Hoje em dia, qualquer pessoa com uma conta no Facebook conhece algum grupo de compra e venda de produtos. As ofertas de produtos variam de género alimentícios, vestuários, calçados e até mesmo ofertas imobiliárias. Com tanta facilidade na aquisição de bens e serviços, os consumidores têm que lidar também com a falta de segurança nas compras online.
Golpes nas vendas online
A artesã Edmara Cunha começou a vender as suas peças na internet em 2018. Com uma página operacional em uma das redes sociais mais populares do momento, Facebook, esta empreendedora conta que expõe as fotos dos seus produtos e quem tiver interesse em adquirir pode entrar em contacto e seguir os procedimentos para realizar as suas compras.
“A maioria dos trabalhos são feitos por encomendas e só dou início aos trabalhos mediante o pagamento de 50% do valor da encomenda, e depois de receber o comprovante de depósito. Para os trabalhos que são solicitados pessoalmente, uso o mesmo critério para não correr o risco de ter o trabalho pronto e o cliente desistir da compra”.
Esta artesã conta que em várias ocasiões ficou prejudicada. Aceitou fazer encomendas sem receber a taxa de 50% do valor e no final a pessoa que encomendou desistiu da compra ou simplesmente queria o produto para realizar o pagamento em parcelas ou posteriormente à aquisição do produto.
“Vender os produtos na internet requer certos cuidados. Até mesmo uma pessoa experiente acaba caindo, digamos assim, num golpe. No início de 2020, em plena pandemia da COVID-19 em Cabo Verde, recebi de uma grande loja uma encomenda de 10 exemplares de um produto. A encomenda foi intermediada por um familiar porque era para uma outra ilha de Cabo Verde, e eu vivo na ilha de Santiago. Logo no início começaram as desculpas com a pandemia, os lugares estavam fechados, e como era uma loja grande, confiei e fiz a encomenda. A pessoa por ser conhecida deste meu familiar convenceu-o a se responsabilizar pelos produtos e assim que cegasse a encomenda, a pessoa entregava a quantia a este familiar, que depositaria o dinheiro combinado na conta”, testemunhou.
Esta empreendedora conta que o produto foi enviado e na entrega uma outra pessoa foi receber a encomenda, alegando que a pessoa que fez a encomenda estava isolada aguardando o resultado do teste da Covid-19, e que assim que o resultado saísse ela iria realizar o pagamento.
“Depois que a encomenda foi entregue a pessoa mandou uma mensagem agradecendo. Foi muito simpática e explicou a situação. Pela atenção não me preocupei muito, até por ser uma pessoa indicada pelo meu familiar. Passados alguns dias, tentei contacto via Facebook, mas não respondia. Tentei telefonar, o telemóvel estava sempre desligado, falei com o meu familiar e pedi que fosse ver na loja se conseguia falar com a pessoa. A loja estava fechada por conta da pandemia, e a responsável da loja não sabia de quem se tratava. Até à data de hoje não sabemos nada sobre a pessoa. O meu familiar acabou por admitir que conheceu a pessoa pelo Facebook e que conversavam há algum tempo, mas que nem sequer tinham alguma convivência”, relatou.
Edmara Cunha diz que foi buscar ajuda nas autoridades competentes que se prontificaram a tentar resolver o problema. Na outra ilha onde a encomenda foi entregue, o seu familiar que intermediou a venda dos produtos, realizou em paralelo uma investigação. Com muita sorte conseguiu recuperar os produtos. Mesmo assim, como conta a artesã ao Expresso das Ilhas, ficou prejudicada. Por trabalhar com encomendas personalizadas, ter novamente os produtos em sua posse não cobria o prejuízo causado.
Compras online
Carlos Semedo, morador da ilha de Santo Antão conta que viu um anúncio de venda de telemóveis no Facebook. O produto aparentemente estava em bom estado e o preço muito acessível, o que despertou o interesse deste consumidor em querer adquirir o aparelho.
“Pesquisando na rede social encontrei um anúncio de venda de telemóveis em uma das páginas de venda online. Como não era a primeira vez que eu comprava produtos online, então não tive receio. Fiz uma breve pesquisa e pude ver que o anunciante frequentemente fazia as ofertas em várias páginas, e o anúncio dizia que o interessado podia obter mais informações pelo Chat. Contactei o vendedor que operava na Cidade da Praia, fechamos o negócio e combinamos o pagamento”.
Carlos Semedo conta que o anunciante pediu para ser depositado 75% do valor, mas por se tratar de ilhas diferentes tinha o custo do envio pelo correio e se o dinheiro fosse depositado no dia da negociação, o produto chegaria no dia seguinte.
O consumidor conta que seguiu as instruções e conforme o combinado, em pouco tempo tinha o aparelho em mãos. O que ele não sabia é que o produto era proveniente de furto; numa semana a Polícia Judiciaria já tinha localizado o telemóvel e ele foi obrigado a devolver o produto.
