Cuidados paliativos: Os desafios deste serviço no país

PorSheilla Ribeiro,8 out 2022 14:21

Cabo Verde ainda não dispõe de uma rede nacional para cuidados paliativos. O Hospital Universitário Agostinho Neto (HUAN) é a única estrutura de saúde do país que possui uma equipa de cuidados paliativos que presta assistência aos doentes e realiza interconsulta aos pacientes internados nas diferentes enfermarias, mediante solicitação.

No segundo sábado de Outubro de cada ano comemora-se o Dia Mundial de Cuidados Paliativos que, neste ano, será comemorado no dia 08. É no âmbito desta efeméride, que o Expresso das Ilhas esteve numa conversa com a coordenadora do Plano Nacional de Cuidados Paliativos, Valéria Semedo.

Conforme detalha, neste momento, no HUAN existe uma equipa de suporte de cuidados paliativos que faz consultas de cuidados paliativos duas vezes por semana, às quartas e sextas-feiras, e que presta apoio à urgência quando existem doentes com essa necessidade, além de interconsultas nas enfermarias.

“O Hospital Agostinho Neto é a única estrutura de saúde do país que dispõem de equipa de cuidados paliativos. Neste momento não existe um serviço de cuidados paliativos com leitos específicos para esse serviço. Quando necessário, os doentes são internados nas enfermarias das especialidades, conforme a doença de base”, explica.

A especialista frisa que o Hospital actua sempre que os médicos ou um profissional de saúde identifica um doente em fase paliativa. Neste caso, o mesmo orienta para a consulta onde o paciente é observado.

Rede nacional para cuidados paliativos

De acordo com Valéria Semedo, apenas o Hospital Universitário Agostinho Neto tem recebido, em média, 180 a 200 pacientes paliativos por ano, nas consultas. Isto, sem contar com aqueles que ali estão internados.

A maior parte dos utentes paliativos, avança, são os oncológicos que representam 90%. A outra parte, Valéria Semedo afirma que é constituída doentes neurológicos e pelos doentes crónicos.

Segundo a coordenadora do Plano Nacional de Cuidados Paliativos, o Ministério da Saúde tem vindo a realizar várias formações gerais aos profissionais de saúde.

“No âmbito deste Plano Nacional de Cuidados Paliativos, este ano, começamos a fazer uma formação dos cuidadores de pacientes. Formamos cerca de 80 cuidadores, mas é preciso também investir na formação dos profissionais de saúde para a criação de uma equipa, uma rede de cuidados paliativos”, observa.

Desafios

Para esta responsável, o primeiro desafio que se coloca aos cuidados paliativos tem a ver com a assunção deste serviço como sendo uma área prioritária.

Ao ser assumido como uma área prioritária, Valéria Semedo acredita que haverá maior investimento em termos de recursos humanos.

“É preciso investir nas formações, é preciso também que a nível central e a nível das estruturas e da própria comunidade haja um engajamento para criar uma equipa para que todos os hospitais tenham uma equipa multidisciplinar”, considera.

No que se refere às formações, a especialista ressalta que são de extrema importância por se tratar de uma área nova e específica, que requer conhecimento específico.

A falta de recursos suficientes, e profissionais formados na área, é o que de facto tem vindo a comprometer a existência de uma rede nacional de cuidados paliativos.

“Creio que sendo uma área prioritária, poder-se-á também alocar recursos aos paliativos de forma que possamos dar resposta. Porque a necessidade é cada vez maior. Cada vez temos mais doentes oncológicos no país”, refere.

Na opinião da médica especialista, não necessariamente faz falta um centro de acolhimento dos doentes paliativos. Mas, ressalva, é preciso uma equipa que acompanha os doentes na comunidade.

“O objectivo dos cuidados paliativos é prevenir o sofrimento e tratar o sofrimento, mas abordar a pessoa de uma forma holística, social e espiritual, contudo, inserido na sua comunidade, de forma a que não perca as suas raízes. Para isso, é preciso ter uma equipa na comunidade”, justifica.

