Khyra Tavares lançou o seu primeiro single. Coisa normal. Contudo se o desmancharmos em pedaços – nas partes que fazem deste single um todo, iremos direitinhos ao que me referi no primeiro parágrafo do texto: conceito, musicalidade/ músicos de elevação e o carisma de uma voz e líder de palco que já tem estrada longa e experimentada.
A voz de Khyra já soa há alguns anos por entre variados palcos da Praia e do Mindelo. Já era nossa. Contudo o que todos esperávamos aconteceu: Khyra passa dos palcos para o registo discográfico. Começam então as tais componentes que vão colorindo este single – na verdade o início que certo e naturalmente virá.
Se Khyra nos vinha habituando aos repertórios de “covers” (sempre muito bem selecionados, onde a diferença marcava-se pela qualidade) típicos dos palcos de bares e festivais, neste vídeo despiu-se e vestiu a estrela que sempre nela existiu e que esperava para se soltar. Rapidamente viu que teria de estar em plano diferente – e como o conseguiu!
Mas vamos mais atrás.
Se Khyra tinha bem presente esse novo posicionamento musical, teria de ter as bases que sustentassem isso, exactamente para que tudo fosse coerente.
Comecemos pela escolha do tema. Brilhante a capacidade de escolha. Maior ainda o identificar de um tema que é claramente de um ontem-hoje. Terá Frank Cavaquim, tido na época algum tipo de contacto com o hoje?
Se instrumentalmente as sonoridades do “Pop-Ye Ye Ye” de “Fra Broque” de Frank já seriam bem actuais, a nova roupagem vestida de soul, funky e laivos do saudoso acid-jazz da década brilhante de 90-00 não lhe roubaram a actualidade do ontem, acrescentando-lhe porém a do hoje. Não haveria “Fra Brok” sem “Fra Broque”, mas teria de existir o “Fra Brok”…
Chapelada com lantejoulas para os arranjos de Khaly, e dos músicos envolvidos Ivan Medina e Vando Pereira. Feita a base, só restam as plumas e o tal “dirty-style” de uma voz que traz consigo uma tonalidade rara, agreste porém necessária e muito, muito acervo à mistura: pop-rock, funky, soul, bossa…tudo onde caiba alma.
Imagem-vídeo – a tal de que tanto dependem os músicos. Khyra e “crew”, não fizeram um vídeo, contaram um momento em momentos. Não há narrativa passada, mas a personagem e a música são explicadas-em-formato-partilha…
A (im)pureza do tema…explicitamente demostrada onde um selvagem urbano se cruza com o dia-a-dia doce de Mindelo é interessante.
Khyra definiu o seu estilo musical como: “ Capeverdean Kriol Fusion”…pés em Cabo Verde, misturas e fusões frescas e necessárias. Sim, nós gostamos Khyra!
Se o cartão-de-visita do álbum é este, abram-se pois as portas-cortinas do salão (seja ele de veludo ou pedra selvagem). Aguardamos.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1004 de 24 de Fevereiro de 2021.