“As pragas e a seca do mês de Outubro prejudicaram a produção agrícola” – agricultores

PorEdisângela Tavares,5 nov 2023 7:16

Em jeito de balanço os agricultores destacam que, apesar da abundância de chuvas, no mês de Agosto e Setembro, as pragas e a seca do mês de Outubro prejudicaram a produção deste ano. A colheita foi melhor do que a do ano passado, mas não alcançou as expectativas dos trabalhadores agrícolas.

A agricultura é uma actividade económica crucial em Cabo Verde, mas apesar dos desafios impostos pelas condições climáticas, é o sustento de muitas famílias. As chuvas escassas tornam a agricultura uma tarefa árdua, com a seca representando uma ameaça constante à produção de alimentos.

A previsão pluviométrica sazonal, anunciada pelo Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica (INMG), para o ano agrícola 2023, apontava para uma estação chuvosa “normal, tendenciosa a excedentária” nas ilhas a Sul do arquipélago, com “grande probabilidade” do início da estação em meados de Julho. Segundo a mesma fonte, o início da estação seria precoce, em meados de Julho, e que o fim da estação seria tardio, em meados de Outubro. Apesar das probabilidades terem indicado chuvas dentro do normal, o país registou eventos meteorológicos extremos, designadamente tempestades tropicais, chuvas intensas e ventos fortes.

Diante do feriado do Dia de Todos os Santos, celebrado com a tradicional festa do milho, o Expresso das Ilhas abordou os agricultores para um balanço da produção agrícola, conhecer os desafios enfrentados durante a temporada e as perspectivas para o próximo ano.

Santiago

No município de Santa Cruz, como revelou o presidente da Federação das Associações dos Agricultores e Pecuários de Santa Cruz, Cesário Varela, os frutos do cultivo de sequeiro não corresponderam ao esperado pelos agricultores. Este representante conta que alguns campos de cultivo, onde se esperava uma grande produção de feijão (bongolon), foram atingidos por pragas de tartarugas, que provocaram grande perda deste cultivo. Cesário Varela apontou que alguns terrenos de cultivo nas zonas altas do município de Santa Cruz é que podem contabilizar uma colheita mais avantajada, mas, ainda assim, não cumpriu as expectativas.

“Na agricultura de sequeiro em Santa Cruz, os resultados não foram os esperados pelos agricultores. Estávamos à espera da última chuva em Outubro, que acabou por não acontecer, o que prejudicou a produção de milho e feijão bongolon. As pragas de gafanhotos e tartarugas atingiram o cultivo do bongolon, que provocaram grandes perdas, mas podemos dizer que ganhamos pasto para os animais. Nas zonas baixas do concelho, podemos dizer que praticamente este ano o cultivo não rendeu nada. No geral, podemos avaliar que o ano agrícola de 2023 não foi positivo”, considerou.

Na agricultura de regadio, o presidente da federação e os agricultores entrevistados nesta reportagem enfatizaram que a falta de água continua sendo este o principal problema para os produtores de Santa Cruz, limitando a produção que antes conseguia abastecer, além da capital, as outras ilhas do país. Cesário Varela revela que um grande número de agricultores está a abandonar os campos para aventurarem na emigração, uma vez que não têm obtido rendimento suficiente para o sustento do agregado familiar.

“O abandono vem ocorrendo ainda por outras razões, algumas pessoas estão a abandonar o cultivo por conta da falta de água, uma vez que têm de trabalhar com água salobra que acaba por danificar o terreno. Por isso preferem não cultivar. Uma outra questão é o preço dos combustíveis que, aumentando, muitos não conseguem custear as despesas da rega e acabam por abandonar os campos de cultivo. Temos muitos campos abandonados em Santa Cruz, principalmente pelos jovens que antes demonstraram algum interesse pela agricultura e que hoje estão a aventurar-se na emigração por conta das dificuldades de cultivo”, acrescentou.

Em São Lourenço dos Orgãos, Anilton Fernandes, morador de Pico da Antónia, testemunhou que tiveram boa colheita em relação ao feijão bongolon, mas que o mês de Outubro acabou por ser menos favorável.

“Em Outubro, se tivesse caido uma boa chuva a colheita seria melhor. Aproveitamos a época dos feijões verdes, não tivemos muitos problemas com as pragas, mas já na recta final com o clima mais seco e bastante sol os produtos de que estávamos à espera que amadurecessem acabaram por secar. Não tivemos perda total, mas poderia ter sido melhor”.

No município de São Salvador do Mundo, Nazaré Barros confidenciou à nossa equipa que este ano o cultivo de sequeiro deu melhores frutos que o ano passado, embora também não tenha sido o que estavam à espera, avaliou como positivo o ano agrícola 2023.

