Sandra de Barros é uma “diva guerreira”, que aos 33 anos foi diagnosticada com cancro de mama. A jovem conta que tudo começou entre os meses de Junho e Julho de 2021. Na altura, Sandra amamentava e estava a preparar para interromper o aleitamento materno. Entre os meses mencionados anteriormente, a jovem notou um módulo com formato de um quadrado no seio esquerdo, mas como na época estava a amamentar, pensou que fosse algo ligado à amamentação.
Na altura em que notou o nódulo no seio, estava a acompanhar a sua mãe em algumas consultas, então decidiu fazer uma consulta para assegurar se tudo estava bem. A primeira consulta aconteceu no dia 30 de Outubro, num dos centros de saúde da capital. Na sequência, realizou uma outra consulta na Associação Caboverdiana para a Protecção da Família – VerdeFam, onde a médica que a atendeu, pediu para entregar as respostas no Hospital Agostinho Neto.
“A médica disse-me para ir no “Hospital Dia” (parte do Hospital Agostinho Neto, onde se realizam consultas de Oncologia). Comecei a perguntar às pessoas que tipo de consultas são realizadas no “Hospital Dia”, foi quando descobri que era onde que as pessoas que tinham câncer eram atendidas. Foi então que comecei a sentir pânico. Quando cheguei a casa, abri os exames e confesso que não entendi os termos técnicos, mas estava escrito que eu tinha um nódulo grande, superiores a 3 centímetro de diâmetro no seio esquerdo e um módulo no fígado, porque entre os exames que eu fiz estava também uma metástase no fígado e na axila. Depois disso quando eu fui entregar as ecografias, a médica que me atendeu pediu-me para fazer ainda uma biópsia e algumas análises. Como eu sou curiosa, assim que recebia os resultados das análises, eu abria e lia a todos. Então houve um dia em que numa das análises, no final da folha, encontrei escrito, positivo para câncer”.
“Tenho cancro, o que faço?”
No decurso das consultas, o nódulo que Sandra tinha no seio aumentou significativamente de tamanho, praticamente o seio esquerdo inteiro. Então começou a sentir muitas dores nas costas, pois o cancro já estava em estado avançado.
“Quando recebi o diagnóstico, o meu primeiro pensamento foi na minha filha. Quando alguém recebe o diagnóstico de câncer a primeira coisa que lhe vem à mente, é sentença de morte. O dia em que ficou comprovado que eu tinha câncer foi 18 de Novembro de 2021, o dia de aniversário da minha filha. Neste dia ela completou dois anos e eu estava mesmo desesperada”, recorda.
Mesmo assim Sandra canta os parabéns com os familiares para celebrar a data. “Tive dias intermináveis a pensar, até começar a quimioterapia que foi no dia 3 de Dezembro de 2021. As opiniões eram muitas, cada um dizia uma coisa, que era para não fazer a quimioterapia, que ia ficar debilitada, careca e que eu iria perder muito peso. A quimioterapia tem os dois lados, o positivo e o negativo, mas no meu caso a quimioterapia ajudou-me”.
Quimioterapia
Sandra, hoje com 34 anos, conta que o processo de quimioterapia foi a etapa mais complicada na luta contra o cancro de mama. A jovem esteve dez meses no processo de quimioterapia e sempre lutando para manter a imunidade no nível certo. Confessa que teve momentos em que sentiu medo, mas nunca viu a fraqueza como uma opção.
“Aguentei tudo. Com a quimioterapia, aprendemos a lidar com o enjoou, falta de apetite, enfim tudo. Mas aguentei porque sentia a minha família a desmoronar. A minha mãe chorava escondida, pensava na minha filha com apenas dois anos de idade. Tenho onze irmãos e todos me apoiaram até hoje. Além da minha família, posso dizer que o mundo acolheu-me, tive apoio de pessoas que se encontram na mesma luta que eu”, realça.
Se for para perder a Vida, prefiro perder a minha mama – Sandra de Barros
No dia 12 de Setembro de 2022, depois de uma junta médica, Sandra conta que a médica que a acompanha chegou até ela e disse, após uma análise, que o melhor no caso dela, seria a cirurgia de mastectomia - cirurgia de retirada completa do seio afectado. Esta guerreira sublinha que não se desesperou e nem se sentiu menos mulher por isso, pelo contrário, a retirada da mama deu-lhe ainda mais força.
“A única coisa que eu disse foi ‘se é para perder a vida, prefiro perder um seio’, porque com vida posso lutar até quando Deus me permitir. Então eu aceitei, estava preparada psicologicamente, posso dizer até fisicamente para a operação. Quando acordei da operação, não posso dizer que me senti normal, mas não foi nada inesperado, já tinha trabalhado essa realidade na minha mente”, testemunhou.
