Os noticiários de Cabo Verde e a imprensa oficial de Moçambique dão-nos conta da sua visita a Cabo Verde a convite da sua homóloga Debora Katiza Carvalho, para lançamento da campanha das Primeiras Damas de África para o desenvolvimento #SOMOSTODOSIGUAIS (#WeAreEqual). Vejo pelas fotografias que circulam nas redes sociais a sua felicidade por estar neste país tão amorável. Quem a vê, nem percebe que é a Primeira Dama de um país que vive uma situação de contestação social do Rovuma a Maputo, com o Povo reclamando Justiça e o fim de quase 50 anos de um regime que não respeita as liberdades fundamentais e prospera enquanto milhares de moçambicanos vivem abaixo do limiar da pobreza.
Como mulher e mãe que sou, não consigo compreender como é que a senhora Isaura tem espírito e disponibilidade para viajar para o exterior neste preciso momento. Geralmente, quando somos mães e a senhora gosta de se assumir como mãe da nação, não saímos de casa quando os nossos filhos estão com problemas, choram e pedem a nossa atenção.
A campanha que a trouxe cá «Somos Todos Iguais» e com a qual a Senhora Isaura diz que se solidariza e apadrinha, não encontra resposta em Moçambique. Em Moçambique, uma terra rica de recursos naturais e de gente trabalhadora, o povo vive na miséria, muitas crianças só têm direito a escola debaixo de uma árvore, os hospitais não têm as condições mínimas, as meninas são obrigadas a se casarem para que a família obtenha rendimentos.
Nesta terra cabo-verdiana onde as pessoas são amáveis, educadas e politicamente corretas, ninguém teve coragem de a confrontar com a violência que se vive em Moçambique. Por isso pôde circular entre nós sem ser perturbada por nenhuma manifestação.
Mas aqui também há moçambicanos que têm família na terra e todos os dias, a toda a hora, vão acompanhando o que se vive na nossa terra Moçambique e estão horrorizados. Eu sou uma delas.
E é nesta qualidade de moçambicana e imbuída de uma espiritualidade de serena esperança que me dirijo a si, Senhora Primeira Dama, solicitando encarecidamente que use toda a sua influência junto do seu marido e Presidente da República, para que ordene o fim da violenta repressão policial e militar. Aconselhe-o a ouvir o que o Povo pede e crie as condições reais para um diálogo. Um diálogo com todas as forças políticas e sociais do país. Um diálogo cuja preparação comece por levar à Justiça todos os elementos das forças de segurança que assassinaram e feriram pessoas por se manifestarem ou por estarem na rua.
De mãe, para mãe, peço-lhe, Senhora Nyusi, que crie uma campanha de apoio financeiro e psicológico às famílias das vítimas dos excessos das forças de segurança nas últimas semanas, honrando assim a sua palavra de que somos todos iguais.
Com este apelo, despeço-me, cara irmã, com a forte esperança de que possamos ser todos iguais de coração e de compaixão uns para com os outros e espero que na próxima vez que visite Cabo Verde nos traga notícias de Paz e bem estar e liberdade do povo moçambicano.
Cordialmente,
Lígia Dias Fonseca
Advogada
Mãe
Caboverdiana/Moçambicana a residir em Cabo Verde