Dizem que somos música. Sei que temo-la. E para onde nos viramos, há variedade.
Temos dez ilhas, nove nuances de crioulos e dez nuances da nossa música, partindo do princípio que as ondas e o vento de Santa Luzia também é música.
Se em Santa Luzia a música é feita pelo mar e pelo vento, há ilhas que ela vem da areia, vulcões, verdes, da chuva quando cai, de tambores ou violões, de cantos e cânticos, da vida e da morte, da sodad (… Ex saudade), do amor do sol pela lua e sempre do Mar…
Também podem vir das montanhas, como por exemplo a que vem de Santo Antão – a ilha onde o vento ecoa por entre as montanhas num misto de assobio e de uma a melodia “robústica” próprio das alturas das tais montanhas – produz sonoridade típica que se torna ainda mais especial pela musicalidade do sotaque do…kriolu…
Sim, não escapamos à música e ao kriolu.
Os últimos meses foram marcados pela saída de dois álbuns de músicos de Santo Antão, num período em que o festival Sete Sois Sete Luas escolheu para fazer um encontro de músicos Cabo-verdianos e da Reunião…na Ilha das Montanhas.
Parece que a música escolheu este mês para celebrar o kriolo pelos lados das montanhas.
Primeiro, o jovem Rodji laçou o single “Festa Criola”, que anunciava o seu EP – AIZA.
A musicalidade deste trabalho é claramente inspirada nas sonoridades da ilha de Santo Antão, que misturam as experiências musicais que o músico foi coleccionando pelos palcos do mundo. Entre a world-music e o Pop a fusão de sons torna própria a música de Rodji.
E rebuscando as misturas encantadas, mais uma: o nascimento da primeira filha – de seu nome AIZA – e do primeiro registo discográfico – de seu nome AIZA – o que deixa adivinhar momentos de bênção pessoal e musical que com certeza passará para todos. Música e vida num só momento.
Misturas que dão música.
Meio mês depois, também da mesma ilha, e até dos mesmos ventos e assobios, e certamente da mesma tradição, chega-nos Titita, com o seu primeiro single “Sofia” para anunciar também a chegada do seu primeiro trabalho a solo, uma vez que o músico durante mais de 10 anos fez parte do grupo Cordas d´Sol – também representado pela que foi a voz do grupo e que agora aparece como convidada de Titita neste tema – a forte voz de Ceuzany.
Por entre a letra com doses certas de humor e realidade, tradição e expressões típicas da ilha, o tema encanta não só pela pequena estória contada, como pela expressividade da voz de Titita, que também é o compositor. Uma voz que certamente se destacará pela sua força genuína e entrega ao que expressa na mensagem do que canta.
Musicalmente cuidado, a tradição é misturada com uma instrumentação que se encosta quase que a um blues-ilhéu com ambientes e guitarras que marcam numa direção musical de Hernâni Almeida.
Dois artistas para não perder o rasto-palco.
Que as ilhas continuem a parir música, que a kriolidadi continue a ser a essência, em letras kriolas e que os salpicos do Mar nos mostrem ao mundo…
Música, ilha e música.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1016 de 19 de Maio de 2021.