministério do Turismo. Acho que se comunicássemos mais as coisas iriam muito melhor.