Se na Praia existem 650 táxis há outros tantos que são carros que fazem fretes ilegais. A acusação é feita pelo presidente da Associação de Táxis da Praia, João Vaz Antunes que acrescenta que “há advogados que têm carros a fazer fretes, mas não têm, aparentemente, nada a ver com o carro. O sobrinho é que assume, diz que é dele, e não há nada que prove em contrário mas nós sabemos que não. Há pessoas do tribunal, da Polícia, mas não assumem e eu, infelizmente, não posso provar. Não há vontade de por termo a isto. Toda a gente reconhece que existem e que não devem concorrer com os táxis. Temos gastos em demasia, só Deus sabe o que gastamos para ter um táxi na rua”.
Talvez por isso mesmo é que as praças de táxi que a Câmara Municipal da Praia criou um pouco por toda a cidade continuam vazias meses depois de terem sido criadas.
Os taxistas representados por esta associação não são contra a existência destas infraestruturas, reconhecem-lhes mesmo utilidade mas a existência dos vulgarmente conhecidos “clan” impede os taxistas formais de usarem as praças de táxi.
“Em primeiro lugar, a colocação de lugares de táxis é uma obrigação da Câmara até porque nós pagamos a praça na aquisição da licença. Isso até peca por tardio. Quanto à imposição da Câmara não estamos de acordo porque se temos 650 táxis, estou em condições de afirmar que temos praticamente o mesmo número de carros a fazerem fretes clandestinos”, acusa João Vaz Antunes.
“É do conhecimento geral das autoridades. Quando digo autoridades estou a falar da Direcção Geral dos Transportes Rodoviários, Câmara Municipal e a própria Polícia de Trânsito. Se eu disser que não estão a fazer nada posso estar a minimizar o efeito do trabalho, mas nós não sentimos nenhuma mudança porque o que nós reparamos é no crescimento diário das viaturas a fazerem fretes ilegais”, prossegue.
A lei, defende João Vaz Antunes, protege os infractores uma vez que ao serem autuados pela Polícia Nacional, os condutores dos carros clandestinos “podem continuar a trabalhar”. “Por exemplo, um carro é autuado e é-lhe aplicada uma coima de 25 mil escudos e apreendem-se-lhe os documentos do veículo e dá-se uma guia de substituição. O que é que essa pessoa faz? Dirige-se aos serviços da Polícia, assina um documento para o pagamento das multas em prestações, paga 5 mil ou 10 mil escudos consoante o modelo e renovam a guia um mês. A aplicação da coima é tão insignificante que continua a incentivar ao cometimento da mesma prática, porque se houvesse uma tomada de medidas mais duras não teríamos essa invasão, essa avalanche do nosso espaço profissional”.
Quanto às praças de táxi, o presidente da Associação de Táxis da Praia diz que a associação se prontificou a acompanhar a equipa da CMP para “identificar e seleccionar os lugares que sabemos que fazem falta”.
“A CMP que me desculpe, mas não conhece o terreno como nós conhecemos e não sabe onde faz falta a colocação de uma ou outra praça. Na última reunião que tivemos dissemos isso”, diz.
Mas mais uma vez surge o alerta em relação aos carros clandestinos: “Se a CMP não fizer nada, em conjunto com as outras autoridades, em relação a esta invasão do nosso espaço profissional não estaremos em condições de acatar nenhuma ordem que venha da parte das autoridades. Já é altura de dizer um basta”.
Taxímetros
Ao longo dos anos têm sido várias as vezes que o tema da utilização dos taxímetros tem vindo a público e a Associação defende seu uso nos táxis. “Nós sempre defendemos a utilização do taxímetro”, garante João Vaz Antunes. “É a única forma que temos de evitar que o cliente seja roubado, de evitar a especulação. Nós estamos de acordo com isso e da utilização de aplicativos. Queremos garantir que as nossas viaturas trabalhem com seriedade, com dignidade, com segurança e que as pessoas que usem os táxis estejam seguras e sejam levadas de e para determinados sítios com segurança”, assegura ainda o presidente da Associação de Táxis da Praia.
