Foi uma semana cheia para os Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV). A 2 de Junho, a companhia de bandeira passou a operar num novo aeroporto nos EUA, no dia seguinte, 3,retomou as ligações com a Guiné-Bissau e no dia 5 iniciou os voos para o Recife (Brasil). Novos passos que integram uma nova visão estratégica, inovadora e expansionista. O Expresso das ilhas acompanhou o voo inaugural para a Merka onde se acredita ter encontrado um parceiro “perfeito”: o Aeroporto Theodore Francis Green, em Providence (Rhode Island).
No fim de tarde do passado dia 2 de Junho, e ao fim de 7 horas de viagem tranquila, aterrava no Aeroporto T.F. Green o voo 671 da TACV. À chegada, um arco formado por jactos de água, baptizava este voo transatlântico: o voo inaugural entre Praia e Providence e também o primeiro voo internacional acolhido neste pequeno aeroporto americano.
A companhia cabo-verdiana concretizava assim o que se vinha desenhando há algum tempo, deixando de operar no aeroporto de Logan - Boston (Massachusetts) e mudando-se de malas e bagagens para o T.F. Green- em Warwick (Providence, Rhode Island).
Votos de boas-vindas foram ostentados placards e uma pequena multidão, que recebeu a comitiva do voo inaugural, liderada pela Ministra das Comunidades, Fernanda Fernandes, e a encaminhou para um jantar-recepção, no restaurante do aeroporto, onde estavam presentes vários membros da comunidade cabo-verdiana naquele país – mas não só - , entre activistas, empresários, imprensa, políticos e outros.
A abrir a cerimónia, antes do convívio informal sob os acordes de morna, um painel ecléctico de discursos mostrou a importância do acontecimento para ambas as parte. Os discursos da recepção estiveram a cargo de diplomatas dos dois países – nomeadamente o embaixador de Cabo Verde nos EUA, José Luís Rocha e o seu homólogo, dos EUA em Cabo Verde, Donald Heflin –, da governadora de Rhode Island, Gina Raimondo, assim como representantes do Rhode Island Airport Corporation (Kelly Fredericks e Jonathan Savage) e Arik De, o recém-nomeado administrador comercial da TACV, e um dos homens-fortes por trás da nova visão da empresa.
Foram intervenções marcadas por manifestações de amizade e ligação entre os dois países, em particular entre o arquipélago e esse pequeno Estado que é conhecido por “Ocean State”; pelos elogios à activa e bem- sucedida comunidade aí residente e até por alguma promoção turística do Destino Cabo Verde. Mas também por negócios. Tanto pelas vantagens que traz para a TACV, dentro da nova visão estratégica da empresa, como para o próprio aeroporto, até agora exclusivamente doméstico e que arranca assim com as operações internacionais.
O parceiro perfeito
A TACV instituiu-se assim no passado dia 2, como a primeira companhia aérea a realizar voos internacionais para o Green Airport. Nesse contexto, Arik De não conseguiu disfarçar o orgulho de ter “ultrapassado os os alemães, da Condor Airline– que passarão a operar voos entre Providence e Frankfurt a partir de dia 18.
Mas não foi só o lado caboverdiano e dos responsáveis da empresa cabo-verdiana a mostrar o seu agrado. “Queremos crescer, fazer o necessário para marcar a diferença e penso que hoje foi dado um primeiro passo nessa direcção”, salientou o Presidente do Rhode Island Airport Corporation, Kelly Fredericks, na mesma linha do que também o executivo comercial da TACV, referira no seu discurso.
Quanto à razão de ter começado com a TACV, no serviço internacional, Fredericks salienta que esta se apresentou como o “parceiro perfeito”. Olhando os números da comunidade cabo-verdiana em Rhode Island, Connecticut e Massachusetts, que cifrou nos 300.000 (embora haja quem afirme serem ainda superiores), a TACV afigurou-se pois como uma boa aposta. Por outro lado, “conseguimos oferecer melhor [do que Logan], e os nossos clientes podem tirar proveito do nosso conforto e acessibilidade”, acrescentou.
“É a combinação perfeita e quando há alguns meses começamos a cimentar estar parceria, ficou cada vez mais óbvio que era a combinação perfeita. Não poderíamos estar mais felizes”.
Também a governadora de Rhode Island, Gina Raimondo frisou, no discurso que o inicio do serviço de voos internacionais poderá ter impactos muito positivos na economia de Rhode Island. Uma ideia corroborada por Arik De, que prevê benefícios para ambos os lados, mas também pelo embaixador José Luís Rocha.
Passageiros satisfeitos com a troca
Adeus Boston, olá Providence. Embora a maior comunidade cabo-verdiana nos EUA se encontre na zona de Boston, na realidade, os passageiros e acompanhantes com quem falamos parecem contentes com a troca da TACV.
