Estado de Calamidade em Santiago Norte: “Estragos nunca antes vistos”

PorAnilza Rocha - Estagiária,23 nov 2025 9:16

O estado é de calamidade em Santiago Norte, após as chuvas de quinta-feira, 13, que causaram estragos em infra-estruturas, habitações e actividades económicas em Santa Cruz e São Miguel. Há registo de uma vítima mortal.

A decisão foi tomada no dia seguinte, 14, pelo primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, permitindo accionar o Fundo Nacional de Emergência, destinado, sobretudo, ao apoio às pessoas directamente afectadas.

O chefe do Governo deslocou-se aos municípios mais atingidos para uma avaliação “in loco” dos danos. Numa das vistas, em Santa Cruz, reforçou que o apoio será definido caso a caso, dada a diversidade de situações. Serão accionados diversos instrumentos de protecção aos agricultores e criadores com maiores perdas, subvenções destinadas a compensar quebras de rendimento e incentivos para a retoma imediata das actividades.

Também em missão ao norte da ilha, o Presidente da República, José Maria Neves, defendeu durante visita realizada esta terça-feira, 18, a necessidade de se ter políticas públicas municipais e nacionais urgentes e robustas, voltadas para a correção torrencial e o combate à erosão, face aos fenómenos climáticos extremos.

“É importante prestar atenção naquilo que os agricultores estão a alertar que é a continuidade do trabalho de correção torrencial e de combate à erosão”, afirmou, especificando que este trabalho deve incluir a construção de diques, a plantação de árvores, para que as bacias hidrográficas estejam mais preparadas.

Em Tarrafal, entende que o orçamento da câmara é limitado e que, para responder com urgência a situações deste tipo, é necessário que o Governo apoie rapidamente a reabilitação de algumas infra-estruturas urbanas e equipamentos económicos.

A visita do Presidente da República, que se estende por três dias, iniciou-se no Tarrafal com uma reunião com o presidente da câmara, seguida de rondas pelos principais pontos afectados, como a praia do Tarrafal, Ponta Lagoa e Fundo Fonton.

São Miguel

No município de São Miguel, interior de Santiago, os maiores estragos causados pelas precipitações concentram-se nas zonas rurais, onde bacias hidrográficas de São Miguel de Flamengo, Ribeireta, Ribeira-São Miguel, Canto Grande e a bacia de Ribeira Principal ficaram “totalmente desconfiguradas”.

Agricultores e criadores de gado perderam parte considerável dos seus cultivos e animais, arrastados pelas águas. Infraestruturas hidráulicas, diques, socalcos, reservatórios, muros de contenção, também ficaram prejudicados.

Somam-se a esses estragos as perdas consideráveis de terrenos produção agrícola, perdas de animais, rupturas nos sistemas de abastecimento de água e energia, bloqueio e encravamentos de comunidades, danos em infra-estruturas de ensino e em habitações de mais de quatro dezenas de famílias.

Uma situação, extremamente delicada para o povo de São Miguel, nas palavras do Presidente da Câmara Municipal de São Miguel, Herminio Fernandes, ao Expresso das Ilhas. Estima-se em 10 dias a ligação a todas as comunidades encravadas, sendo que até o momento foi restabelecido o acesso a 75% delas.

image

Não fala em um ano agrícola perdido, considerando ser prematuro esta análise, mas admite que os estragos são enormes. Cita, por outro lado, ganhos em matéria de reforço de aquíferos e de lençóis freáticos, que poderão beneficiar a disponibilidade hídrica futura.

“São Miguel está num estado de calamidade total, sobretudo a nível das zonas do interior, onde houve deslizamento de terras em todas as comunidades e bacias. A escola de Ribeira Principal foi duramente afectada”, lamenta o autarca.

Herminio Fernandes avalia que, nos próximos meses, a economia municipal estará condicionada. Daí que apela à solidariedade da comunidade internacional, do Governo e de todos os parceiros a fim de apoiar e dar o suporte necessário para a retoma da economia e do dinamismo do sector agropecuário.

Santa Cruz

Os danos são consideráveis, a nível do município de Santa Cruz, atingindo todas as oito ribeiras agrícolas. Três delas - Cumba, Ribeirão Almaço e Cabeça Horta - registam estragos “gravíssimos”, com Cumba a sofrer 90% de destruição. Estes são dados relevados pelo Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, à Rádio de Cabo Verde (RCV).

De acordo com Carlos Silva, vários poços de água de rega ficaram assoreados, com perda de 12 a 13 motores de bombagem, além de danos significativos em tubagens e reservatórios.

As fortes enxurradas provocaram perdas totais e parciais de habitações, sobretudo na zona de Ribeira dos Picos, o que representa uma grande preocupação à autarquia.

Outro grande problema tem a ver com zonas gravemente encravadas, como é o caso de Rebelo, Ribeirão, Almaço, Matinho, Boa Ventura. “Vamos aproveitar a situação de calamidade para ver até que ponto podemos, junto do Governo, encontrar uma solução definitiva para estas localidades”, sublinhou.

Até ao momento, já foi restabelecido o acesso nas estradas ao norte, em direção à Calheta de São Miguel, mas as equipas continuam no terreno a melhorar acessos nas restantes localidades afectadas.

Carlos Silva considera Santa Cruz como um dos concelhos mais prejudicados do ponto de vista económico, no que tange à agricultura e pecuária. Enquanto “celeiro de Santiago”, fica a preocupação da possibilidade de uma crise de alimentos e prejuízo na segurança alimentar nacional, já que abastece também mercados de outras ilhas.

image

Agora, com olhos postos na recuperação, dá a garantia de que Câmara vai apoiar a população naquilo que puder, nomeadamente na manutenção de poços, reservatórios e dos apoios com o Fundo de Inclusão Financeira. Espera, neste contexto, um apoio muito rápido do Governo e dos parceiros.

Tarrafal

O município do Tarrafal contabiliza uma vítima mortal, e danos materiais significativos, num impacto descrito como “nunca antes registado”.

Em declarações a Inforpress, José dos Reis, presidente da Câmara Municipal do Tarrafal, revelou, que as enxurradas afectaram habitações, estradas e zonas de produção agropecuária, entre as quais Fundo de Fontom, um dos mais importantes polos produtivos do concelho.

Nesta localidade, as famílias perderam criações, hortas, animais e registam-se ainda danos nas infra-estruturas hidráulicas que estavam em construção com financiamento de parceiros, sobretudo de Espanha.

Com as chuvas, embarcações foram arrastadas para o mar, mas "felizmente foi possível recuperá-las, com o apoio dos homens do mar”. Troços das estradas nacionais foram danificados e algumas famílias ficaram em situação de risco devido ao estado de degradação das suas habitações.

Da avaliação feita pela empresa Águas de Santiago, identificaram-se várias rupturas, perdas de água, fugas e danos em diferentes troços da rede, além de estragos em infra-estruturas físicas como abrigos de furos e casas de manobras. Problemas que exigem intervenção urgente.

Mas o maior lamento é a perda de António Horta Varela, conhecido por “Bercídio”, de 62 anos, que foi arrastado para o mar pela forte corrente das chuvas, em Porto Formoso, enquanto se deslocava numa viatura acompanhado por mais duas pessoas. Berícidio natural do município de Santa Catarina, residente na Holanda, encontrava-se em Cabo Verde a gozar as férias com a família.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1251 de 19 de Novembro de 2025.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Anilza Rocha - Estagiária,23 nov 2025 9:16

Editado porAndre Amaral  em  23 nov 2025 9:57

pub.
pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.