A Escola Secundária Abílio Duarte, no Palmarejo, tem este ano aproximadamente 125 estudantes finalistas. É, segundo Paulo Barbosa, presidente da Comissão de Finalistas, a escola da cidade com o menor número de finalistas. São 125 alunos que chegam juntos ao fim de um percurso de seis anos e que tradicionalmente é coroado com a cerimónia de imposição de fita e festa.
Os preparativos para este momento especial da vida estudantil começam pouco tempo depois do início do ano lectivo. Na Escola Abílio Duarte a escolha dos elementos para a Comissão de Finalistas é criteriosa. O histórico escolar dos alunos é verificado. Não podem ser membros da comissão alunos com média inferior a 14 e que não tenham comportamento Bom.
As datas para a festa já estão calendarizadas. A 23 de Junho será a cerimónia das fitas, em que os pais ou encarregados de educação participam e testemunham emocionados o momento que marca o fim de uma etapa. Dias depois, a 27, o jantar de gala. Este só para os estudantes.
“Não temos tradição de fazer viagens de finalistas mas, estamos a pensar nisso. Pelo menos para os membros da Comissão de Finalistas. Não será possível uma viagem para fora da ilha mas, mesmo aqui dentro de Santiago. Tarrafal, talvez”, cogita Paulo Barbosa que elogia o trabalho dos seus colegas na comissão.
É o presidente da comissão que nos informa que para um finalista participar de toda a festa não fica por menos de seis mil escudos. Só o traje, para os estudantes da Abílio Duarte, fica em três mil escudos. Se juntar a roupa e outras despesas com a matinée dançante e o jantar de gala...
“Recebemos uma série de propostas de costureiros para confecção do traje. Avaliamos e submetemos à opinião de todos os finalistas e acabamos por fazer a nossa escolha. Trata-se de um único costureiro, isto é, uma empresa. Foram lá à escola tirar as medidas aos estudantes. Eles começam a trabalhar com cerca de três meses de antecedência”.
O negócio dos trajes de finalistas é lucrativo. Para os ateliers na Cidade da Praia mais do que o Carnaval.
Na tarde em que chegamos ao atelier de Any Reis, entre Terra Branca e Várzea, o frenesim da costura era intenso mas não ainda aquilo a que ela chama de “máximo cabedal”. O ritimo só se torna deveras febril quando falta cerca de uma semana para a cerimónia de imposição de fitas dos finalistas e um ligeiro pánico de não conseguir terminar a tempo se instala.
“Mas sempre consigo terminar e entregar tudo. Se não no dia combinado, pelo menos na véspera do dia de Finalista”, ri-se a mulher esguia e pequena que comanda um atelier de dois costureiros fixos mas que nesta altura do ano sempre recruta ajudantes pois não têm mãos a medir para o volume de encomendas que recebe.
“Sim, finalista é bom para o negócio mas é muito cansativo. Estou a confeccionar cerca de 300 trajes, então é impossível conseguir fazer só com o pessoal que tenho sempre aqui”, diz-nos.
O preço de cada traje fica por 3.200$, o que quer dizer que o seu atelier vai angariar quase mil contos com o negócio de Finalista. Mas a costureira lembra que este tipo de encomenda, na qual começa a trabalhar logo a seguir ao Carnaval, significa exclusividade. Ou seja, enquanto confecciona os trajes de finalistas o seu atelier não aceita nenhuma outra encomenda.
“Tento pôr o máximo de qualidade no meu trabalho. Então não uso tecido barato e nem faço costura desleixada como já vi por aí. Dificuldade, só se for a demora de alguns estudantes em vir tirar as medidas e às vezes a escassez de um certo tipo de tecido”.
Tudo para que nada falhe num dos momentos mais especiais da vida de um estudante. Para aí chegar a Comissão trabalha ao longo do ano na organização de vários eventos de angariação de fundos. Desde torneios desportivos aos famosos concursos de Miss e Mister, para além de cockteils para os professores e matinées dançantes. Patrocínios de empresas são também garantidos.
“Traz muitas lembranças do meu tempo mas, ao mesmo tempo, tudo é muito diferente”, diz Ivone Correia, mãe de um finalista do liceu de Achada Santo António.
“No meu tempo só começavamos a preprar a festa bem em cima, não tinhamos toda essa organização, nem essas actividades todas para juntar dinheiro. Iamos de porta em porta a pedir, e também às casas comerciais. O dinheiro era mesmo para a organização da festa, que era no mesmo dia em que punhamos a fita”, recorda esta mãe que por pouco ainda apanhava a época em que para ir “pôr fita” não era preciso traje especial.
