Os movimentos de última hora de votos de outros candidatos da Bolsonaro, o elevado número de indecisos que se desfez só na última hora e um perfil de um eleitorado que vota no Bolsonaro, e que não estava claro, foram as principais razões, sintetizaram.
As sondagens divulgadas na véspera das eleições presidenciais, como a do instituto Datafolha, deram apenas 36% das intenções de voto a Jair Bolsonaro e 50% dos votos a Lula da Silva, ou seja, uma possível vitória logo à primeira volta.
O Presidente brasileiro teve quase mais oito pontos percentuais (43,2%) e Lula da Silva 48,43%, quando estão apuradas 99,99% das seções de voto.
Em terceiro lugar, mas com apenas 4,16% dos votos, ficou a candidata Simone Tebet, enquanto o candidato Ciro Gomes ficou foi o quarto mais votado, com 3,04%.
"Se você olhar para as pesquisas, Ciro Gomes aparecia com 6%, 7%. Ele terminou com 3%, que é exactamente a diferença de pontos percentuais de Bolsonaro para cima da margem de erro", explicou à Lusa o professor permanente do programa de pós-graduação em ciência política e do programa de pós-graduação em comunicação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Emerson Urizzi Cervi.
Ciro Gomes, um candidato de centro-esquerda, passou grande parte da campanha eleitoral equiparando Lula e Bolsonaro, definindo o actual líder brasileiro como "um ladrão do mal", e o antigo chefe de Estado "um ladrão do bem".
"O antipetismo é maior do que se pensava, ficou bem claro", disse, por outro lado, à Lusa, o professor universitário de Sociologia Política Alexandre Camargo, defendo ainda que a campanha do voto útil feita por Lula da Silva, "a abordagem, a estratégia, a comunicação com o público para a atracção de voto do Ciro Gomes" falhou.
Alexandre Camargo explicou ainda que "uma parte importante mudou o voto em cima da hora".
"Isso é facto, independentemente da responsabilidade dos institutos no erro que eles tiveram", defendeu.
Outra das razões apontadas pelo professor do programa de mestrado em Sociologia Política da Universidade Cândido Mendes (UCAM) foi a de que "aparentemente pode ter havido um erro na amostragem sobretudo em relação ao voto de segmentos de classes populares".
Na opinião de Emerson Urizzi Cervi, ficou claro que o eleitor não quis passar um 'cheque em branco' ao ex-chefe de Estado brasileiro.
"Hoje já há agentes do mercado económico a falar que a política económica será liberal, porque Lula vai ter de negociar", disse, acrescentando que "até agora Lula falava em revogar parte da reforma do trabalho", uma medida que não deverá ser levada para a segunda volta.
Já o professor Alexandre Camargo, apesar de reconhecer que em relação a Lula "muitas questões são colocadas especialmente pelos sectores do mercado, empresários, agronegócio, que têm uma preferência por Bolsonaro", a aproximação ao centro do ex-Presidente brasileiro já tinha vindo a ser feita na campanha, principalmente com a escolha de Geraldo Alkimin, um político de centro direita, para ser seu vice-presidente.
"O aceno do Lula ao centro terá que ser ainda mais forte do que aquele que veio até agora", disse.
Ainda assim, apesar do resultado surpreendente de Bolsonaro, a diferença para Lula são de cerca de seis milhões de votos, ressalvou Emerson Urizzi Cervi, recordando que o resultado no domingo foi o melhor desempenho das seis primeiras voltas presidenciais em que Lula da Silva participou.
"Não é pouca coisa. Bolsonaro vai ter de trabalhar mais", concluiu.