“As primeiras chuvas indicavam um bom ano agrícola, infelizmente estávamos à espera da última grande chuva que não aconteceu. Tivemos um bom ano, se comparamos com o ano anterior, mas acredito que seria melhor se tivesse caído mais chuva na recta final. Temos milho para o feriado de Todos os Santos, tivemos boa colheita em termos de feijão, só temos que agradecer. Temos a esperança que o próximo ano será ainda melhor, podemos dizer que as coisas estão a melhorar”.

Fogo

Na ilha do Fogo, o jovem agricultor de Ponta Verde, Júnior Silva, confessa também que esperava uma produção mais robusta este ano. Júnior conta que com as primeiras colheitas de feijão-fava, feijão-manteiga e feijão-congo os agricultores estavam animados com a safra, embora algumas localidades estivessem mais atrasadas na produção. A esperança era de uma farta produção agrícola em 2023.

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“Infelizmente, não tivemos muita sorte. Estávamos à espera de uma grande chuva em Outubro para intensificar o processo de amadurecimento dos produtos, mas não aconteceu. O clima seco e o sol forte acabaram por secar a plantação antes de tempo, prejudicando a produção agrícola deste ano. Também estamos a enfrentar pragas de tartaruga que acabam com a plantação de feijão-bongolon, milho, abóbora e outros produtos. Não podemos desmerecer a produção, tanto que se compararmos com o ano de 2022, podemos dizer que foi uma boa colheita, mas este ano foi muito abaixo do esperado e algumas zonas contabilizaram ainda menos produção porque as pragas tomaram conta do cultivo. Na minha opinião, o ano seria melhor se chovesse mais no mês Outubro. Não ficou totalmente perdido, mas não podemos dizer que o ano agrícola de 2023 foi positivo”.

Boa Vista

Andrelino Delgado, produtor agrícola de João Galego, na ilha da Boa Vista, avalia como razoável a produção deste ano. Este agricultor confessa que não tinha grandes expectativas em relação ao ano agrícola por conta da praga de gafanhotos mas que, ainda assim, seguiu no cultivo.

“Este ano a produção foi melhor do que no ano passado. Tivemos uma boa produção de cenoura e batata, embora haja aqui no Norte uma grande quantidade de acácias que dificultam a produção de feijões. Podemos dizer que em relação aos anos anteriores, este ano estamos melhor em termos de aproveitamento do nosso trabalho. Não foi uma grande produção ao ponto de ser avaliado como positivo, mas ainda assim podemos dizer que o grande criador não se esqueceu de nós.”

Ainda no Norte da Boa Vista, na localidade de Cabeça dos Tarrafes, o jovem produtor Carlito Correia diz que diferentemente de João Galego, a localidade teve uma fraca produção que foi ainda mais prejudicada pela praga dos gafanhotos.

“Este ano de Cabeça dos Tarrafes não produziu quase nada. Tivemos problemas com pragas de gafanhotos que consumiram praticamente tudo do pouco que tínhamos. Tivemos apoio do Ministério da Agricultura, mas não serviu de nada: a praga continuou a devorar o cultivo. Este ano foi pior que o ano passado, então a avaliação que faço é negativa para a produção agrícola de 2023. O que resta é esperar que o próximo ano seja melhor para que possamos colher melhores frutos”, vaticinou.

Santo Antão

Na Ilha das Montanhas, este jornal esteve em conversa com o agricultor da localidade de Caibros, Emanuel Medina, que, com entusiasmo, informou que o ano agrícola está garantido, mau grado as pragas que ainda causam problemas.

“O ano agrícola está garantido. Embora tenhamos pragas na plantação de milho e feijão, podemos dizer que, se no final do mês de Outubro tivesse caído um pouco mais de chuva, a avaliação seria positiva com uma colheita muito melhor. Não perdemos o ano e comparado com o ano anterior podemos dizer que foi bem melhor e a nota é positiva para a produção agrícola deste ano”.

Maio

Margarida Carvalho, que trabalha na agricultura na ilha do Maio, lamentou a fraca produção deste ano. Ela, que também é comerciante, já prevê o aumento do preço dos produtos devido ao “mau ano agrícola” na ilha.

“As pessoas que semearam mais cedo tiveram alguma colheita. Este ano tivemos boa produção de melão e melancia, mas os produtos de sequeiro como o milho e feijão não deixaram boas novidades para contar. Este ano podemos dizer que Maio não teve praticamente nada de produção agrícola”. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1144 de 1 de Novembro de 2023.

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Autoria:Edisângela Tavares,5 nov 2023 7:16

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  22 abr 2024 23:28

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