Nesta entrevista, Jorge Cólogan, Representante Legal do governo das Canárias em Cabo Verde, explica os planos que o arquipélago tem para essa expansão e abre portas para novos investimentos canarinos em Cabo Verde.
Uma das coisas que se vai discutir no Fórum é qual a estratégia das Canárias para África? Em que consiste?
O Fórum de Internacionalização das Canárias é um encontro cujo objectivo é evidentemente a internacionalização das Canárias, isto é, a possibilidade de as empresas canarinas de chegarem aos mercados estrangeiros. África é um dos mercados mais importantes, junto com a América Latina. Esta internacionalização vai fazer-se através de quê? Através de apoio às empresas para se estabelecerem em países estrangeiros como Cabo Verde, através de missões comerciais, participação em feiras, encontros B2B (business to business), difusão de informações, enfim, uma série de acções e medidas de apoio às empresas canarinas para investir nos mercados estrangeiros como o cabo-verdiano. Para isso o governo das Canárias tem uma rede exterior de pessoas, por isso a Fundação Canária para a Acção Exterior está cá em Cabo Verde, para que as pessoas possam prestar apoio às empresas através da difusão de informações, com informações sobre o mercado. Essa é a razão pela qual estamos em Cabo Verde.
É a primeira vez que Cabo Verde é convidado a aparecer neste Fórum.
Cabo Verde foi convidado este ano. O Paulo Cabral, director-geral da Partner, participou falando sobre a visão que os cabo-verdianos têm das empresas canarinas. Mas vamos ter também a presença de outros países africanos como o Senegal e a Mauritânia. Houve uma mesa redonda sobre a visão africana dos negócios nas Canárias e que foi moderada pelo Director Geral dos Negócios com África do governo das Canárias.
Que ganhos é que as Canárias tem tido nesta relação com África?
A presença das nossas empresas em África é importantíssima. Por exemplo, falando de Cabo Verde que é um mercado que eu conheço bem, a Binter não é a única empresa das Canárias a operar em Cabo Verde. É a mais conhecida, é certo, mas temos outras. A Emicela, por exemplo, há também empresas na área da restauração, da construção, do turismo... há aproximadamente umas 50 empresas das Canárias a operar em Cabo Verde. Quando digo empresas canarinas falo de empresas constituídas juridicamente conforme o direito cabo-verdiano mas cujo capital é originário das Canárias. Mas são empresas cabo-verdianas. Temos múltiplas empresas com presença em Cabo Verde. O interesse das Canárias é que as nossas empresas continuem a internacionalizar os seus negócios.
As empresas canarinas têm uma forte presença principalmente aqui em Santiago. Tem havido dificuldades na implementação dessas empresas?
Um dos handicaps da internacionalização é o conhecimento do mercado. O que está a acontecer? Depois de termos feito uma ronda de reuniões com as empresas elas, muitas vezes, dizem a mesma coisa: que muitas vezes começaram o processo de internacionalização sem informação. Então, quando as empresas estão bem assessoradas e têm informações sobre o mercado, a integração é muito mais fácil. Também é certo que as empresas canarinas, tal como outras empresas do mercado europeu, estão habituadas a determinadas maneiras de trabalhar, a alguns processos que são mais rápidos na Europa, como a constituição de empresas. Aqui em Cabo Verde podemos dizer que ainda temos muito trabalho por fazer. Mas congratulo-me com o novo sistema de informação e de registo comercial que foi adoptado recentemente porque vai incidir nesta questão de melhorar o processo de criação de empresas. Acho que Cabo Verde está num bom caminho.
Uma das grandes dificuldades que é apontada, por exemplo, nos relatórios de Doing Bussiness é a lentidão de processos...
A velocidade da constituição de empresas também depende. Temos o processo de criação de empresa única no balcão da Casa do Cidadão que funciona muito bem, mas o certo é que há outros problemas como a formação dos trabalhadores. É preciso melhorar isso. A mentalidade de uma empresa canarina é que as coisas aqui funcionam como na Europa, mas aqui há outros ritmos. Isso não significa que são maus ritmos, é tudo uma questão de adaptação à realidade do país.
As Canárias enfrentam hoje um problema de sobrelotação de espaços. Há, tendo em conta a proximidade entre as Canárias e Cabo Verde, a possibilidade de deslocalização de empresas para cá?
A proximidade é precisamente um valor acrescentado. O problema é que muitas vezes, e como a relação histórica entre Cabo Verde e Portugal é muito forte, as empresas cabo-verdianas muitas vezes preferem procurar negócios em Portugal. Muito por desconhecimento. Temos empresas das Canárias que gostariam de investir aqui em Cabo Verde. Falta trabalhar mais nesta parceria que temos entre Cabo Verde e as Canárias e apoiar as empresas para que o mercado, entre os dois arquipélagos, fique mais unificado, mais homogéneo.
O que é que as Canárias têm que diferencie de outros países que queiram investir em Cabo Verde?
Temos o know-how muito especializado em turismo, em energias sustentáveis, em logística, transportes, engenharias, planos de ordenamento. Nas Canárias temos um know-how muito especializado que acho que poderia ser de muita utilidade em Cabo Verde. Precisamente por isso o governo das Canárias, no quadro da internacionalização da economia do arquipélago, temos uma linha de fundos para estudos de viabilidade, e o governo das Canárias vai financiar dois estudos desses aqui em Cabo Verde. Um para a Câmara Municipal da Praia, para promover um plano de transportes e mobilidade urbana mais sustentável, e o outro na Boa Vista para revalorização do património histórico-cultural da ilha, para criar uma alternativa para o turismo de sol e praia. Cabo Verde tem potencial turístico no seu património cultural. As empresas canarinas já estão a trabalhar nestes estudos e esse é também um exemplo do apoio do governo das Canárias à internacionalização das empresas e que têm Cabo Verde como principal beneficiário.
Falando do Fórum. Qual é o objectivo?
Criar um debate e fazer uma análise sobre a internacionalização das Canárias. Também é objectivo apresentar as políticas públicas do governo das Canárias para apoiar a internacionalização das empresas e também apresentar mercados potencialmente interessantes – como Cabo Verde e outros – e apresentar casos de sucesso de internacionalização.
A Binter e a Emicela são duas das grandes empresas das Canárias que já estão em Cabo Verde. Que outras áreas de investimento podem interessar às empresas das Canárias?
O turismo, sem dúvida, porque é o principal potencial de Cabo Verde, temos as energias renováveis. Acho que o sector da economia do mar também tem muito potencial, o sector da indústria que esteja ligado ao sector turístico e marítimo e de reparação naval. Os transportes também são interessantes, e sem esquecer o agro-negócio, com maior enfoque no canal HORECA (Hotelaria, Restauração e Cafés), porque em Cabo Verde o mercado é muito pequeno e não tem muita capacidade de absorção dos produtos, mas se nos focarmos nesse canal acho que há muitas potencialidades, pensando já nos futuros hotéis e complexos hoteleiros que vão ser construídos em Cabo Verde.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 890 de 19 de Dezembro de 2018.