"Tenho informação que os deputados vão tomar posse. Bem-aventurados são eles, mas que saibam onde andar. Eu agora não vou poupar mais ninguém: autocarro de passageiros, homem ou mulher, vou bater. Já não há mais brincadeiras", disse à Lusa Mariano Nhongo, falando em contacto telefónico a partir de um ponto incerto do centro de Moçambique.
Em causa estão os ataques que se têm registado nas estradas nacionais EN1 e EN6, nas províncias de Manica e Sofala, incursões que já provocaram 21 mortos e têm sido atribuídas à autoproclamada Junta Militar da Renamo, um grupo de guerrilheiros dissidentes do partido que exige a renegociação do acordo de paz assinado em 06 de agosto e a demissão do actual líder daquela força política, Ossufo Momade.
O líder da autoproclamada Junta Militar da Renamo critica a tomada de posse (marcada para segunda-feira) dos deputados da Renamo, enquanto "os guerrilheiros estão no mato a sofrer, sem sapato nem comida".
"Hoje, deixaram de fora os guerrilheiros e estão a ir tomar posse, o que isto significa?" questionou Mariano Nhongo, acusando a liderança do partido de estar a afastar-se dos ideais do líder antecessor de Ossufo Momade, Afonso Dhlakama, que morreu em 2018.
O líder da autoproclamada Junta Militar disse que enviou um documento para o Governo moçambicano, em 02 de Outubro, e para o grupo de contacto das negociações de paz com todas as condições para reintegração dos seus guerrilheiros, mas não teve uma resposta.
"A Junta Militar não reconhece os deputados que estão a tomar posse", disse o líder do grupo, acrescentando que o que está a acontecer com os guerrilheiros da Renamo "não é o que foi combinado nas negociações".
"Aos empresários que estão aqui dizemos: cuidem das vossas coisas. Moçambique não está bem", frisou Nhongo.
Sobre a detenção de seis indivíduos alegadamente pertencentes à Junta Militar anunciada pelas autoridades na quarta-feira, Nhongo não os reconhece.
"Se realmente eles são membros da Junta Militar que perguntem a eles sobre a zona onde estou", afirmou.
Oficialmente, a Renamo tem-se afastado de qualquer ligação com Mariano Nhongo, classificando-o de desertor.
Desde agosto, um total de 21 pessoas morreram em ataques armados de grupos nas províncias de Manica e Sofala, incursões que têm afectado alvos civis, polícias e viaturas, atribuídas pelas autoridades a guerrilheiros do braço armado da Renamo que permanecem na região.
Em finais de Dezembro, o ministro do Interior de Moçambique, Basílio Monteiro, anunciou o reforço de medidas de segurança em Manica e Sofala, que incluem o reforço do policiamento e escoltas em alguns troços, um cenário que remonta ao pico, entre 2014 e 2016, dos confrontos militares na crise política entre o Governo moçambicano e a Renamo.
As incursões acontecem num reduto da Renamo e onde os guerrilheiros daquele partido se confrontaram com as forças de defesa e segurança moçambicanas e atingiram alvos civis até ao cessar-fogo de Dezembro de 2016.
O grupo dirigido por Mariano Nhongo, antigo general de Dhlakama, permanece entrincheirado nas matas da região centro de Moçambique.
Este é o episódio mais recente das divisões no partido após a morte de Dhlakama.
A guerra civil de Moçambique causou dezenas de milhares de mortos, entre 1977 e 1992.
Apesar dos vários acordos de paz que levaram o país ao multipartidarismo, a reintegração dos guerrilheiros nunca ficou resolvida e a Renamo manteve sempre um braço armado activo, principalmente no centro do país.