Entretanto, realça que um Centro de Cuidados Paliativos torna-se importante em algumas situações, sobretudo naquelas em que não há condições de o doente permanecer em casa.

“O desejável é que se investa em cuidados paliativos na comunidade e também ter as equipas nos hospitais e, eventualmente, ter algum espaço para internamento nas situações mais complexas, ou naquelas em que o doente não possa permanecer na comunidade”, defende.

Valéria Semedo aponta que os cuidados paliativos é uma responsabilidade de todos e não apenas do Ministério da Saúde, lembrando que a parte social é muito importante para esses doentes.

O objectivo, acrescenta, é que haja cuidados paliativos a todos, sejam crianças, adultos ou idosos, de Santo Antão à Brava. E para tal, frisa, o Ministério da Saúde conta com todos.

“Desde as entidades sociais, que já fazem algum trabalho e que existem nas comunidades, aos profissionais de saúde, devem desenvolver um trabalho articulado”, pontua.

Ainda poucos reconhecem o trabalho do cuidador - enfermeira

Em 2019, Anilsa Oliveira, focou em trabalhar nos cuidados dos idosos e cuidados paliativos. Hoje a enfermeira possui uma clínica que oferece esses serviços e afirma que cuidados paliativos é bastante sensível.

“É ainda mais sensível do que trabalhar com idosos. Não se trata de um cuidado que se pode dar hoje, fazer o que tem de ser feito e ir-se embora”, diz.

Segundo a enfermeira, é uma grande responsabilidade prestar cuidados paliativos, uma vez que é preciso lidar com doentes que necessitam de cuidados primários. Além do mais, prossegue, torna-se necessário fazer um levantamento do histórico familiar de forma a certificar quais as condições apresentadas pelos pacientes são hereditárias ou decorridos.

Anilsa Oliveira alega que as famílias não reconhecem o impacto forte de um doente paliativo e que por esta razão, muitas vezes, surgem muitos problemas.

“É preciso muita paciência, muita dedicação, é preciso estudar cada detalhe para podermos ver de onde surgem os problemas e dar o cuidado e acompanhar até que encontremos resultados”, declara.

A enfermeira reconhece que um número reduzido de pessoas está ciente do trabalho dos cuidadores e que é preciso maior literacia nesta questão.

“Já há pessoas que querem esse serviço, mas não sabem como chegar aos profissionais e quando chegamos a elas para falar percebemos que é algo novo. Um dia vou ter a oportunidade de me sentar num espaço e explicar às pessoas que os doentes em fase final, um idoso na fase final também tem direito a cuidados, a usar tudo que usava enquanto estava de pé. Precisamos educar a sociedade nesta questão”, almeja.

Guia do Cuidado do Doente em Cuidados Paliativos

Em Outubro de 2021, a Direcção Nacional da Saúde, através do Programa de Prevenção e Controlo das Doenças Oncológicas e em parceria com a Organização Mundial da Saúde realizou uma sessão de apresentação do Guia do Cuidador do Doente em Cuidados Paliativos.

Embora Cabo Verde não tenha dados estatísticos quanto à incidência e prevalência dos doentes paliativos, na altura, o Director Nacional da Saúde, Jorge Noel Barreto, explicou que as doenças do aparelho circulatório constituem as principais causas de morte no país e que são situações que demandam estes cuidados.

“São situações que devem ter acesso aos cuidados paliativos, sabe-se que os cuidados paliativos estão mais associados às doenças do foro oncológico, mas há uma série de outras situações em que estes cuidados se fazem necessário e também não podemos esquecer de pessoas que tem infecções, como por exemplo os doentes pelo VIH, entre outras.

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Autoria:Sheilla Ribeiro,8 out 2022 14:21

Editado porAndre Amaral  em  10 out 2022 11:54

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