Maria de Jesus Costa veio visitar a família. Chegou num voo de Boston e parte agora de Providence, no mesmo Boeing 757, que aterrou há pouco, vindo da Praia. “Já viajei muitas vezes por Boston, mas acho que este aeroporto é melhor, porque é mais pequeno e há menos confusão”, considera. “Boston tem um aeroporto grande, o que requer mais esforço e requisitos, mesmo a nível dos passageiros”, acrescenta, sublinhando que não lhe parece que a mudança vá prejudicar a comunidade.
O dia é de viagem, mas não para José. Hoje, este cabo-verdiano que mora na América há mais de duas décadas, primeiro em Boston e agora na zona de Providence, veio só acompanhar alguns amigos. Habituado a estas andanças, desdramatiza a saída da TACV de Logan: “Para mim tanto faz ser em Boston ou em Providence, é o mesmo”.
Já Karine, de Providence, que mora nos EUA há 19 anos, não esconde a alegria de ver a TACV a começar a operar perto de casa. Veio trazer o pai, que regressa a Cabo Verde após umas férias e defende que é muito mais confortável vir ao TF Green. “Para Boston apanhamos sempre muito tráfego. Então, poder apanhar o avião a 20 minutos de casa é, para nós, muito conveniente”.
A opinião é aparentemente generalizada, como comprovam aliás outros passageiros que falaram com órgãos de comunicação locais (Ver Caixa: Voo da TACV é notícia na imprensa local). Os passageiros, apontam o fácil acesso, a comodidade, os parqueamentos e ainda o facto de ser um aeroporto mais amigável, como vantagens em relação a Logan. Providence é ainda um ponto mais central para a diáspora espalhada em estados como Connecticut e Nova Iorque, acrescentam.
Esta percepção no local parece, no entanto, contrastar com o que tinha vindo a ser veiculado na imprensa, que apontava um coro de protesto entre os habitantes de Massachusetts, sobre a mudança da rota.
Alexandre Furtado é delegado da TACV nos EUA, há 34 anos. Já passou por Nova Iorque, Boston e chega agora a Providence. Sobre as eventuais críticas à alteração, aponta, como quem já conhece bem o terreno: “até entendo que muitas pessoas que residem em Massachusetts, em Boston sobretudo, e que são mais de metade do tráfego para Cabo Verde, poderão não estar muito satisfeitas. A mudança traz sempre oposições, as pessoas estão habituadas a uma certa rotina. Mas o que eu posso dizer, com certeza, é que não é por virmos para Providence, que os cabo-verdianos vão deixar de visitar a terra mãe”, aponta.
Mais:“ o Green, no estado de Rhode Island quer a TACV a operar aqui”. Para Moisés Rodrigues, Conselheiro Municipal na cidade de Brockton, o facto de um aeroporto mostrar, de facto, vontade em trabalhar em conjunto cria uma boa sinergia para o futuro e para a TACV, que aqui se sente bem-vinda. Ainda mais quando “tivemos grandes problemas em Boston”, um aeroporto cujas dimensões não se coadunava com o trabalho de uma companhia pequena como a cabo-verdiana.
“É uma alegria para nós de Brockton, New Bedford ou mesmo de Boston - a diferença em viagem, não é grande, estamos a falar em minutos, - estar num lugar onde nos querem, em vez de ficar num lugar em que não nos queriam”, reiterou ao Expresso das ilhas, este cabo-verdiano, que há 30 anos vive nos EUA, durante a recepção.
Uma empresa em transformação
Não é, pois, segredo para ninguém que as relações entre a TACV e o aeroporto de Logan, em Boston, não estavam de feição. Mas houve outras vantagens. A TACV anunciara já, igualmente, que a mudança irá levar a uma diminuição dos custos operacionais da companhia, permitindo à empresa injectar cerca de 800 mil contos no seu cash-flow. A par disso, o Green apresenta-se como um parceiro que irá apoiar a promoção do destino Cabo Verde.
É mais um passo na cronologia da empresa nos EUA, uma história que Alexandre Furtado, delegado da TACV nesse país desde 1987, conhece bem. Desde a sua fundação, “a TACV sofreu, não uma mudança, mas uma transformação”. Viemos de uma cultura estritamente doméstica. Em 1984 iniciamos os voos internacionais, para Lisboa. Depois, em 1987, iniciamos para os EUA.” Na altura, a operação ocorria semanalmente com um avião das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM). Depois a aliança com a LAM caiu e entre 1990 e 2000, “por uma década operamos com voos sazonais, principalmente no Verão e em Dezembro, com o propósito de permitir que a diáspora americana conseguisse viajar para a terra mãe durante as festas”. Em 2002, a TACV retomou os voos regulares para Nova Iorque, recorda Furtado. A iniciativa durou pouco tempo, devido ao desgaste dos passageiros em chegar ao aeroporto nova-iorquino. “Cerca de 80/90% do tráfego para Cabo Verde é daqui da região de Nova Inglaterra. Viajavam 4, 5 horas para chegar”, já para não falar no trânsito. Foi então que a empresa decidiu voltar a operação para Boston, “onde estávamos desde 2005”. Foi também a partir desse anos que a empresa passou a viajar com equipamento e tripulação próprios.
