Nesta entrevista, Antónia Dias explica os contornos do processo em curso que visa tornar a administração tributária cabo-verdiana uma instituição de elevado valor e eficiência e um instrumento de cidadania, de equidade e de justiça fiscal referenciada, bem como de eficiência e de competitividade para as empresas cabo-verdianas.
Que ganhos espera a DNRE obter com a implementação da Notificação Electrónica ?
Um dos maiores ganhos será a facilidade e rapidez com que a DNRE se pode dirigir aos contribuintes, que passa a ser fácil, simples e imediata. Até agora, a DNRE depara-se com algumas dificuldades em notificar os contribuintes, pois a notificação é entregue em mãos, através do suporte físico “papel”. Essa entrega é demorada e muitas vezes sem sucesso. E como a lei exige a notificação dos atos aos contribuintes, os processos ficam parados por falta dessa notificação. Na sociedade atual, em que graça às novas tecnologias de informação e comunicação, os atos das administrações fiscais são praticados em massa, este modelo de notificação está esgotado. Assim, o modelo até agora utilizado não garante a total cobertura e eficiência na atuação e repressão da evasão fiscal por parte da DNRE, pois a reação ao incumprimento é escassa e não sistemática, pelo que se revelou necessário promover a abrangência e a universalização do sistema, através da notificação eletrónica. A partir de agora, com a implementação da notificação eletrónica, os contactos podem ser diários, permanentes e instantâneos.
Que vantagens traz a notificação electrónica para os contribuintes?
A implementação do sistema de notificações irá proporcionar os seguintes serviços aos contribuintes: receber de forma mais rápida as comunicações, aumentando a rapidez de apreciação dos seus pedidos; receber informação, por via eletrónica, de ajuda e alerta sobre a aproximação do final dos prazos de cumprimento das obrigações fiscais, evitando assim os elevados custos associados ao incumprimento; consultar no Portondinosilha as comunicações que a DNRE lhe enviou, de forma imediata em qualquer momento, evitando-se assim o extravio dessas comunicações. As empresas que cumprem as suas obrigações e os cidadãos cabo-verdianos vão ter um ganho imenso, dado que este sistema ajudará a mitigar o facto das empresas terem que competir com outras que, não pagando os seus impostos, adquirem uma vantagem competitiva ilícita, que é profundamente injusta e lesiva do crescimento económico. Os cidadãos cabo-verdianos beneficiam com uma administração fiscal que garanta a eficiência e justiça do sistema fiscal, permitindo assim que o Estado cumpra o consagrado na Constituição da República de Cabo Verde (CRCV), que é a redistribuição da riqueza e ainda os contribuintes passam a gozar de uma maior segurança jurídica, uma vez que a data de notificação passa a ser assegurada pelo certificado temporal (time stamp), já que podem ser objeto de litígio.
Quais os ganhos para a Administração Fiscal?
A Notificação Eletrónica é um instrumento estratégico para o aumento da eficiência da DNRE, que só se torna possível com a Assinatura Eletrónica Qualificada.Todas as notificações efetuadas no processo passam a ser automáticas e imediatas o que aumenta a rapidez da sua tramitação;as repartições de finanças vão ganhar uma elevada eficácia que lhes permitirá sancionar de forma rápida e efetiva todas as situações de incumprimento, numa primeira fase de implementação do processo, do dever de entrega do IVA e da retenção na fonte, bem como recuperar as dívidas correspondentes; desmaterialização das comunicações, poupando em papel e burocracia.Este modelo carateriza-se ainda pela economia de custos para o Estado e, portanto, para os cidadãos cabo-verdianos, porque são sempre eles que pagam com os seus impostos os custos de funcionamento do Estado.
Será assinado brevemente entre a DNRE e a SISP um protocolo de colaboração. Qual é o objectivo deste protocolo?
