No dia 27 de Abril, deu-se início às aulas do primeiro ciclo em Cabo Verde através da televisão e da rádio com o programa “Aprender em Casa”.
Segundo a Directora Nacional da Educação (DNE), Eleonora Sousa, todos os objectivos traçados pelo ministério da Educação (ME) foram alcançados durante as aulas a distância. Nesse sentido, faz um balanço positivo do projecto “Aprender em Casa”.
“Nós temos recebido um feedback que tem sido positivo. O objectivo que nós traçamos com o ensino a distância, quer a de manter os alunos em contacto com os conteúdos, com os professores e com a escola foi alcançado”, avalia.
Em declarações ao Expresso das Ilhas, Eleonora Sousa revela que o “grande envolvimento” por parte das delegações e dos professores, contribuiu para o sucesso do projecto. Isso porque, conforme refere, para os alunos cujo acesso às teles e rádio-aulas não era possível foi disponibilizado fotocópias de fichas elaboradas pelos professores e fichas dos exercícios deixadas nas tele-aulas.
“Nós ainda não fizemos o relatório com os dados concretos mas, tivemos alguns mecanismos que nos dão indicação da abrangência de todo esse nosso projecto que foi montado de uma forma muito rápida para responder a uma situação emergencial. Nós acreditamos que conseguimos, sim, responder às expectativas e à situação em que a COVID-19 nos colocou”, assegura.
Para realçar, Eleonora Sousa destaca o estudo independente da Afrossondagem, realizado em quatro concelhos, em que 70% dos inqueridos classificaram o programa como sendo “muito satisfatório”.
Além disso, continua, as vídeo-aulas publicadas no Facebook do ME, atingiram 23 mil visualizações diárias. Esse número, no entender da Directora Nacional da Educação, “é um bom indicador”, dado o número de aulas diárias.
Desafios para o próximo ano lectivo
“O próximo ano lectivo coloca-nos um grande desafio”, corrobora Eleonora Sousa, avançando que o ME tem sobre a mesa determinados cenários.
Um desses cenários baseia-se na impossibilidade de ter turmas completas devido às recomendações de distanciamento, de higienização e de utilização das máscaras. Ainda está sobre a mesa a possibilidade de dividir os horários e ter o ensino a distância como complemento.
“No entanto, posso adiantar que vai ser diferente de escola para escola, de concelho para concelho. Porque, por exemplo numa escola em que o número de alunos, isso nas zonas rurais, é menor do que o número recomendado nós vamos manter o funcionamento normal, as turmas vão estar completas. Nas outras, nós vamos ter que pensar em outros cenários”, explica.
O ME pretende dar continuidade ao projecto “Aprender em Casa” e por isso, neste momento, os professores das TIC, coordenadores e directores estão a receber formação em tecnologias educativas, com dez módulos que vão contribuir para montar escolas virtuais.
“Começamos no dia 29 de Maio, vamos de forma gradual tentar atingir até Dezembro mais que a metade dos professores. Neste momento temos uma frequência de cerca de 2 mil, entre coordenadores, directores e professores das TIC que vão ter a responsabilidade, a nível das escolas, de implementar as escolas virtuais”, declarou.
Para esta entrevistada, a COVID-19 veio acelerar um projecto que o ME já tinha identificado como sendo “muito importante” para o processo de ensino-aprendizagem. Apesar de julgar que “nada substitui” a sala de aula, reconhece que é preciso fortalecer o processo de ensino e aprendizagem com as novas tecnologias.
LDR considera ensino à distância um modelo para o futuro
Para o director do Liceu Domingos Ramos (LDR), José Augusto Fernandes, inicialmente, o ensino a distância “não foi fácil”, tendo de readaptar o sistema de ensino ao mundo digital. Ainda assim, considera positiva a experiência.
“Chegamos a uma boa parte dos nossos alunos do primeiro ao 12º ano. Para além das aulas audiovisuais, criando turmas virtuais através de Viber, Messenger e outros aplicativos nós conseguimos chegar aos nossos alunos”, denota.
A partir de agora, para este director, os desafios “são muitos”, começando pela “maior capacitação” dos professores para conseguir dominar “melhor” o mundo digital.
“Insisto na formação e penso que se deve continuar com as aulas a distância como modelo complementar mesmo que no próximo ano lectivo consigamos ter aulas presenciais. É uma boa ferramenta que poderá ajudar bastante o processo de ensino-aprendizagem”, reputa, reafirmando que a DNE já está a formar professores nas aulas virtuais.
José Augusto Fernandes acredita que o ensino a distância poderá trazer “muito mais qualidade e mais inclusão” dos alunos no processo de ensino e aprendizagem.
Ensino através da plataforma Teams
A directora da Escola Portuguesa de Cabo Verde (EPCV), Suzana Maximiano, explicou ao Expresso das Ilhas que após o fecho das escolas, a expectativa era que os casos não aumentassem no país e que as aulas presenciais seriam retomadas.
Todavia, ao se verificar que tal não era possível, numa semana a EPCV desencadeou todos os procedimentos para começar as aulas a distância.
