Rede Regional Santiago-Sul promove seminário de prevenção nas escolas para combater abuso e exploração sexual

PorSheilla Ribeiro,25 jun 2023 10:09

Junho é o mês da consciencialização e prevenção contra o abuso e exploração sexual de crianças. Durante todo o mês, são realizadas campanhas e iniciativas que visam alertar a sociedade sobre a importância de combater essas violências, proteger as vítimas e promover a educação, informação e denúncia. Neste âmbito, a Rede Regional Santiago-Sul de Protecção à Criança contra o Abuso e Exploração Sexual realizou, no dia 16, o primeiro Seminário de prevenção nas escolas.

A Rede Regional Santiago-Sul de Protecção à Criança contra o Abuso e Exploração Sexual, uma organização não governamental, vem trabalhando desde 2017 com o objectivo de educar, formar e consciencializar crianças, adolescentes, jovens, famílias, comunidades e toda a sociedade sobre a importância da protecção infantil contra o abuso e a exploração sexual. A rede concentra os seus esforços na prevenção, visando reduzir o número de casos e combater a alta incidência desses crimes em Cabo Verde.

Diante das limitações financeiras enfrentadas pelas famílias locais, que muitas vezes são confrontadas com recursos escassos, a rede tem dedicado os seus esforços à autodefesa, ensinando as crianças a se protegerem.

“Infelizmente, nós temos uma situação de irresponsabilidade parental em que as crianças, muitas vezes, são agredidas sexualmente pelos próprios familiares, ou pelos pais, pelos avós, pelos tios, pelo que nós trabalhamos muito na questão da autoproteção ensinando a criança a se autoproteger. Nós trabalhamos com acções de capacitação voltadas para as escolas, para os familiares e também para as comunidades”, diz a coordenadora da Rede, Ana Lissa Teixeira.

Conforme avança, essas acções de capacitação envolvem rodas de conversa, palestras e distribuição de panfletos com informações sobre abuso sexual e formas de protecção.

A rede, composta por indivíduos da sociedade civil, opera com recursos limitados, dependendo principalmente de parcerias e projectos. Além das actividades de sensibilização e consciencialização, colabora com as câmaras municipais e a coordenação nacional das redes em projectos de empoderamento familiar, como o projecto “Mãe”.

“Por meio desse projecto, as famílias participantes recebem apoio financeiro para se tornarem auto-sustentáveis, garantindo a protecção das crianças. Mulheres chefes de família, na sua maioria, recebem kits para iniciar os seus próprios negócios, seja vendendo peixe, verduras ou outros produtos em pequenos comércios”, explica.

Ana Lissa Teixeira esclarece ainda que essa iniciativa busca fortalecer a capacidade financeira dessas mulheres e minimizar os factores de risco que podem colocar as crianças em situação de vulnerabilidade.

Denúncias

Para a coordenadora da Rede Regional Santiago-Sul de Protecção à Criança contra o Abuso e Exploração Sexual, a ONG desempenha um papel crucial na prevenção desses crimes em Cabo Verde, embora não possua um canal directo de denúncias.

“Em Cabo Verde existem instâncias que trabalham com a questão da denúncia. Existem casos sim, que nós temos conhecimento, de pessoas que querem denunciar. Nós sensibilizamos, encorajamos, a pessoa fazer a denúncia, nessas instâncias”, salienta.

Segundo ressalva, o objectivo principal da rede é criar uma ampla rede de prevenção, consciencialização e encaminhamento para garantir a protecção das crianças.

No entanto, prossegue, a instituição oferece programas de formação para profissionais que trabalham directamente com crianças, como a Polícia Nacional, o Instituto Cabo-verdiano da Criança e do Adolescente (ICCA) e outras instituições.

“Existem programas de formação oferecidos pela Rede Nacional aos profissionais que trabalham com crianças. A nível da rede regional as formações abrangem principalmente a sociedade civil, associações comunitárias, associações desportivas, cuidadores de crianças e mesmo igrejas”, complementa.

Ana Lissa Teixeira considera a presença da Rede Regional Santiago-Sul significativa nas comunidades, onde entram em contacto com diversos casos e situações.

Durante as suas intervenções, tem observado sinais de crianças e adolescentes que precisam de ajuda ou de intervenção especializada.

