Empreendedorismo na educação" ganhando espaço e respeito"

PorAnilza Rocha - Estagiária,7 set 2025 8:48

O empreendedorismo é uma saída, uma oportunidade para jovens no país. São várias as áreas em que podem optar. No caso de Etson Garcia, Berenice Tavares, Cláudia Semedo e Leonardo Costa, escolheram apostar na educação. Mas as dificuldades não estão ausentes para os que pretendem investir nesta actividade económica.

O Expresso das Ilhas conversou com a Associação Jovem Empreendedor de Cabo Verde (AJECV), que menciona que, para empreender na edução, os jovens enfrentam vários desafios. Entre os principais obstáculos, destaca-se o acesso ao financiamento, a complexidade da burocracia para formalização do negócio e a pressão para se actualizar sempre nas metodologias e conteúdos. A concorrência com o sistema formal é outra pedra no sapato, pois, segundo a Associação, nem sempre é fácil se destacar.

Na voz do Secretário da AJECV, Admilson Gomes, o acesso ao financiamento para esta área é bem mais complicado que as demais. Os bancos costumam ver esses negócios como arriscados, principalmente se forem inovações ou de menor escala. Para conseguir apoio financeiro, muitas vezes é preciso mostrar o impacto social e pedagógico do trabalho, o que nem sempre é fácil de se traduzir em garantias.

No que se refere aos processos burocráticos, a barreira é significativa. O processo de registro e licenciamento pode ser muito demorado e complicado, especialmente para quem não tem experiência ou apoio. Além disso, a falta de clareza em algumas regras específicas do sector educativo pode deixar os jovens empreendedores inseguros.

No geral, o empreendedorismo na educação ainda está ganhando espaço e respeito, aponta.

Para aAJECV, épreciso políticas públicas mais fortes, que incluam a simplificação dos processos de licenciamento e registo, oferta de linhas de crédito com condições favoráveis, incentivos fiscais e programas específicos de capacitação para ajudar os jovens a se desenvolverem nesse sector. A própria Associação apoia-os com formações, mentorias e networking, facilitando o início de negócios educativos e acesso a recursos.

Para o futuro do empreendedorismo jovem no ensino em Cabo Verde, verifica-se uma tendência crescente na digitalização da educação, com o uso de plataformas online e ensino à distância se tornando comum. E o empreendedorismo social na educação deverá ganhar ainda mais destaque. Admilson Gomes vê que essas iniciativas complementam bastante o ensino formal, oferecendo reforço escolar, actividades extracurriculares e formações em habilidades específicas, como línguas e tecnologia. Muitas vezes, conseguem adaptar a aprendizagem às necessidades dos alunos de forma mais dinâmica do que o sistema tradicional.

Histórias e opiniões de empreendedores:

Escola Online

A génese da Nucoode remonta ao período em que Leonardo Costa residia em Lisboa, em 2021. Na altura, este jovem percebeu que Cabo Verde não dispunha de uma verdadeira escola digital especializada em novas tecnologias.

Começou, então, a desenhar o que viria a ser a primeira escola online de programação e competências digitais do país, com o objectivo de criar um ecossistema de formação capaz de preparar talentos para o mercado global. Investiu seu próprio capital, explicando que tomou esta decisão devido à particularidade do mercado financeiro e porque, pela experiencia adquirida numa startup portuguesa, já tinha a noção das volatilidades financeiras de um negócio na sua fase embrionária.

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Logo no início a escola teve um impacto expressivo e recebeu prémios, menções honrosas e reconhecimento em canais de notícias nacionais e internacionais, além de marcar presença em cimeiras regionais e internacionais sobre tecnologia e educação.

Para Costa, é imperativo que investir em infraestruturas de telecomunicações de alta qualidade, criar políticas de incentivo à inovação tecnológica e estabelecer parcerias público-privadas para impulsionar a literacia digital.

E vê o crescimento do ensino online como inevitável e acelerado, e que a democratização do acesso ao conhecimento, aliada à conectividade, será determinante para criar competitividade real.

Escola de Música

No bairro de Eugénio Lima, encontramos a Escola de Música, Melodias da Fé, criada no ano passado, 2024, num espaço cedido por familiares. Uma iniciativa dele e seu irmão, que materializaram um sonho de infância. As aulas que vão desde piano, bateria e violão, contam hoje com alunos da mesma localidade ou de bairros vizinhos.

A empresa tem duas vertentes: multisserviços e arte. Na parte de multisserviços, que ainda não tem um espaço físico próprio, oferecem serviços de compras, envio de todos os tipos de produtos da ilha de Santiago, intermediações e representações. Na parte das artes, está a escola de música que oferece três níveis de aprendizado: iniciante, intermedio e avançado.

Etson Garcia contou-nos que inicialmente se inscreveram nas aulas cerca de 30 alunos, com idades que variam entre os 6 e os 25 anos. Mas o fluxo de alunos vária de época para época. Já a mensalidade gira em torno de 1.000 a 1.500 escudos. Enalteceu que, graças à parceria com programa BA-Cultura conseguiram financiar as mensalidades dos alunos que não conseguem pagar.

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Das dificuldades iniciais fala em procrastinação, burocracia para formalizar a empresa e financiamento para sustentar a iniciativa.