“Agora, não nos é possível aceitar a colocação ou a reutilização dos taxímetros com o fluxo em demasia que há dos clandestinos”, lamenta apontando também que as pessoas já estão habituadas aos montantes fixos cobrados pelos serviços de táxi na capital. “As pessoas já estão habituadas” diz para, de seguida, defender uma socialização da forma como funcionam os taxímetros e para evitar que as pessoas se sintam enganadas quando estes entrarem em funcionamento. “Com o taxímetro o preço inicial são oitenta escudos. Mas a pessoa ao entrar, se não tiver conhecimento, pode sentir-se enganada. Nós apoiamos, aplaudimos os taxímetros. Mas para que isso aconteça terão de se acabar com os clandestinos. Mas eu volto a dizer: Não há vontade. É preciso informar as pessoas que ao utilizarem um carro clandestino estão a ser cúmplices, estão a cometer um crime. Na Praia os táxis estão devidamente identificados. Ora, se o táxi é desta cor é desta condição e natureza, a pessoa que estiver a fazer uso de uma viatura ilegal está em conluio e a cometer um crime de cumplicidade”.
A segurança é outro dos temas que preocupa quem todos os dias se faz à estrada para ganhar o seu sustento.
Os assaltos, os ataques e, por vezes, a violência são quase diários. “Continua tudo na mesma. É uma ameaça constante”, garante João Vaz Antunes.
Se houve algo que mudou, conta, foi a forma de actuar de quem vê nos taxistas um alvo fácil.
“Antigamente tínhamos bairros identificados, horários identificados. Hoje já não é possível, porque o modus operandi mudou. Aqui mesmo na Terra Branca é possível que durante o dia haja um assalto, no Plateau, que antes era praticamente impossível também. Em relação aos táxis, a ousadia é tanta que há assaltos durante o dia em locais públicos e de muito movimento. Continuamos a sentir isso, já se tornou prática corrente”.
Mais entendimento
Tudo isto leva o presidente da Associação de Táxis a pedir um maior entendimento e um maior diálogo tanto com o governo como com a Câmara Municipal da Praia.
“No nosso dia-a-dia enfrentamos muitas dificuldades que já expusemos às autoridades. É bom ressalvar que tudo o que expusemos para a melhoria no sector dos táxis foi para bem servir. Pedimos a numeração dos táxis para facilitar a sua identificação, na altura do anterior governo propusemos um modelo que foi aprovado”, conta.
Um recenseamento que não foi bem visto por todos os taxistas. “Demos conta, também, que havia indícios de licenças falsas. Pedimos o recenseamento de táxis e muita gente hoje culpa-me a mim por ter pedido este recenseamento pensando que os lesados foram prejudicados por mim, mas quero deixar claro que essa nunca foi a minha intenção. Nós queremos que a classe seja credível e à altura de estar a operar na capital do país”.
“Nós temos mais dificuldades que acessibilidades”, acrescenta João Vaz Antunes que destaca a burocracia enfrentada pelos taxistas de cada vez que precisam de renovar as licenças. “Nós neste momento deparamo-nos com muita burocracia para fazer uma simples renovação de táxi. Exige-se muita coisa”.
Por isso, defende, é necessário mais diálogo e é necessário também que quem antes os consultava continue agora a ouvir a classe. “A nossa primeira dificuldade é a falta de diálogo. Não conseguimos falar com nenhum membro do governo e dói-nos não conseguirmos falar com o actual Primeiro-ministro, pessoa com que tinha uma excelente relação. Quando era oposição ele recebeu-me como representante dos donos de táxis em Cabo Verde, hoje não”.
Também a autarquia da capital é alvo de críticas por não ouvir as sugestões feitas pela associação.
“Nós propusemos à Câmara ouvir-nos naquilo que achamos ser bom para o sector mas, infelizmente, deparamo-nos com um recuo da Câmara Municipal. A Câmara faz e desfaz. Não é correcto termos uma publicação no Boletim Oficial e a Câmara tem uma deliberação que a substitui. Sem nos ouvir”, conclui.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 934 de 23 de Outubro de 2019.