A Sociedade Interbancária e Sistemas de Pagamentos (SISP) é a primeira e única entidade privada em Cabo Verde certificada para a prestação de serviços de certificação e segurança eletrónica, sobre a estrutura ICP-CV (Infraestrutura de Chave Pública de Cabo Verde), credenciada em Dezembro de 2018, pela ARME (Agência Reguladora Multissectorial da Economia) que é a Autoridade Credenciadora (AC) e responsável por operar a Entidade de Certificação Raiz de Cabo Verde (ECR-CV). O protocolo tem em vista o fornecimento de certificados de assinatura eletrónica qualificada de representação de pessoa coletiva, de certificados de selo e de validação cronológica (time stamp), e a definição clara das obrigações tanto da SISP, como da DNRE na emissão e gestão dos Certificados Eletrónicos.
No âmbito da implementação da Assinatura e Certificação Eletrónicas (ACE), a DNRE realizou duas acções de formação. Qual foi o objectivo das duas ações de formação?
O objetivo foi apresentar a legislação que regula a assinatura eletrónica e também a legislação que permite a notificação e citação eletrónica em Cabo Verde. Por a DNRE ser pioneira na utilização dos certificados de assinatura eletrónica, é muito importante que os utilizadores desta tecnologia possam conhecer o fluxo do processo de assinatura e toda a infraestrutura por detrás dos certificados que passarão a utilizar. É preciso que estejam conscientes das regras da sua utilização e de como se processa a assinatura e a notificação eletrónicas. O sucesso de qualquer processo passa pelo empoderamento dos seus intervenientes, e nesta matéria não poderia ser diferente.A implementação deste sistema altera o paradigma de funcionamento da DNRE, que transita de um modelo baseado em papel e na gestão manual dos processos, que é pouco eficiente para um modelo eletrónico, automatizado e de elevada eficiência. A mudança só é possível com o envolvimento de toda a equipa de dirigentes e colaboradores da DNRE, pelo que as ações de formação tiveram também essa finalidade.
Quem eram os destinatários das respetivas formações?
Na formação de 21 de Março, participaram as chefias dos serviços centrais e os chefes de Repartição de Finanças da ilha de Santiago; a mesma formação foi replicada no dia 29 de Março para as demais chefias dos serviços locais de Direção de Geral de Contribuições e Impostos.
A DNRE tem enviado emails aos contribuintes. Qual é a diferença entre os emails enviados pela DNRE para o endereço de correio eletrónico e as notificações eletrónicas?
Os emails que a DNRE envia para o correio eletrónico dos contribuintes veiculam apenas informação facultativa e de apoio ao cumprimento voluntário das obrigações fiscais. As notificações eletrónicas são um serviço distinto, que visa substituir a notificação ou a citação através de carta (em suporte de papel). O Código Geral Tributário, no nº 7 do artigo 72º, e o Código de Execução Tributária, no nº 8 do artigo 23º, conferem eficácia jurídica às notificações e citações efetuadas por via eletrónica, que se encontra regulamentada no Decreto-Lei 19/2015, de 19 Março. A data relevante para efeitos de contagem dos prazos é a data em que o contribuinte acede à Caixa Postal Eletrónica (CPE). Em caso de ausência no acesso à sua CPE, a notificação considera-se efetuada no 30º dia posterior ao seu envio, e a citação considera-se efetuada no 60º dia. Somente a DNRE está autorizada a depositar comunicações na CPE do contribuinte.
Qual foi o resultado dessas ações?
O Sistema Integrado de Segurança e Eficiência Fiscal (SISEF) instaurou, de Outubro de 2018 a Fevereiro de 2019, 239.854 processos de contraordenação e execução fiscal, dos quais só conseguimos notificar 3.200. O sistema de notificação eletrónica permitirá notificar todos os contribuintes em todos esses processos, com elevada rapidez, o que aumenta substancialmente a eficácia da DNRE.Neste momento, temos 14.686 contribuintes com a CPE ativa, o que representa 61% do universo de contribuintes alvos destes processos. Significa que num intervalo de uma semana teremos conseguido notificar de forma eletrónica 146.310 processos. Isto representa um salto qualitativo, não apenas no quesito tempo do processo, como também na poupança de custos administrativos (tinta, papel, deslocações, entre outros), pois cada processo tem em média 2 folhas. É um ganho enorme para o país.
