Reformas ainda insuficientes

PorJorge Montezinho,11 nov 2017 6:09

Cabo Verde ainda não é dos países onde é fácil fazer negócios. Na classificação deste ano do Doing Business – o relatório do Banco Mundial saiu na semana passada – o arquipélago ocupa o 127º lugar entre 190 economias do mundo inteiro. Longe ainda da meta traçada pelo governo, de ter o país no top 50 do ranking.

 

Desde 2004, Cabo Verde fez 18 reformas com o objectivo de facilitar os negócios, 7 delas de 2015 para cá, 3 no último ano. Mexeu-se na lei laboral, alterou-se o registo de propriedade, criou-se a lei de resolução de insolvências, mudou-se o registo de propriedades, facilitou-se a obtenção de crédito ou o início do negócio. Como? Com a criação do registo de empresas online, com a diminuição do tempo e a digitalização do cadastro para o registo de uma propriedade, com a introdução do salário mínimo e do subsídio de desemprego, ou com a facilitação das importações e das exportações. Todas estas medidas foram sublinhadas pelo Banco Mundial, mas ainda não foram suficientes para fazer o país descolar do último terço da tabela.

Entretanto, as economias da África Subsariana adoptaram um número recorde de reformas no sector empresarial pelo segundo ano consecutivo, afirma a edição do 15º aniversário do relatório anual de Doing Business do Grupo Banco Mundial, que monitoriza a facilidade de realização de negócios das pequenas e médias empresas em todo o mundo.

No último ano, realizou-se um total de 83 reformas na área de negócios, ultrapassando as 80 reformas do ano anterior. Assim, nos últimos 15 anos, concluiu-se um total de 798 reformas nas 48 economias da região.

A região está bem representada no grupo dos 10 maiores executantes de melhorias a nível mundial com base nas reformas realizadas, destacando-se o Malawi, Nigéria e Zâmbia. O Malawi, que executou quatro reformas, registou melhorias significativas na área de Obtenção de Crédito ao adoptar uma nova lei que estabelece regras relativas aos processos de falência e ao criar uma nova agência de crédito. A Nigéria também aumentou o acesso ao crédito ao garantir aos mutuários o direito de inspeccionar os seus dados sobre crédito da agência de crédito e acelerou igualmente a criação de empresas ao permitir que os documentos de registo possam ser carimbados electronicamente. As reformas na Zâmbia também incluíram o aumento do acesso ao crédito com a adopção de uma nova Lei sobre Bens Imóveis e a criação de um novo registo de garantias.

Muita da actividade de reforma no último ano centrou-se nas áreas de Comércio Internacional e de Abertura de Empresas, cada uma delas com 15 reformas, seguindo-se a Obtenção de Alvarás de Construção onde se realizaram 14 reformas, representando 64% das 22 reformas registadas nesta área, a nível global. A Zâmbia implementou um sistema global informatizado para dados aduaneiros (ASYCUDA), permitindo assim que as empresas pratiquem com mais facilidade a sua actividade comercial além-fronteiras, enquanto Angola e Moçambique facilitaram o comércio transfronteiriço melhorando a infra-estrutura portuária.

Várias economias, incluindo o Benim, Cabo Verde, República Democrática do Congo, Gabão, Gana, Níger, Nigéria e República das Seychelles aumentaram a transparência na concessão de licenças de construção mediante a publicação online de regulamentos relacionados com a construção. Angola também tornou mais fácil e mais rápida a obtenção de licenças de construção ao melhorar o sistema de pedidos de licenças de construção.

O país da região que mais reformas implementou no ano passado foi o Quénia, com um total de seis. Entre outros progressos, o Quénia tornou mais fácil a criação de empresas mediante a redução do número de procedimentos necessários para se registar um negócio e reduziu o tempo gasto com a apresentação das provas documentais para importação recorrendo a um balcão único para o efeito. O Quénia também aumentou a fiabilidade do abastecimento de electricidade ao investir em linhas de distribuição e transformadores e criando brigadas especializadas para restaurar a electricidade quando há cortes de energia; lançou ainda uma plataforma online (itax) para declaração e pagamento de imposto sobre o rendimento das sociedades.