Sandra de Barros é hoje uma activista, faz parte da Associação de Luta contra o Cancro, “DIVA’S CV”, uma ONG de apoio e partilha de experiências na luta contra o cancro, bem como ao Grupo de Apoio as vítimas de cancro de mama “Guerreiras Vencedoras de Cabo Verde”. A jovem ainda compartilha a sua história, com vídeos de dança nas redes sociais para encorajar outras mulheres a encarar qualquer problema com humor e autoestima.
TikTok
Recém-operada, Sandra resumiu ao Expresso das Ilhas como surgiu a ideia de inspirar outras mulheres na luta contra o cancro. A jovem conta que foi inspirada por muitas histórias. Uma delas é uma colega de luta contra o cancro que era muito tímida, mas ela conta sempre como o câncer mudou a vida dela. Admirada com a força de vontade da colega, Sandra de Barros diz ficar questionando, como que uma pessoa doente fazia vídeos de dança?
Os meus vídeos são para celebrar a vida. Muitas pessoas dizem-me que eu encarei a minha doença como uma brincadeira, o que não sabem é que por detrás das minhas danças consigo superar a ansiedade, traumas, tristeza e pensamentos negativos”, relata.
Essa jovem que segue na luta contra o cancro de mama diz que os vídeos são para inspirar as pessoas a ter autoestima sempre. Hoje recebe mensagens de mulheres querendo um aconselhamento ou uma dica. Sandra postou o primeiro vídeo sem pretensão de ganhar fama, mas hoje é fonte de inspiração para milhares de pessoas.
Grupos de apoio
A vice-presidente da Associação DIVA´S, uma ONG de luta contra o cancro, Ariana Monteiro, que escreveu o livro “Prometo Nunca Desistir”, uma obra que relata a história da vida da autora e o seu renascer após ter vencido o cancro da mama diagnosticado em Setembro de 2014, sublinha que a luta contra o câncer é uma caminhada árdua que o apoio da família e da sociedade no combate ao cancro é muito importante.
“Receber o desafiador diagnóstico de câncer não é fácil. É um baque, tanto para a pessoa que enfrenta o desafio quanto para os familiares, que precisam apoiar o ente querido. O suporte da família é a base essencial para o tratamento. Faz parte dessa caminhada não só cuidar da saúde, mas também das relações. Logo, uma paciente com boa sustentação e amparo familiar tende a se sentir mais motivada para seguir com o tratamento”, sublinhou.
Ariana Monteiro sublinha que os grupos têm como missão ajudar os familiares/ cuidadores de doentes oncológicos a descobrirem novas formas de estar e de actuar durante o processo de doença e tratamento através do relacionamento interpessoal.
A Associação de Luta contra o Cancro –DIVA’S tem entre os objectivos prestar apoio e orientação às pessoas que foram acometidas pelo cancro e trabalhar a importância da prevenção no combate ao cancro e a humanização no tratamento. A Associação com aproximadamente cinco anos de existência, recentemente uniu-se ao grupo de apoio Guerreiras, que também tem uma trajectória de aproximadamente cinco anos, apoiando e compartilhando experiencias de luta e superação contra o câncer.
Para assinalar o Outubro Rosa, a Associação Caboverdiana de Luta Contra o Cancro (ACLCC), que também presta apoio às vítimas e aos familiares acometidos pelo câncer, promove uma marcha pela prevenção, na Cidade da Praia, no dia 30 de Outubro, com concentração no Estádio da Várzea às 08 horas, sob o lema deste ano “Deteção Precoce do Cancro da Mama, SIM!”.
O cancro da mama é o tumor mais incidente entre as mulheres, sendo o pico de incidência dos 50 aos 55 anos, segundo a OMS. Quanto à origem, a maioria são por causas multifatoriais relacionadas ao estilo de vida não saudável como o sedentarismo, o stress, alcoolismo, tabagismo, obesidade, etc. Apenas uma minoria dos casos, menos de 20%, está relacionada à hereditariedade (histórico familiar). Em 2020 foram registadas 2,3 milhões de novos casos de cancro da mama no mundo e 685.000 mortes por esta doença. Em 2020 Cabo Verde, segundo a Globocan (Observatório da Agência Internacional de Investigação em Cancro – IARC) registou 52 novos casos de cancro de mama e 24 casos de mortalidade.
Texto publicado originalmente na edição nº1091 do Expresso das Ilhas de 26 de Outubro