Que outras atividades conexas tem a DNRE programada para 2019?
Como referimos, a DNRE está num processo de desmaterialização dos processos de sancionamento dos incumpridores e execução das dívidas correspondentes, tendo avançado numa primeira fase com o IVA e a Retenção na Fonte que representam cerca de 59,8% da receita do Estado em 2018. O objetivo é alargar este processo às restantes obrigações, nomeadamente Mod. 107, Mod. 112, Mod. 1B, DAICF, Pagamento Fracionado, TEU, IRPS e IRPC, ainda em 2019.No plano de atividades deste ano, está também contemplado um sistema de inspeção que irá fazer a deteção automática das incongruências entre as declarações dos contribuintes, fazer liquidações adicionais e notificar os contribuintes através da notificação eletrónica. As liquidações oficiosas também estão previstas neste sistema.Mas o mais importante é que a DNRE passou a prestar um serviço de apoio aos contribuintes, informando-os antecipadamente das obrigações fiscais que têm a cumprir. Este serviço é muito importante para que eles evitem entrar em incumprimento e suportem os elevados custos que daí derivam.
Qual é o grau da cidadania fiscal em Cabo Verde?
A educação tem e sempre terá um papel fundamental na formação do tipo de cidadãos que em cada época a nação precisa, adaptando o seu perfil de acordo com a formação técnica, comportamental e cívica que recebe. Assim, em Cabo Verde para termos cidadãos que exercem a sua cidadania fiscal, de forma eticamente responsável, precisamos todos de fazer um forte trabalho neste sentido. A DNRE tem dado alguns passos, nomeadamente através do Serviço de Atendimento e Cidadania Fiscal (SACF) que, por um lado, tem promovido algumas campanhas educativas e de sensibilização sobre a importância dos impostos, a importância de exigência e emissão da Fatura, entre outras. Por outro lado, algumas ações foram, também, realizadas nas escolas, de forma a despertar muito cedo nos alunos, noções básicas sobre a importância dos impostos, como uma forma de contribuição solidária de todos para a coletividade. Enquadra-se, igualmente, nas ações de Educação Fiscal, a criação de oportunidades para os alunos conhecerem a nossa instituição, através da realização de visitas de estudo, como aconteceu há pouco tempo na Alfândega da Praia. É preciso que todos tenham a consciência que pagar os impostos é um dever fundamental, estabelecido na Constituição da República. O Estado só poderá cumprir as suas funções de garantir aos cidadãos a materialização dos direitos fundamentais, nomeadamente, o direito à saúde e à educação se todos contribuírem, pois “Quando toda a gente contribui, o país evolui”.
A DNRE cobrou, em 2018, mais 13% de receitas do que no mesmo período de 2017, conforme informações avançadas pela Diretora Nacional, Liza Vaz. A que se deve este aumento e quais as previsões para 2019?
A nível da DGCI (que é responsável pela gestão dos impostos internos), o aumento das receitas em 2018 em relação a 2017 foi de 19,4%; para a DGA, foi de 6,48%. O aumento da DGCI, que totalizou em 3.634 milhões de escudos, justifica-se pelo aumento da eficiência da DNRE, nomeadamente, intensificação na cobrança dos atrasados, automatização e desmaterialização do processo de contraordenação e execução fiscal, operações de impacto realizadas a nível de fiscalização nos principais polos económicos do país, inspeções mais focalizadas e especializadas. Ocorreram também encontros de contas com os contribuintes que eram simultaneamente devedores e credores do Estado. Para o ano de 2019, as metas apenas para a DGCI são de um aumento de 6,7% em comparação com o ano anterior; em termos absolutos estamos a falar de um aumento de 1.495 milhões de escudos, ou seja, um esforço inferior ao ano anterior, mas ainda assim exigente. Mas acreditamos que vamos alcançar os objetivos. A DNRE está focada no processo e muito comprometida com os seus objetivos.