Em Genebra, o Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Turk, condenou a medida imposta terça-feira pelo regime talibã e exigiu a anulação da decisão, considerando tratar-se de "mais um golpe terrível e cruel aos direitos das mulheres e raparigas afegãs", bem como "um revés profundamente lamentável para todo o Afeganistão".
Para o diplomata austríaco, a exclusão "sistemática" das mulheres de quase todos os setores da vida pública em sociedade no Afeganistão desde que o regime talibã retomou o poder, no verão de 2021, "não tem qualquer paralelo no resto do mundo".
O Alto-Comissário da ONU para os Direitos Humanos lamentou que a decisão vá privar o Afeganistão de futuras médicas, advogadas e recordou que a medida pressupõe "uma clara violação das obrigações" de Cabul a nível internacional.
Com a proibição de frequentar as universidades, depois de o regime talibã já ter proibido também o acesso ao ensino secundário, a escolarização das meninas afegãs terminará aos 12 anos.
A decisão de Cabul também foi condenada pela Organização para a Cooperação Islâmica (OCI), que congrega 57 países, que, num comunicado, afirmou-se "consternada" e pediu às autoridades talibãs a revogação da medida.
"O secretário-geral da OCI, Hussein Ibrahim Taha, expressou profunda preocupação e condena a medida tomada pela 'administração de facto' de encerrar indefinidamente as universidades a raparigas e mulheres, o que é, também, inquietante", lê-se no comunicado da organização, com sede na Arábia Saudita.
A OCI lembra que, em Novembro passado, o representante da organização para o Afeganistão e o próprio secretário-geral tinham advertido o regime talibã para não tomar essa decisão, pelo que a medida agora tomada "vai contribuir significativamente para a descredibilização" das autoridades de Cabul.
Em Bruxelas, o chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Josep Borrell, na sua conta na rede social Twitter, classificou também hoje como um "crime contra a humanidade" a proibição pelo regime afegão talibã do acesso de mulheres à universidade.
Numa mensagem divulgada, Borrell salienta que a UE "condena veementemente a decisão dos talibãs de suspender o ensino superior às mulheres", salientando que "a perseguição baseada no género é um crime contra a humanidade".
O Alto Representante para a Política Externa dos 27 Estados-membros do bloco europeu adiantou ainda que esta decisão, "única no mundo", priva o Afeganistão "dos contributos das mulheres para a sociedade".
Também em Berlim, a chefe da diplomacia alemã, Annalena Baerbock, lamentando a decisão, considerou que os talibãs "decidiram destruir o futuro do próprio país".
A representante adiantou, nas mesmas declarações, que vai colocar o tema nas discussões do grupo dos sete países mais industrializados do mundo (G7), cuja presidência rotativa é atualmente assumida pela Alemanha.
"Ao destruir o futuro das suas filhas, já privadas do ensino secundário, e das suas mulheres no Afeganistão, os talibãs decidiram também destruir o futuro do seu próprio país. O mundo está atento. Irei colocar a questão na ordem do dia do G7, que se reunirá antes do final do ano", escreveu Baerbock na rede social Twitter.
Ainda na terça-feira, a ONU e os Estados Unidos também condenaram a decisão do regime talibã, com o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, a mostrar-se "profundamente alarmado", tendo pedido a Cabul para "assegurar a igualdade de acesso à educação a todos os níveis".
"O secretário-geral reitera que a negação à educação não só viola a igualdade de direitos das mulheres e raparigas, como terá um impacto devastador para o futuro do país", disse Stéphane Dujarric, porta-voz de Guterres.
"Os talibãs não podem esperar ser um membro legítimo da comunidade internacional até que respeite os direitos de todos os afegãos, especialmente os direitos humanos e as liberdades fundamentais de mulheres e meninas", sublinhou, por sua vez, Robert Wood, representante norte-americano para os assuntos políticos especiais nas Nações Unidas.
Durante uma intervenção numa reunião do Conselho de Segurança da ONU, Wood condenou "veementemente" a ação do regime talibã, classificando-a como uma "posição absolutamente indefensável".
No Afeganistão, a medida, também apanhou de surpresa grande parte das mulheres que hoje se deslocaram para as universidades, mostrando-se incrédulas e chocadas pelo facto de a polícia afegã, fortemente armada, as impedir de aceder às instalações.
"Estamos condenadas a viver como pássaros em gaiolas. Quando li a notícia na Internet (...) fiquei chocada e surpreendida e comecei a chorar", disse à agência noticiosa France-Presse (AFP) Amini, uma aluna do curso de enfermagem, profissão que esperava, mais tarde, exercer em Kunduz, no norte do país.
À AFP, a jovem contou que esperava através dos estudos obter apoio financeiro para apoiar a família, numerosa, mas a decisão anunciada na terça-feira pelas autoridades talibãs frustrou a esperança numa vida melhor após 20 anos de guerra.
"Todas nós nos sentimos como pássaros numa gaiola. Amontoamo-nos, gritamos e choramos ao imaginar que tudo isso está a acontecer connosco", reforçou Amini.
"Estamos condenadas, perdemos tudo. Isto ilustra o analfabetismo e a ignorância deles [do regime talibã] no Islão, bem como a falta de respeito pelos direitos humanos", disse outra estudante, que pediu o anonimato, ladeada por um grupo de homens, igualmente estudantes, que partilham o desgosto das colegas.