“Utilizamos uma plataforma da microsoft, Teames, que já tínhamos adquirido para nós professores e demos acesso aos alunos à plataforma. Isto tudo numa semana. Conseguimos que os professores, os alunos e os pais entendessem o funcionamento da plataforma e os professores começaram a se preparar e a gerir as suas matérias e os seus trabalhos”, descreve.
Suzana Maximiano explicita que a escola teve de fazer um plano de ensino a distância que segue as regras do governo português. Assim, os alunos tiveram aulas sincrónicas e assincrónicas.
Nas aulas sincrónicas, os professores tinham contacto directo com os alunos. Enquanto nas aulas assincrónicas, os professores marcavam trabalhos na plataforma para os estudantes, dando-lhes um determinado tempo para resolverem as tarefas. Depois, elucida a directora, os docentes corrigiam as tarefas e faziam o retorno para os alunos.
Apesar de considerar que tudo correu “muito bem”, a EPCV fez inquéritos aos encarregados de educação, alunos e professores de modo a ter uma avaliação “fidedigna” deste sistema de ensino na perspectiva de não saber o que irá acontecer no próximo ano lectivo.
Ainda assim, Suzana Maximiano entende que a pandemia trouxe coisas boas. Por exemplo, aponta, “o ensino nunca mais vai ser o mesmo”.
“Os professores habituaram-se a trabalhar com uma ferramenta completamente nova, ferramentas informáticas que ainda não estavam exploradas na sua totalidade, os alunos aprenderam que a informática não é só para jogos de computador, que os computadores têm outra valência muito importante, que através do computador podem aprender conteúdos, podem aprender as suas matérias escolares, podem estar em contacto com a escola, com os professores, com os colegas”, denota.
Esse sistema de ensino, conforme menciona, desenvolveu a autonomia e a capacidade de gestão do tempo nos alunos. Capacidades que, conforme diz, se pretende que os alunos tenham, mas que não são capacidades que se consigam obter rapidamente.
Por esse motivo, justifica que mesmo com o ensino presencial a EPCV não vai deixar de utilizar tais ferramentas. Isto porque através das sessões assincrónicas de resolução de trabalhos em plataforma é possível controlar o tempo que o aluno demorou a fazer a tarefa e o dia em que a realizou.
Por outro lado, o professor pode explicar quer na aula, quer através da plataforma, as dificuldades que o aluno tem, e resolver tais problemas.
“Penso que podemos trabalhar muito estas matérias, este novo ensinamento que obtivemos para trabalhos de casa, quando os alunos estão doentes, trabalhar com alunos com mais dificuldades pode passar pelo ensino virtual. A conjugação dos dois métodos vai passar a ser uma realidade mesmo depois desta pandemia”, garante.
Ainda assim, Suzana Maximiano profere que o ensino a distância, por si só, não é o ideal. Desta forma, defende que “faz falta o convívio, faz falta os alunos estarem na escola, faz falta a interacção com os colegas, com os professores, que são vivências que os alunos têm, que são muito importantes para desenvolverem as capacidades sociais”.
Falta de dispositivos, um dos principais desafios
De acordo com Oclízia Tavares, directora do Centro Educativo Miraflores, no início, a adaptação da rotina dos estudos dos professores e alunos foi desafiador uma vez que pela primeira vez e em pouco tempo teve de se arranjar estratégias para chegar a todos os alunos com uma nova metodologia de ensino.
“Outro desafio foi o contacto com as novas tecnologias, alguns professores tiveram de sair da sua zona de conforto. Um outro senão foi a falta de dispositivos, como a internet e o computador, tanto por parte dos alunos como de alguns professores, apesar de a escola disponibilizar alguns materiais e os pais auxiliarem”, especifica.
As aulas do Miraflores foram ministradas através do Zoom, Moodle, que é a ferramenta de plataforma da escola, Classrom, Messenger, Viber, como também em formato de papel para os alunos que não têm possibilidades de aceder via internet.
Mesmo estando em casa, Oclízia Tavares narra que o trabalho “redobrou” para os professores que, ainda assim, fazem o balanço “positivo e gratificante” de todo o percurso.
Para os alunos, a Direcção do Centro Educativo Miraflores assevera que sentiu o esforço que fizeram para acompanhar as aulas a distância, principalmente os do Ensino Básico Obrigatório e do 12º ano.
“Os professores tiveram que fazer alguma logística para apresentar as aulas virtuais e poder chegar a todos os alunos. A Direcção da escola apresentou algumas orientações como, horário adaptado, as ferramentas de utilização durante as aulas à distância, mas deixando em aberto a concertação entre os professores e as famílias”, reconhece.
Para o próximo ano lectivo, o Centro Educativo Miraflores está a pensar na formação contínua do docente, a nível das ferramentas do ensino à distância como Moodle, que está integrado na sua plataforma Esemtia.
“Apesar dos desafios, sentimos que os nossos professores estão muito mas capacitados hoje do que estavam no início desse percurso”, reitera.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 970 de 1 de Julho de 2020.