O militar, um dos principais líderes do Exército durante o golpe de 1987, é acusado de "ataque à segurança do Estado", "cumplicidade no assassinato", "ocultação de cadáveres" e "aliciamento e constrangimento de testemunhas".
"Declaro-me inocente em relação a todas as quatro acusações", afirmou, em pé, segundo a agência France-Presse, o general, que se apresentou vestido com uniforme militar.
Diendéré explicou então o que fez durante o dia 15 de Outubro de 1987, a data do golpe em que Thomas Sankara e 12 dos seus companheiros foram mortos.
O general disse que se deslocou na parte da tarde ao "campo desportivo" do quartel-general do comando militar do Conselho Nacional da Revolução (CNR, no poder), onde se encontrava quando "ouviu tiros".
Diendéré afirmou que falou com dois soldados que conhecia e que lhe terão dito que tinham ido ali "para impedir" que Thomas Sankara prendesse o seu "chefe", Blaise Compaoré, que viria a tomar o poder na sequência do golpe de 15 de Outubro.
Compaoré, o "braço-direito" de Sankara, é acusado dos mesmos crimes que Diendéré e é suspeito de ser o cérebro do assassinato - o que sempre negou, e o general hoje confirmou: "Perguntei se Blaise estava ciente do que tinham feito, responderam de forma negativa", explicou em tribunal.
Segundo Diendéré, Blaise Compaoré só chegou ao local do massacre no final da tarde, três horas após o golpe.
Compaoré, hoje com 70 anos, vive na Costa do Marfim, onde está exilado desde que foi derrubado, em 2014, e goza de nacionalidade costa-marfinense, que o protege da extradição e de um mandado de captura internacional emitido pelo Burkina Faso há seis anos.
Os advogados de Compaoré justificaram a ausência do antigo presidente, denunciando o que consideraram "um julgamento político" executado por "um tribunal de excepção".
Gilbert Diendéré, chefe da segurança pessoal de Compaoré, encontra-se já a cumprir uma pena de prisão de 20 anos por tentativa fracassada de golpe de Estado em 2015, e está a responder na qualidade de detido.
O julgamento dos presumíveis assassinos de Thomas Sankara deverá durar vários meses, e é há muito esperado pelas famílias das vítimas.
A rede internacional "Justiça para Thomas Sankara, justiça para África" sublinhou na abertura do julgamento em meados de Outubro o risco de não ser abordado o papel desempenhado por França, Estados Unidos da América e países da África Ocidental, como a Costa do Marfim, de Félix Houphouët-Boigny, e o Togo, de Gnassingbé Eyadema.
Durante uma viagem a Ouagadougou em novembro de 2017, o Presidente francês, Emmanuel Macron, prestou homenagem à memória de Thomas Sankara e anunciou o levantamento do segredo de defesa sobre documentos relacionados com o seu assassínio, há vários anos solicitados pelo Burkina Faso.
No rol de testemunhas arroladas constam o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros francês Roland Dumas, bem como o ex-ministro da Cultura Jack Lang.
O tribunal militar também pretende ouvir Jean-Christophe Mitterrand, filho do antigo Presidente de França François Mitterrand, que era conselheiro do seu pai para assuntos africanos na época dos factos.
Thomas Sankara deixou uma marca indelével em África, onde ficou conhecido com o "Che Guevara africano". Foi um líder icónico, assumiu o poder muito jovem, com apenas 39 anos, na sequência da revolução de 04 de Agosto de 1983, onde combateu ao lado dos seus irmãos de armas e se assumiu como "protagonista de uma história fantástica de amizade e solidariedade entre as revoluções africanas dos anos 80", na expressão de Carine Kaneza-Nantulya, directora para os Assuntos Jurídicos na divisão de África da organização não-governamental Human Rights Watch, em declarações à Lusa.
Logo no ano seguinte à sua chegada ao poder, Sankara mudou o nome do país, numa tentativa de enterrar com as insígnias da República do Alto Volta a herança do poder colonial francês. O país de Sankara passou a chamar-se República Democrática e Popular do Burkina Faso, que significa "país do povo honesto".
O "Che Africano", que queria "descolonizar as mentalidades" e perturbar a ordem mundial através da defesa dos pobres e oprimidos, acabou por ser assassinado em 15 de Outubro de 1987, juntamente com 12 dos seus companheiros que faziam parte do núcleo duro da sua 'entourage' política.