Com a Linhas Aéreas de Cabo Verde mais perto de levantar voo, estabilidade é palavra de ordem para o Conselho Superior das Câmaras de Comércio e de Turismo. Porque “não há coesão territorial sem mobilidade” e “não há mobilidade sem transporte”, o presidente da organização que reúne as principais agremiações empresariais do país, Jorge Maurício, expressa o desejo de ver a mobilidade de pessoas e bens facilitada.
“Ter uma mobilidade cada vez mais crescente de pessoas e bens e, daí, promover a actividade do próprio transporte, que fomente o negócio, o turismo interno e que complemente a parte turística externa. Facilitar todos os operadores da área do turismo e das agências de viagens, facilitar todo o transporte intermodal, haver uma estratégia clara de intermodalidade entre os transportes aéreos, marítimos e terrestres”, ambiciona.
O líder empresarial destaca a importância de existir uma estratégia adequada à realidade.
“Um país arquipelágico, com um mercado exíguo, com cerca de 500 mil habitantes, muito fragmentado, exige da parte dos poderes públicos um posicionamento que seja estável, efectivo e apadrinhado pelos recursos públicos”, considera.
Agências de viagem
Também para as agências de viagens, a nova estatal é uma “mais-valia”, depois do “pesadelo” enfrentado durante meses com a BestFly Cabo Verde. Kathleen Sequeira, gerente da Atlant îles, só vê vantagens na nova Linhas Áreas de Cabo Verde.
“Para quem trabalhou com a última companhia [BestFly], não foi nada fácil. Tivemos muitas anulações, tivemos mesmo casos de clientes que vieram e nunca conseguiram chegar ao destino. Então, eu acho que a criação de uma nova companhia só trará vantagens a todos nós”, antecipa.
Além de regularidade e previsibilidade, a agente de viagens coloca o “respeito” pelas pessoas no caderno de encargos da recém-criada companhia pública.
“Temos de ter respeito pelas pessoas. Numa primeira instância, temos de ter mais voos. Cabo Verde está a crescer muito, está a explodir a nível de turismo. E falar de turismo é falar de transporte, não se pode falar de turismo sem se falar de transporte, porque é como uma pessoa com uma perna quebrada”, lembra.
Guias
Ruben Moreira, presidente da Associação de Guias de Turismo das ilhas de São Vicente e São Nicolau, representa uma classe que tem sentido de forma directa todos os constrangimentos com as ligações áreas. Espera por um virar de página.
“O que não deve falhar realmente é o compromisso com o horário e com a organização. Muitos dos nossos turistas vêm com pacotes já criados e têm os seus programas de acordo com esses pacotes, de acordo com os horários do voo de ilha para ilha. Com maior previsibilidade, podemos oferecer os nossos pacotes da melhor forma possível, de acordo com o tempo que os turistas têm em cada ilha. Melhor organização, previsibilidade e estabilidade serão mais-valias para eles e para todos nós”, garante.
Defesa do consumidor
De acordo com o Decreto-Lei (DL) 46/2024, de 6 de Setembro, pretende-se, precisamente, oferecer estabilidade no transporte aéreo inter-ilhas, com “regularidade”, “pontualidade”, “continuidade” e “qualidade”.
A Associação para Defesa do Consumidor (ADECO) fala de “boas perspectivas” e o presidente, Nelson Faria, está expectante.
“A regularidade e previsibilidade, mas, acima de tudo, a qualidade do serviço. E quando dizemos qualidade do serviço, queremos falar do atendimento, da forma como os consumidores são tratados em todas as etapas ao longo do serviço de transportes, mas também do cumprimento das leis relativamente aos passageiros”, aponta.
A ADECO recua no tempo e lembra que o histórico não tem sido favorável aos passageiros.
“Acreditando que o regulador terá capacidade de se fazer presente e fazer respeitar as leis que dizem respeito aos direitos dos passageiros, auguramos que esta nova leva traga vantagens. Mas, naturalmente, se chegámos aqui foi porque o histórico não foi positivo e isso foi demonstrado em várias reclamações que tivemos na ADECO e várias outras avulsas, noutras plataformas”, sublinha o responsável.
Ao publicar em Boletim Oficial (BO) a criação da Linhas Áreas de Cabo Verde, o governo menciona a “instabilidade de operação da única companhia aérea que vinha prestando serviço no mercado doméstico” e os “custos operacionais elevados, que tornam o sector pouco atractivo para a iniciativa privada”.
A TICV, com a marca BestFly Cabo Verde, encerrou as suas operações em Abril, depois de meses de cancelamentos, por falta de frota. Esses problemas levaram a um regresso da TACV (Cabo Verde Airlines) às ligações internas, numa solução apresentada pela tutela como transitória, até à criação de uma nova empresa, finalmente formalizada a 6 de Setembro.
O DL refere a existência de um estudo que demonstra “o interesse e a viabilidade económica, financeira, técnica e estratégia da criação de uma companhia aérea de operações domésticas de transporte de passageiros e cargas”. Junto do governo, o Expresso das Ilhas tentou obter acesso ao documento, mas sem sucesso.
*com Fretson Rocha
(Rádio Morabeza)
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1190 de 18 de Setembro de 2024.