Longe de sol dnha terra
ta rolâ na África
ta rolâ n’Iropa
ta rolâ na Merca
ta rolâ na mapa
ta rolâ na munde
“Recode d’Umbertona”,
Corsino Fortes,
in Pão & Fonema, 1974
Sempre se disse que os dois recursos de Cabo Verde são a sua latitude e a sua longitude, pontos fixos, ou seja, a sua posição geográfica. Foi por isso que, ao longo da sua história, as ilhas foram tidas ora como ponto de apoio para as descobertas e ao comércio na costa, ora como ponto de referência, ora como ponte ligando as duas margens do Atlântico.
Ponto de Apoio e de Referência
Ponto de Apoio às Descobertas e ao Comércio na Costa
Aconteceu quando, em 1462, começou a tarefa do povoamento das ilhas. Isto foi feito com o propósito de fazer destas um ponto de apoio à navegação e de assegurar a continuidade das descobertas mais para o sul e o comércio na costa.
Ponto de Referência como Linha Divisória do Mundo
Ocorreu com o Tratado de Tordesilhas, assinado na povoação castelhana de Tordesilhas em 1494, celebrado entre o Reino de Portugal e o de Castela para dividir as terras “descobertas e por descobrir” por ambas as Coroas fora da Europa.
O tratado surgira na sequência da contestação portuguesa às pretensões da Coroa de Castela, resultantes da viagem de Cristóvão Colombo, que, um ano e meio antes, chegara ao chamado Novo Mundo, reclamando-o oficialmente para Isabel, a Católica (1474-1504), e definiu como linha de demarcação o meridiano a 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão no arquipélago de Cabo Verde.
Ponte de Ligação das Margens
Sendo a ponte algo que liga dois sítios ou duas margens, no caso de Cabo Verde, o arquipélago é a ponte que liga dois grupos étnicos, um proveniente da Europa e outro da África, e duas partes do mesmo Atlântico, a norte e a sul.
Ponte entre Grupos Étnicos | Miscigenação Biológica e CulturalA individualização cultural ou a identidade do homem cabo-verdiano, muito cedo definida, adveio desta sua mista realidade – a africana e a europeia – com características diversas e cheia de contrastes.
Cabo Verde é um caso sui generis em que o homem, sendo fruto de caldeamento de raças e de instituições, soube cedo encontrar o seu caminho e a sua identidade cultural. O folclore, a música popular, a língua crioula e as formas cultas de literatura são os principais traços que o caracterizam e o individualizam.
É este homem crioulo, produto da terra onde nasceu e das circunstâncias sociais e históricas que o enformaram, que aqui se procura dar a conhecer e entender.
Portos Marítimos ligando Europa | África | AméricasFoi, primeiro, com o Porto de Ribeira Grande em Santiago (Séc. XV-XVIII);
Foi, depois, com o Porto de Sal-Rei na Boa Vista (Séc. XVIII-XIX);
Foi, ainda, com o Porto de Furna na Brava (Séc. XVIII-XIX);
Foi, também, com o Porto Grande em São Vicente (Séc. XIX-XX).
Partindo dos pontos fixos da sua localização geográfica, numa altura em que se discute a dupla ancoragem de Cabo Verde – a sua integração na Comunidade Económica da África Ocidental (CEDEAO) e um estatuto especial na zona periférica da Europa (EU) – as ilhas continuam tendo a mesma vocação, a de ser ponto de referência no mundo e ponte de ligação entre continentes, que precisa de ser valorizada e potenciada.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 863 de 13 de Junho de 2018.