Já há algum tempo que a artista preparava este disco. Talvez tenha saído no momento certo, certamente que uma semana a mais já seria muito.
As canções iam claramente sendo feitas à medida de momentos que a cantautora traduzia para letras-poemas. Letras sentidas e que traduzem sentires.
Passando para o espetáculo em si, este quase que se organizou em três episódios ou blocos, onde a cada um correspondia um pedaço de vida da Zubikilla…agora cantado.
Na organização do guião, a intensidade emocional de cada um dos blocos ia aumentando, fazendo com que o público também seguisse a viagem. E como seguiu. Na verdade, a sala intimista do CCP é propícia para criar o intimismo necessário para o lançamento de um disco – relembrando que é o momento mais intimista do que um espetáculo programado. Na sala pareciam estar as pessoas que Zubikilla queria, as mais próximas, as mais queridas e os seus seguidores mais directos.
O público ia-se misturando com as canções e sentires da Killa e conjuntamente fazendo viagem. Em cada canção, um momento; em algumas notas, intensos suspiros.
As notas eram soltas e livres, porém soavam em momentos próprios e sentidos, em coordenação cuidada músicos-cantora. Em palco um grupo de músicos de excelência, que por sinal são todos também amigos íntimos de Zubikilla. Só assim seria possível a intensa rede de emoções, em cores de girassol que ligavam a artista ao palco físico e que, num todo, escorria e banhava de forma natural o público. O espaço CCP tornou-se num só momento – o momento 03:04.
Numa formação inovadora, onde a guitarra de Jorge Almeida preenchia silêncios e destacava solos, duas vozes do coro – tornavam-se muito mais do que tal – eram, sim, perfeitas camas melódicas onde a maquinaria criativa do Dj Rango trabalhava não só o formato “backing tracks” (onde faziam o real papel deste formato – instrumentação de apoio e não de “substituição” como muitas vezes vemos serem usadas) mas ainda intervenções em momentos necessários. Voltando às vozes do coro – belíssimas Odailine e Sílvia Medina que, livres, porém, em conjunto, trouxeram real significado da palavra “coro”. Não poderia deixar de referir, ao momento superior do dueto entre Sílvia Medina e Zubikilla, num tema que a música certamente agradeceu.
Resta-me a referência à cantautora… a que nos contou músicas.
Para mim, é valioso e diferenciador ver em palcos da nossa música um espetáculo só com temas escritos pelo autor. Se para além disso juntarmos o extremo à vontade de estar em espaços-palco, neles se movimentar e fazer o grupo movimentar-se, interagir com o público até tê-lo inteiramente como componente do espetáculo – é fácil adivinhar que falamos de uma das mais sérias frontwomans da nossa música. Com ela uma voz que sobe e desce, murmura e impõe-se ao sabor do momento-música em doses preciosas e precisas.
Para quem estudou esta parte dos eventos, o espetáculo foi literalmente académico, seguindo as regras de como se deve estruturar o mesmo.
Para quem é amante da música, fica uma das frases que ouvi do público: “um espectáculo com mais abraços do que “selfies”… sim, muito mais.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1131 de 2 de Agosto de 2023.