“Fui abordado por agentes, fizerem perguntas e tive que ir prestar esclarecimentos sobre o telemóvel. Obviamente, a conta do vendedor foi eliminada e só me restou registar uma queixa de burla. Na sequência, fui informado que o tal vendedor tem várias queixas registadas e que anuncia com nomes diferentes”, contou ao Expresso das Ilhas.
Verónica Lopes é proprietária de um salão de festas e de um pequeno espaço para venda de roupas. Essa pequena empresária testemunhou ao Expresso das Ilhas o enorme prejuízo que teve em Fevereiro deste ano. Acostumada a fazer grandes encomendas de produtos de decoração, a mesma conta que tinha um evento na data acima referida e que por conta da grande inflação que se instalou em Cabo Verde, optou por fazer compras online desses artigos, procedimento que já tinha feito em outras ocasiões.
“Eu sempre comprei online em sites brasileiros, portugueses e até mesmo da China. Sempre recebia as encomendas, poucas vezes tive que trocar alguma coisa, sempre chegavam de acordo com a encomenda. O site em questão é brasileiro e informava que se a compra for superior a uma certa quantia, o frete seria grátis. Como são artigos de necessidade constante por conta do meu trabalho, eu não desconfiei. Fiz a compra, paguei e fiquei à espera do produto que poderia ser acompanhado online, até chegar a Cabo Verde e o prazo é de 20 dias úteis para a chegada da encomenda”.
A empresária confessa que por conta das ofertas, investiu para criar um pequeno stock dos produtos. Quando faltavam cinco dias, recebeu um e-mail informando que o envio foi cancelado e que seria remarcada uma nova data de entrega.
“Conversei pelo Facebook com a pessoa que disse ser gerente de venda. A pessoa anunciou que os produtos poderiam ser adquiridos ao preço da fábrica. Conversei com o anunciante; embora muito prestativa, não quis remarcar a data porque na data indicada pelo site os produtos já não chegariam a tempo do evento. Após manifestar o meu desinteresse, não responderam mais as minhas mensagens. Não conseguia mais contacto. Fiquei sem os produtos e sem o dinheiro. Hoje seis meses depois, estou aguardando o desfecho desta tragédia”.
Cuidados a ter nas compras online
A Associação para a Defesa do Consumidor (ADECO), indica que cada vez mais consumidores optam por fazer compras em lojas virtuais ao invés das físicas, por ser mais cómodo, rápido e oferecer preços mais atractivos. Só que usufruir dessas facilidades envolve riscos e requer cuidados e pesquisas. Há que ter ainda mais cautela em Cabo Verde, onde não existe uma lei que regula e protege os direitos dos consumidores nas compras online.
A ADECO sugere alguns cuidados a ter antes de se efectuar uma compra online, nomeadamente assegurar que o dispositivo onde vai efectuar a compra está protegida contra malwares. É essencial, não apenas para as compras, mas para toda a actividade online, ter um programa antivírus actualizado.
“Certificar-se de que o site é seguro, a maneira mais simples de garantir isso é verificar na barra de endereço do navegador web se aparece a indicação https://. Se o site for realmente seguro estará acompanhado de um cadeado. Pesquise muito bem a reputação e a classificação da loja online no Google ou nas redes sociais. Confira se o site disponibiliza informações como canais de contacto, endereço físico, telefone e e-mail. Se nenhum dado estiver disponível, desconfie.”.
A ADECO aconselha ainda que o consumidor verifique se há muitas reclamações contra a loja nas instituições de defesa do consumidor, como a ADECO, ou agências de regulação, ou mensagens no próprio site da loja. Esta associação previne os consumidores a desconfiarem de ofertas e preços de produtos muito baixos, comparativamente a outras lojas online.
“Se receber um e-mail com promoções inacreditáveis de uma loja desconhecida, não clique! Eles podem fazer parte de um esquema de fraude. Evite aceder a sites a partir de links, optando por inserir directamente o endereço e verificando se este é mesmo o endereço oficial. Não faça compras em computadores de uso público, como bibliotecas, universidades, etc. Leia as especificações do produto. Caso o item esteja mais barato devido a um defeito, a descrição deve informar sobre essa particularidade previamente e de forma clara. Você tem o direito de exigir que os produtos lhe sejam vendidos exactamente pelos preços e condições anunciados na mídia, cartazes ou outros meios”.
Pagamento das compras online
A Associação para a Defesa do Consumidor sublinha que é imprescindível que o consumidor não forneça os seus dados pessoais ou confidenciais que não sejam absolutamente necessários para realizar o pagamento.
“Guarde os comprovativos de pagamento, o vendedor deve enviar imediatamente a factura em formato digital. Como salvaguarda, caso não receba a factura no formato digital, pode garantir um print screen dos dados da operação. Mantenha-se atento ao seu extracto bancário e, ao verificar qualquer problema, comunique imediatamente o banco e contacte as autoridades competentes. De reforçar ainda que na entrega é fundamental anotar o prazo prometido no site e o emitido na factura da compra. Esses documentos ajudam a comprovar eventuais falhas da empresa”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1082 de 24 de Agosto de 2022.