O governo diz querer facilitar uma maior participação dos jovens no crescimento da economia digital e para isso terá criado, com a recente ampliação do governo, uma secretaria de Estado para a Inovação e Formação Profissional. Caberá a esta definir, em concreto, as medidas que o governo irá disponibilizar para aproveitar as condições que o ministro das Finanças diz já existirem “para virmos a nos tornar um dos melhores países do mundo em matéria de criação de empresas, soluções para empresas, start-ups”. Para isso diz contar com o contributo, a irreverência, e esforço dos jovens.
Um destes jovens é Marcos Ferreira, criador da Doutvisions que, de regresso dos seus estudos universitários, escolheu, ao invés de candidatar-se a um emprego, criar o seu próprio negócio. A Doutvisions, que se define como uma empresa que dispõe de soluções audiovisuais e para o marketing digital, oferecendo aos seus clientes serviços baseados em tecnologias digitais, é a primeira empresa cabo-verdiana a estar presente na Web Summit (em Lisboa), evento que reúne empreendedores do ramo das TICs e investidores.
Com o boom dos smartphones em Cabo Verde e apercebendo-se da migração da clientela para estes dispositivos a Doutvisions começou a investir na criação de aplicações. Foi com o seu produto App Self-Service, que diz ser “a primeira plataforma no mundo que vai fornecer aplicações em cloud com funcionalidades de aplicações nativas” que Marcos Ferreira e os seus associados conseguiram chegar à meca das start ups digitais.
A ausência de mulheres no palco de empreendedores digitais foi sentida e apontada. Um dos mais recentes apps criados no país o iFome (que disponibiliza menus de restaurantes da cidade da Praia e efectua a entrega ao domicílio), estava entre as empresas convidadas e ia fazer-se representar por uma das suas criadoras mas acabou por não estar presente.
Da plateia, a engenheira informática Arlinda Peixoto, criadora da popular app PagaLi (que permite o pagamento online de vários serviços e produtos), acabou por dar voz ao desejo expresso por outros de que se visibilize mais as mulheres do sector, ressaltando contudo que estas “estão em pé de igualdade” com os colegas do sexo masculino em termos de dificuldades e oportunidades de negócios.
Pioneira na criação de apps com selo nacional, a Ihaba também foi convidada para a Web Summit mas não conseguiu marcar presença devido a dificuldades na deslocação. Aliás, no encontro promovido pelo ministério das Finanças, José Brito, o criador da empresa - que está neste momento a trabalhar produtos ligados à realidade virtual e realidade aumentada destinados a turistas - lembrou alguns factores fulcrais para a criação de startups e a sua evolução para scaleups, nomeadamente a existência de business angels e venture capitals (investidores abertos ao risco), e incentivos fiscais.
De facto, em países como Portugal que em anos recentes apostou fortemente na criação de um ambiente de negócios propício ao surgimento de startups digitais, o governo investiu dinheiro na parceria com privados identificados como business angels. Empresas abertas a serem incubadoras ou aceleradoras de novos negócios digitais também receberam incentivos.
A internacionalização foi uma meta apontada por todos os representantes das empresas intervenientes, sendo que algumas destas já deram passos importantes neste sentido. É o caso da Green Studio empresa que investe na criação e disponibilização de conteúdos. Não sendo já uma start-up, mas sendo ainda uma empresa jovem, a criação de Saulo Montrond tem já um pé nos Estados Unidos e outro em África, estando em preparativos avançados para entrar no Sudeste asiático onde já tem investidores interessados nos seus produtos.
E por falar em internacionalização e captação de investimento estrangeiro, a Cabo Verde TradeInvest anunciou ontem a disponibilização do conteúdo do seu website em Mandarim. Um passo em direcção à criação do tal ecossistema que Olavo Correia tanto vem falando nos últimos tempos.
No entanto, para Paulo Noel, da Prime Consulting, com essa preocupação com a internacionalização há que ter atenção à tendência para uma certa alienação do mercado local.
“É um sector com tanto potencial que, se não houver um foco no local, rapidamente os quadros saem e esta economia perde-se em Cabo Verde”, avisa o informático que garante que metade dos quadros técnicos mais capacitados deste sector encontram-se já fora de Cabo Verde.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 841 de 10 de Janeiro de 2017.