O professor catedrático convidado da Universidade Autónoma de Lisboa e especialista em assuntos africanos destaca Cabo Verde como “a única antiga colónia que apresenta um balanço positivo”.
“Eu diria que estes países são novos, mas já chegaram à meia-idade. E, na verdade, tardam em dar passos decisivos em frente porque a qualidade da governação não é boa”, afirma.
Segundo o investigador, Cabo Verde constitui uma excepção, “porque apresenta crescimento económico e um sistema multipartidário que já deu provas através de várias alternâncias de poder”.
“Havendo crescimento económico, Cabo Verde enfrenta as dificuldades típicas de uma economia pequena e com poucos recursos, mas não tem problemas relacionados com o respeito pelos direitos humanos”, acrescenta.
O país, prossegue, “demonstrou possuir elites capazes e um regime político que se adapta aos seus objectivos”, o que contrasta com a realidade das restantes ex-colónias.
Para Fernando Jorge Cardoso, São Tomé e Príncipe é o país que mais se aproxima de Cabo Verde em termos de balanço positivo.
“São Tomé e Príncipe é um caso peculiar. É um país sem recursos, com a constante promessa de jazidas de petróleo, mas cuja economia não consegue explorar plenamente o seu potencial, nomeadamente as belezas naturais e os serviços”, observa.
Embora não existam “problemas significativos de direitos humanos ou de democracia”, o investigador considera que o principal desafio do país é “a incapacidade de transformar as suas potencialidades em crescimento económico e melhoria do nível de vida”.
Quanto à Guiné-Bissau, Fernando Jorge Cardoso sublinha que, apesar da existência de um sistema multipartidário, eleições e alternâncias de poder, persistem sérios problemas políticos.
“Esses problemas já deram origem a vários golpes de Estado e conduziram a um regime atualmente capturado por um grupo dirigido pelo Presidente Umaro Sissoco Embaló”, afirma, apontando suspeitas “baseadas em indícios relatados pela imprensa e pela polícia” que ligam o chefe de Estado ao tráfico de drogas.
“Significa que a Guiné-Bissau vive um processo em que precisa de se regenerar, e essa mudança cabe aos próprios guineenses. Não pode haver intervenção externa nem retrocessos, mas o atual regime deve muito em matéria de direitos humanos e de decência política”, frisa.
No caso de Angola, o investigador recorda que ainda não houve alternância de poder, prevalecendo “uma democracia apenas formal”.
“Temos o mesmo partido no poder desde a independência, uma guerra civil que marcou o país e uma economia que tarda em diversificar-se. Embora existam eleições, o regime ainda não provou ser verdadeiramente democrático”, sustenta.
Sobre a ideia de que os recursos naturais podem ser uma bênção ou uma maldição, Fernando Jorge Cardoso rejeita a dicotomia.
“Ter recursos nunca é uma maldição, é uma bênção. O problema está nos dirigentes, não nos recursos. Se falarmos em ‘maldição’, é a dos dirigentes”, defende.
Segundo o investigador, Angola enfrenta “fome, manifestações violentas e repressão aberta”, vivendo “uma democracia musculada”.
Relativamente a Moçambique, país onde nasceu e se formou em Economia em 1976, Fernando Jorge Cardoso considera que “se trata de um caso complicado”, dominado por “um regime que não quer deixar o poder”.
Na sua perspectiva, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder desde a independência, “foi capturada por interesses”.
“Alguns desses interesses foram criados internamente, outros vieram de fora e capturaram as pessoas de dentro. O resultado é uma Frelimo controlada por grupos pouco interessados no desenvolvimento do país e muito mais empenhados em manter o poder para fins pessoais e partidários”, conclui.
Das cinco antigas colónias portuguesas em África, a Guiné-Bissau é a única que já assinalou 51 anos de independência, proclamada unilateralmente a 24 de setembro de 1973. Moçambique (25 de junho), Cabo Verde (5 de julho), São Tomé e Príncipe (12 de julho) e Angola (11 de novembro) celebram este ano meio século de independência.