“O espólio está à espera há mais de 20 anos que os governos de Cabo Verde, os vários ministros da Cultura e várias câmaras municipais se decidam a reparar a casa do B.Léza, que é camarária, e façam lá o museu B.Léza, para se poder entregar o espólio, senão o espólio fica em Portugal ou vai para o Brasil”, disse à Lusa Veladimir Romano Calado da Cruz.
Em entrevista à agência Lusa, o filho de Francisco Xavier da Cruz, conhecido como B.Léza, que morreu em 1958 no Mindelo, na ilha cabo-verdiana de São Vicente, lamentou o desinteresse que alegadamente quem decide tem dado à memória do autor de mornas como Miss Perfumado, Eclipse ou Luísa.
“A casa ainda lá está, eu estive lá em 2008 e chamei a atenção da câmara municipal para que devia ser um património, um museu ou uma casa da música”, indicou Veladimir Romano Calado da Cruz.
Segundo afirmou, o espólio tem muitas peças, as suficientes para encher um museu, e inclui uma cama, baús, peças de porcelana, canetas, botões de punho e centenas de livros.
“Só livros são mais de 300, livros importantes, que o B.Léza herdou do pai, que era um revolucionário, um anarca, contramestre dos navios alemães”, contou.
Como o pai de B.Léza viajava muito, trazia com frequência artigos do estrangeiro e, por essa razão, o primeiro violão do compositor nem sequer foi um violão, era uma balalaica, que o pai lhe trouxe da Rússia, para onde viajava muito.
“Ele andava agarrado à balalaica quando ia para Santo Antão e tentava imitar as festas que se faziam, as tocatinas”, referiu.
Veladimir deixa o aviso: “Não vou entregar património a ninguém até alguém em Cabo Verde ter a inteligência suficiente e o patriotismo de dizer não, aquela casa do B.Léza vai virar museu, que venha o espólio”.
Para já, o filho mais velho de B.Leza, com 74 anos, está a organizar parte do espólio para mostras itinerantes nos municípios portugueses geminados com municípios de Cabo Verde, “para ver se aqueles em Cabo Verde conseguem despertar a memória e ver o que está aqui em Portugal”.
“Temos mais de 60 câmaras municipais geminadas com Cabo Verde, estou a contactar com algumas. É uma logística grande”, disse, classificando o espólio de B.Léza como “muito interessante”, tendo em conta que se trata de um artista multifacetado.
B.Léza escreveu “pedagogia ambiental no seu tempo. Só se fala do Jorge Barbosa e do seu Ambiente [publicado na Praia, Santiago, em 1941], mas o B.Léza também escreveu”, disse.
E exemplifica com o “Passo-pinto e o Passarão” – um conto infantil pedagógico-ambiental, da autoria de B.Léza e que contém críticas aos serviços camarários sobre a sujidade urbana do Mindelo – ou o romance infantil “Os meninos do Lombo”.
Entre o espólio consta o Bronze, o violão icónico do compositor, por ele pensado e desenhado e que conta com 90 anos de idade, mas ainda toca, após ter sido restaurado pelo guitarrista cabo-verdiano Armando Tito, que privou com B.Léza em criança.