“No ano antes de eu ser finalista ainda não havia ainda essa coisa da batina, cada um comprava a sua roupa nova e ia como dava”, afirma, considerando exagerado o preço de um traje de finalista.
Para além da festa
A festa de finalista é aguardada e celebrada por todos. Independente da média final e de garantias de poder prosseguir os estudos numa universidade.
Para Adelsa Rodrigues, da escola Constantino Semedo, vai ser um momento agridoce, porque já sabe que não reúne condições para conseguir uma vaga e uma bolsa para o exterior. A família é humilde. A custo, conseguiu frequentar o 12º ano até ao fim e, por opção sua, diz, não seguirá para a universidade mesmo aqui no país. Pelo menos não já no proximo ano lectivo.
“Quero trabalhar primeiro, juntar dinheiro. Mas já sei que não vou conseguir trabalho de recepcionista. Se conseguir empregada de mesa já será muita sorte. Acho que vai ter que ser empregada doméstica mesmo”, reflecte entre risos.
Os planos e perspectivas de Mara Patrícia são outros. Colega de Paulo Barbosa no Liceu Abílio Duarte, já tem decidido que irá continuar os estudos em Portugal. Quer seguir Medicina Dentária e aguarda os anúncios de vagas para se candidatar a uma. Não vai tentar uma bolsa porque os pais criaram as condições para lhe custear o curso superior.
“ O 12º ano foi bom. Menos pesado do que o ano passado. Mesmo assim, para nós da àrea CT (Ciências e Tecnologias) pelo menos, foi um pouco a correr, as matérias sendo dadas muito rapidamente... Até porque houve demasiados feriados, uns em cima de outros, e em alturas de aulas importantes. Mas foi bom. Da minha parte, não tive grandes dificuldades”, resume a adolescente o seu ano de finalista. Ela que dispensou a todas as disciplinas, isto é, não tem que fazer as PGN que começam daqui por duas semanas.
A decisão do curso a seguir e de ir para Portugal foi sua. Os pais acompanham de perto mas deram-lhe total independência para escolher, tendo aceitado o curso por ela escolhido sem receios quanto ao Futuro.
Mara Patrícia também não se mostra receosa. “Sei que há muita gente a fazer o curso que quero seguir mas, acredito que vai depender do desempenho de cada um. Se fores um bom profissional vais conseguir espaço independentemente do mercado estar cheio ou não. Cabe a cada um dar o seu máximo e destacar-se”, opina.
Para Adelsa, o sonho de uma licenciatura em Gestão fica adiado até “quando der”. Prática e avessa a depender de terceiros, diz que vai juntar dinheiro ao invés de tentar apoio institucional para ingressar na Escola de Hotelaria e Turismo. O objectivo é aprender o máximo para depois criar o seu próprio negócio de Catering.
“Quando eu for empresária cheia de clientes é que vou tirar o meu curso de gestão”, diz no mesmo tom bem-humorado.
“É uma emoção ver o meu rapaz chegar ao fim de uma etapa. Um pouco ansiosa quanto ao seu futuro”, admite a mãe Ivone Correia.
Conta os planos do filho de cursar Economia. E que a família – avós e tios inclusive – ponderou custear uma licenciatura no exterior mas o própio estudante decidiu por uma universidade nacional.
Paulo Barbosa, o presidente da CF da Abílio Duarte, atesta que muitos dos seus colegas estiveram pelas universidades nacionais a sondar as condições e entenderam que em algumas o nível era bom, tendo decidido ficar por cá.
“Com a sua média, acreditamos que conseguiria uma vaga em Portugal ou Brasil, mas bolsa é mais dificil e decidimos que ficaria cá, onde as despesas com renda e alimentação não serão um problema”.
Para Ivone o futuro “é sempre incerto”. “Não sabemos quando o investimento no ensino superior será compensado, se vai conseguir logo um emprego... Mas ainda é a melhor saída”, considera esta mãe que daqui a dois ano estará a passar por estes momentos uma vez mais, quando o filho mais novo for finalista de liceu.
“Vou ficar com saudades dos meus colegas, estivemos juntos durante todo o liceu”, conclui Mara Patrícia quando lhe perguntamos pelos sentimentos que lhe despertam esse fim de ciclo e o futuro que se avizinha.
“Ainda não posso dizer muito sobre ir para um país diferente e viver sozinha mas, outras pessoas já fizeram esse percurso e acho que não é propriamente fácil mas também não é um bicho de sete cabeças”.
A nostalgia e o nervoso miúdinho de alguns e a resignação de outros fica em suspenso, pelo menos até à festa de finalistas. Até lá, ainda são estudantes de liceu. E aproveitam os últimos dias antes de abraçarem as responsabilidades de jovens adultos que chegam já a seguir.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 913 de 29 de Maio de 2019.