Outras quatro economias – Mauritânia, Nigéria, Ruanda e Senegal – implementaram cinco reformas cada uma delas, durante o ano passado. O Ruanda, que vem a seguir à Nova Zelândia (o país melhor classificado no ranking Doing Business) no que toca ao Registo de Propriedade, pôs em vigor serviços online para facilitar ainda mais as transferências de propriedade. Como resultado, hoje demora apenas sete dias para se transferir legalmente um título de propriedade no Ruanda.

Entre as reformas assinaláveis no Senegal conta-se a introdução de regras mais rigorosas para as audiências prévias ao julgamento que levaram a uma redução do tempo necessário para se resolver litígios comerciais. Estas novas regras reduziram o tempo para execução de contractos de 925 dias para 740 dias. O Senegal também reduziu os custos para a criação de um negócio e para o registo de propriedade ao baixar as despesas notariais relativas à constituição de empresas e diminuindo os custos de transferência de propriedade, respectivamente.

As Ilhas Maurícias, a economia mais avançada da região, realizaram quatro reformas que incluíram a externalização da concepção e construção das obras de ligação do sistema de saneamento, acelerando assim o procedimento de obtenção de licença de construção e melhorando os processos para facilitar o comércio transfronteiriço. As Ilhas Maurícias também facilitaram a transferência de propriedade ao reduzir o imposto sobre transferências, implementar um mecanismo de reclamações e publicar os padrões de serviço.

No que toca à posição global em termos de facilidade de fazer negócios, as Ilhas Maurícias estão em 25º lugar, seguidas do Ruanda (41º) e Quénia (80º) como as economias da região mais bem posicionadas. Botswana, África do Sul, Zâmbia e Seychelles são as outras economias da sub-região entre os 100 melhores países do mundo para fazer negócios.

A região da África Subsariana continua a enfrentar dificuldades na área de Obtenção de Electricidade. Em média, demora cerca de 115 dias para se obter uma ligação eléctrica na região, comparativamente a uma média global de 92 dias. Este é também um dos constrangimentos identificados na economia cabo-verdiana. Apesar de estar acima da média da Região Subsariana, em Cabo Verde a obtenção da electricidade, segundo dados do Banco Mundial, demora 88 dias, muito longe do país que consegue a melhor performance nesta matéria, os Emirados Árabes Unidos, onde o tempo de espera é de 10 dias. Outro dado a reter é a pouca confiança no fornecimento de energia e na transparência da tarifa aplicada. Em Cabo Verde este valor é de 2 (numa escala de 0 a 8), na OCDE a média é de 7,4 e há 28 economias onde esta confiança alcança o valor máximo de 8.

“O esforço reformista na África Subsariana é particularmente digno de celebração, numa altura em que a região se depara com inúmeras crises, incluindo conflito e violência. Esperamos continuar a registar os sucessos da região no que toca a promover o empreendedorismo para responder ao desafio de criação de emprego, em particular para os milhões de jovens mulheres e homens na região”, disse Rita Ramalho, Directora Interina de Indicadores Globais do Grupo Banco Mundial, que produz o relatório.

O Doing Business analisa 11 áreas do ciclo de vida de uma empresa, das quais dez são incluídas na classificação das economias em termos da facilidade de se fazer negócios: abertura de empresas, obtenção de alvarás de construção, obtenção de electricidade, registo de propriedades, obtenção de crédito, protecção dos investidores minoritários, pagamento de impostos, comércio internacional, execução de contractos e resolução de insolvência. O relatório analisa também a área da regulamentação do mercado de trabalho, que não é incluída na classificação deste ano. 

 

Êxitos das economias da Região Subsariana nos últimos 15 anos

• Facilitar o registo de um negócio tem sido um dos grandes alvos de atenção da região, durante os 15 anos desde o início da publicação de Doing Business, com 163 reformas registadas nesta área. Em 2003, demorava 61 dias, em média, para se começar um negócio na região. Hoje em dia, leva 24 dias, o que é comparável à média global de 20 dias. No Quénia, por exemplo, o tempo necessário para se começar um negócio passou para menos de metade, dos 60 dias em 2003, para 25 dias actualmente.