Como empreendedor elencou os altos e baixos, pois nem tudo vai correr como planeado. Mas ressalva que é preciso continuar a marchar e que, no caso, deles também é necessário saber gerenciar o tempo entre ser empreendedor e ser estudante. Para o futuro, os dois irmãos pensam em abrir uma loja de instrumentos e artigos relacionados, aumentar os recursos humanos nos empreendimentos e abrir representações em outras ilhas como são Vicente, Sal e Boa Vista.

Escola de Inglês

Berenice Tavares admite que iniciou a dar aulas de inglês movida pela paixão de partilhar conhecimento e ajudar jovens a desenvolverem competências úteis para a vida e para o mercado de trabalho. A Bere Teaches deu partida, então, em 2021, num espaço alugado no Platô, oferecendo aulas e oficinas de língua inglesa e desenvolvimento infantil, centralizadas nas habilidades dos alunos e no reforço escolar do 1º ao 6º ano.

Suas classes, compostas por turmas pequenas, de 5 a 10 alunos, não a impede de ter um bom retorno financeiro e ainda auxilia a dar um acompanhamento mais próximo, revelou.

Berenice Tavares revelou que inicialmente era preciso conquistar a confiança dos alunos e organizar materiais didáticos adequados para diferentes níveis. Actualmente, os impasses passam por conciliar a gestão do negócio com a personalização do ensino, para atender às necessidades individuais de cada aluno, mantendo a qualidade e motivação constantes.

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Ensinar e empreender é um desafio que, para Berenice, exige equilíbrio das duas funções. Aponta que a parte pedagógica exige dedicação e criatividade, e a gestão do negócio, que implica planeamento financeiro, marketing e administração. A empreendedora relatou o quanto este trabalho transformou a sua visão sobre a educação e comunidade, pois mostrou-lhe o impacto real que se pode ter na vida das pessoas.

Há novos horizontes há traçar por Berenice Tavares: a expansão do projecto para alcançar mais crianças e jovens, incluindo a criação de novos cursos e parcerias com outras instituições e o desenvolvimento de mais conteúdos online para atingir públicos fora da Cidade da Praia.

Aulas domiciliares

Em Outubro de 2022, quando se viu grávida e desempregada, Cláudia Semedo começou a dar aulas de reforço escolar em grupo, no bairro de Bela Vista. Conseguir alunos e convencê-los da importância das aulas de reforço, além da falta de condições económicas das pessoas daquela localidade, foram as primeiras dificuldades.

No ano seguinte, 2023, surgiu uma oportunidade de trabalhar com aulas domiciliares, porque Cláudia viu que era um défice no mercado. Com a correria do dia-a-dia, os pais não conseguem acompanhar a vida escolar dos filhos. E foi em 2024 que decidiu criar a empresaArte de Educar Estudos Acompanhados. Hoje, oferece aulas de reforço escolar ao domicílio, do 1⁰ ao 10⁰ ano, de segunda a sábado, no horário contrário às aulas, 2 ou 3 vezes por semana. Mas também faz acompanhamento escolar que vai desde a organização da agenda escolar até ao acompanhamento junto dos directores de turma do aluno e participação em reuniões escolares. O custo das classes varia entre os 6.500$00 e 9.000$00 escudos, consoante o número das aulas por semana, ajudando a garantir boa rentabilidade.

Cláudia disse que teve um grande desafio no seu percurso, que foi de trabalhar com 2 alunos com dislexia, apesar de não conhecer a fundo sobre o tema. Lamenta que seja pouco falado e que muitos pais não têm conhecimento deste assunto. Quando há casos onde as dificuldades dos alunos vão além do que é considerado normal para a idade, orienta os pais a procurarem ajuda nos psicólogos e profissionais da área.

Para Cláudia, ensinar nunca foi um desafio, mas empreender tem outro peso.

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Segundo explica, empreender em Cabo Verde está em alta. O problema, sublinha, começa desde a abertura de empresa. Por falta de informação, empreendedores são “jogados de um lugar para outro” devido à inexistência de um lugar credível para obter todas as informações. Acerca do financiamento, disse que muitas vezes são iludidos com informações que não correspondem à realidade, o que se torna desanimador.

Mas acredita ter encontrado seu propósito, que passa por transformar a vida dos seus educandos. Lembra com emoção a história de uma aluna. Os pais estavam muito preocupados porque não tinha o mesmo ritmo dos seus colegas na sala aula. Mas, no final do 3⁰ trimestre, a criança disse-lhe uma frase: "professora djan sabi lê ". Descreveu isso como uma sensação muito gratificante.

No futuro, pretende abrir uma escolinha de reforço, onde possa receber os alunos mais carenciados, porque também é um pedido que recebe de muitos pais, que não conseguem pagar o valor actual de aulas domiciliares.

A jornada desses jovens empreendedores no sector da educação, passa por desafios e conquistas. O desafio de conseguir financiamento é um deles, mas isso não os impede de traçar novos alvos. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1240 de 3 de Setembro de 2025.

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Autoria:Anilza Rocha - Estagiária,7 set 2025 8:48

Editado porFretson Rocha  em  8 set 2025 13:36

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