Ou seja, há uma cultura na empresa de “aceitar novos desafios” e adoptar novas visões estratégicas.
“Há, de facto, a transformação e temos de acreditar pois existe uma visão estratégica de melhorar a TACV e dar um outro salto.
“Ainda me lembro do tempo em que transportávamos 4000 e tal passageiros”. Hoje, há também cada vez mais passageiros, emigrantes, a viajarem entre Cabo Verde e os EUA. Cerca de “33 mil por ano”, o que mostra não só que há mercado entre as centenas de milhar de emigrantes naquele país, como este está em crescimento.
E no meio de mudanças e restruturações, Arik De, que não esconde o seu intuito de levar a TACV aos melhores resultados da sua história, avançou no meio de aplausos que nos últimos meses 87% dos voos da empresa cumpriram o seu horário. O administrador comercial destacou ainda o novo voo para o Recife, que passa a ser o segundo destino da TACV no Brasil, depois de Fortaleza. E ainda os novos voos domésticos, num total de 50 conexões que a empresa pretende lançar. Recorde-se ainda que no dia 3 foi ainda retomada a ligação com Bissau, três anos após os voos terem sido suspensos na sequência do golpe de Estado de Abril de 2012.
O voo Praia-Providence, no qual é usado o Boeing 757 da TACV, com capacidade para 210 passageiros, tem lugar às terças e quintas, com um voo adicional às quartas de 1 de Julho a 9 Setembro.
Mas se por um lado, a maior parte dos cabo-verdianos na América se mostra satisfeita com a mudança de aeroporto, por outro reina a insatisfação no que toca ao preço dos bilhetes. Uma pesquisa rápida, para os próximos meses, mostra que os valores se situam sempre à volta dos 100 contos. Fica a esperança confessada pelos passageiros e pela comunidade, nesse dia de voo e em vário outros, de que a nova visão da TACV, toda a sua reestruturação e reengenharia de voos, e a muito anunciada diminuição dos custos de operação, tragam efectivamente resultados ao nível do bolso dos clientes.
Voo da TACV é notícia na imprensa local
O voo inaugural da TACV para o aeroporto T.F. Green em Warwick, Providence, pela importância económica para Rhode Island e sua comunidade imigrante, foi sem surpresas, destaque na imprensa local. O “The Providence Journal”, intitula na primeira página: “Welcome to Providence” (Bem-vindos a Providence) e começa por relatar o momento da aterragem, desde o momento em que as luzes do voo 671 dos TACV apareceram por entre as nuvens negras até, à aterragem, na pista 5, onde o avião atravessou um arco de jactos de água, lançados pelos dois carros de bombeiros do aeroporto. Descreve ainda como os pilotos abriram as janelas e agitaram as bandeiras cabo-verdiana e americana.
O jornal, fundado em 1829, avança ainda que este voo traz para o principal aeroporto do estado de Rhode Island - que tem tido um fraco número de passageiros - a esperança de um futuro brilhante, com novos voos internacionais em perspectiva, a começar pelo da alemã condor Airlines, no próximo dia 18.
A notícia continua no interior, ilustrada com foto de cabo-verdianos, emocionados a receber os familiares que chegaram no voo, e vai descrevendo o ambiente à chegada dos 177 passageiros deste primeiro voo transatlântico para Rhode Island.
Antónia Monteiro, de North Providence, que aguardava a chegada do irmão, Nilton, que vive no arquipélago, congratulou-se com a mudança de Boston para Providence: «É mais fácil para nós», disse.
O «Providence» falou ainda com Sandro Correia, um músico de Boston, que afirmou prever que na realidade, viajar de Green lhe permitirá poupar tempo, devido à facilidade de acesso.
Também o “Warwick Beacon”, numa peça intitulada “It’s Now” - Green Internacional”, dá destaque, na primeira página, ao testemunho duas irmãs, Madeleine e Rosa Cartagena, de Brockton, que defendem que a comodidade do Green Airport bate o trafico do aeroporto Logan, em Boston.
No interior, encontramos Antónia Brito, uma mulher de negócios, de Brockton vai entra aqui na 36º viagem EUA-Cabo Verde e de que também manifestou o seu agrado em viajar a partir do Green.
O Beacon salienta que o serviço do Green é o único voo directo de Cabo Verde para a América do Norte. E a par com as negociações do aeroporto com a Condor, avança que estão já em curso outras com a Irlanda (mas não refere a companhia)
O jornal aborda ainda de preços, com alguns passageiros a afirmarem terem pago 700 dólares, enquanto outro referem «tarifas tão altas como 1200 dólares».
Por fim , avança que o aeroporto, irá passar por obras de melhoramento para acolher os voos transatlânticos, com um projecto de expansão da pista principal que devera estar completo em 2017.
O Expresso das Ilhas viajou a convite da TACV.