Santa Cruz: Entre perdas, lágrimas e esperança — as vozes que resistem depois das chuvas de 13 de Novembro

PorExpresso das Ilhas, Inforpress,18 nov 2025 8:29

Os rostos marcados e os campos devastados revelam o impacto das chuvas de 13 de Novembro em Santa Cruz, onde ribeiras e encostas perderam casas, plantações e currais, restando apenas pedras, troncos e vestígios da agricultura que sustentava famílias.

Em João Touro, na Ribeira dos Picos, Angelina Delgado ainda não conseguiu entrar em todos os compartimentos da casa dos pais. A força da água rompeu portas, invadiu a residência e deixou um rasto de lama e entulho que tomou conta de tudo. Entre móveis destruídos e paredes feridas, Angelina só consegue agradecer pela vida.

“Deixei seis porcos no final da tarde… de manhã só dois estavam vivos, em cima da casa. Nem sei como escaparam”, conta, com a voz embargada. As canas sacarinas, bananeiras, papaeiras — tudo desapareceu, assim como as hortas dos vizinhos.

Mais acima, os jovens Catiza Silva e Elton tentam recuperar do choque de ver a casa que estavam a construir ser levada pela ribeira. “Estava lá o nosso filho de quatro anos… por pouco não o perdemos”, recorda Catiza.

Sem casa, sem plantações, sem terreno, a pergunta que repetem é a mesma que ecoa em toda a comunidade: como recomeçar, quando tudo o que tinham veio da terra — e a terra já não existe?

Apesar da destruição, as ribeiras não perderam o som das crianças, que ainda encontram espaço para brincar nas águas que restam.

Adultos e idosos observam em silêncio, tentando compreender o que aconteceu e como a natureza pode transformar-se tão rapidamente.

Em Ribeirão Almaço, o agricultor Luís Pinto descreve a noite da chuva como “assustadora”.

“Primeiro começou lenta… depois intensificou-se de uma forma que todos ficamos preocupados”, lembra.

Este agricultor calcula que 90 por cento (%) da agricultura perdeu-se, junto a cabeças de gado, equipamentos de rega e quatro fontes com motores.

“O que antes era terreno plano agora é apenas o leito de uma ribeira aberta à força da água”, disse.

Mesmo assim, insiste: “A chuva é sempre bem-vinda. Vamos reerguer. Com apoio do Governo e com djunta-mon, conseguimos”, declarou confiante.

É também essa palavra — djunta-mon — que guia Ivanildo Monteiro, de 35 anos, que há anos abraçou a agricultura como alternativa ao desemprego e para fugir à emigração, que não era opção.

Agora, após ver cerca de 500 pés de bananeira arrastados e outras plantações desaparecerem com o solo, já não descarta partir.

“Por pouco a zona ficava sem vida humana. A água era muita, muito alta. Salvamo-nos, mas perdemos tudo: tubos, plantações, terreno”, desabafa.

A comunidade já começou a reunir-se para trabalhar unida e reconstruir o que puder, apesar de ninguém ainda ter noção dos custos da recuperação.

As chuvas, que começaram leves na manhã de quinta-feira, 13, transformaram-se ao final da tarde numa força devastadora, arrastando viaturas, animais e embarcações, cortando acessos e deixando um desaparecido no Tarrafal.

No entanto, em Santa Cruz, entre a dor e o silêncio, resiste um sentimento que nenhuma enxurrada conseguiu levar: a gratidão pela vida e a certeza de que é unidos — no trabalho, na fé e na força comunitária — que irão reerguer-se.

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Autoria:Expresso das Ilhas, Inforpress,18 nov 2025 8:29

Editado porAndre Amaral  em  18 nov 2025 10:21

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