• Na área de Execução de Contractos, o Ruanda reduziu o tempo para resolver diferendos comerciais, de 395 dias 15 anos atrás, para 230 dias hoje em dia. Na Resolução de Insolvência, a Zâmbia reduziu o tempo para resolver conflitos comerciais de 395 dias há 15 anos atrás, para 230 dias actualmente. Na Resolução de Insolvência, a Zâmbia aumentou a taxa de recuperação de 17 cêntimos de 1 USD registada há 15 anos, para 48 cêntimos de 1 USD actualmente.

• Os maiores reformadores da região foram o Ruanda, com 52 reformas em 15 anos (é, inclusive, o país que mais medidas implementou a nível global), seguido do Quénia com 32 reformas e Ilhas Maurícias com 31 reformas.

 

África Subsariana Tendências das classificações

As Ilhas Maurícias, no 25º lugar da classificação do Doing Business, é a economia mais bem posicionada da África Subsariana. As outras economias da região, com um bom desempenho nas classificações sobre facilidade de fazer negócios, são o Ruanda (41º), Quénia (80º), Botswana (81º) e África do Sul (82º).

• As economias da região com classificação mais baixa são a Somália (190º), Eritreia (189º), Sudão do Sul (187º) e a República Centro-Africana (184º).

• Outras grandes economias na região e suas posições são a República Democrática do Congo (182º), Etiópia (161º), Nigéria (145º), Tanzânia (137), Sudão (170º) e Uganda (122º).

Ruanda está entre os melhores, em termos globais, nas áreas do Doing Business de Registo de Propriedade (com classificação 2) e Obtenção de Crédito (6). No Registo de Propriedade, o Ruanda tem um sistema eficiente, em que demora 7 dias para transferir propriedade e custa apenas 0,1% do valor da propriedade, o mesmo que na Nova Zelândia.

As Ilhas Maurícias têm a regulamentação menos morosa em duas áreas do Doing Business: Obtenção de Alvarás de Construção (com classificação 9) e Pagamento de Impostos (10).

• Há quatro economias na África Subsariana que estão entre as 10 melhores no domínio de Obtenção de Crédito (com uma posição média de 115). A Zâmbia ocupa o 2º lugar, imediatamente a seguir à Nova Zelândia e o Ruanda, Malawi e Nigéria estão todos em 6º.

• A região tem um desempenho deficiente nas áreas de Obtenção de Electricidade (com uma classificação média de 148), Comércio Internacional (137) e Registo de Propriedade (131). Em média, são precisos 115 dias para se obter uma ligação eléctrica permanente à rede na África Subsariana, face a uma média global de 92 dias.

 

Tendências das reformas

• Durante o ano passado, foi implementado um número recorde de 83 reformas, destinadas a facilitar a realização de negócios, em 36 de 48 economias na África Subsariana. Trata-se do maior número de reformas alguma vez registado pelo relatório Doing Business em qualquer região e representa 31% de todas as reformas implementadas a nível global no último ano.

• Com o Malawi, Nigéria e Zâmbia, a África Subsariana é a região mais representada, entre os 10 países do mundo que mais melhorias introduziram, no relatório do Doing Business 2018.

• Várias economias da região implementaram três ou mais reformas no último ano, incluindo o Quénia (6 reformas), Mauritânia, Nigéria, Ruanda e Senegal (5 reformas cada), Malawi, Maurícias e Níger (4 reformas cada) e Angola, Benim, Cabo Verde e Zâmbia (3 reformas cada).

• A África Subsariana foi responsável por 14 das 22 reformas globalmente na Obtenção de Alvarás de Construção. Muitas economias, incluindo Benim, Cabo Verde, República Democrática do Congo, Gabão, Gana, Guiné, Níger, Nigéria e República das Seychelles tornaram mais fácil a obtenção de licenças de construção com a publicação online da regulamentação relativa à construção.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 832 de 08 de Novembro de 2017. 

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Autoria:Jorge Montezinho,11 nov 2017 6:09

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  10 nov 2017 14:22

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