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“As acções de sensibilização e divulgação de informações têm despertado emoções, levando indivíduos a buscar apoio e denunciar casos de agressão sexual. A rede depara-se sempre com famílias e pessoas anónimas que podem estar sofrendo de abuso sexual e fazem o possível para as auxiliar, fornecendo encaminhamentos adequados e acompanhando o processo, sempre que possível”, precisa.

Abuso e exploração sexual online

Ao Expresso das Ilhas, esta responsável refere que a rede enfrenta o desafio de lidar com casos de abuso e exploração sexual entre crianças e adolescentes em Cabo Verde. Embora a instituição não receba denúncias directamente das vítimas, tem obtido informações por meio de escolas, professores e profissionais parceiros, como sociólogos.

Diante dessa realidade, a rede está cada vez mais consciente e alerta para a necessidade de prevenção e reflexão sobre o tema.

Em sintonia com Junho, mês de prevenção contra os abusos e exploração sexual, a Rede Regional Santiago-Sul promoveu, no dia 16, no Liceu de Salineiro o seu primeiro Seminário de Prevenção ao Abuso Sexual nas escolas. O evento abordou questões cruciais, como quebrar o silêncio em torno do abuso sexual e a preocupação crescente com o abuso sexual online.

Durante o seminário, foram destacados os perigos das redes sociais e a importância de consciencializar meninas e meninos sobre os riscos envolvidos. O objectivo foi proporcionar um ambiente de aprendizagem e reflexão para a nova geração, alertando sobre a necessidade de precaução e segurança no uso das redes sociais e da internet em geral.

O abuso e a exploração sexual são, de acordo com Ana Lissa Teixeira, realidades preocupantes, especialmente devido ao aumento do acesso dos jovens às redes sociais.

“Há relatos de adolescentes envolvidos em situações sexuais filmadas e registadas em vídeos, seguidos de chantagem por parte de colegas ou pessoas que detêm o material, que evidenciam a gravidade desse cenário. O risco de exposição nas redes sociais e a subsequente violência e exploração sexual são consequências alarmantes desse comportamento”, sustenta.

A coordenadora garante que a Rede Regional Santiago-Sul está empenhada em enfrentar essa nova vertente de abuso e exploração sexual.

Desafios

A ONG enfrenta desafios significativos na sua missão de combater o abuso sexual infantil em Santiago-Sul.

Um dos principais obstáculos é, conforme a coordenadora, garantir o engajamento de parceiros para financiar os projectos da rede e assegurar a sua sustentabilidade a longo prazo. Nesse sentido, ela está em busca de novas parcerias que possam fornecer o suporte financeiro necessário para que os projectos possam se auto sustentar.

Além da questão financeira, a realidade cultural de Cabo Verde também apresenta um desafio crucial.

“Nem todas as pessoas reconhecem o abuso sexual como um crime, o que torna a consciencialização um elemento fundamental. O abuso sexual infantil muitas vezes não é tratado como um crime sério pela sociedade, sendo necessário o esforço da rede em esclarecer que se trata de um crime grave e inaceitável”.

“O fenómeno conhecido como “soco na rosto” e o termo “14zinha” são exemplos desse desafio, onde é necessário que as pessoas compreendam que estão diante de um crime sexual”, frisa.

A temática sensível do abuso sexual infantil também representa uma barreira para a rede. Nem todas as portas estão abertas para discutir e abraçar essa questão complexa, que envolve aspectos familiares e emocionais.

“O trabalho da rede envolve lidar com denúncias, factos e muitas vezes correr riscos ao desvendar interesses ocultos. Nem todas as pessoas estão dispostas a correr esse risco, o que torna o trabalho desafiante”, aponta.

No entanto, Ana Lissa Teixeira diz que a Rede Regional Santiago-Sul permanece determinada a enfrentar esses desafios em prol da protecção das crianças e da erradicação do abuso sexual infantil.

Nesse sentido, ressalta a importância de todos os esforços e apoios, sejam eles financeiros ou de consciencialização, para garantir a segurança e o bem-estar das crianças. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1125 de 21 de Junho de 2023.

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Autoria:Sheilla Ribeiro,25 jun 2023 10:09

Editado porAndre Amaral  em  26 jun 2023 9:52

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