Escritora madeirense traz “sorrisos” a Cabo Verde

PorSara Almeida,8 jun 2024 8:43

Foi amor à primeira vista. Quando Susana Gramilho visitou Cabo Verde pela primeira vez, há quase 10 anos, o arquipélago cativou-a de tal forma que logo se criou uma relação afectiva. Hoje é Cônsul Honorária de Cabo Verde na região autónoma da Madeira (Portugal), para além de Presidente da Associação de Promoção da Macaronésia naquele arquipélago. De passagem por Cabo Verde, para lançamento de um livro infantil e celebração do Dia da Criança, com distribuição dos donativos da campanha “Juntos por Sorrisos”, a Cônsul Honorária esteve em conversa com o Expresso das Ilhas para falar destes e outros projectos, que unem ilhéus de cá e de lá.

Em véspera do Dia da Criança, há música, lanches e risos na Escola do Ensino Básico de Ponta d’Água. Celebra-se a efeméride e o ponto alto é a distribuição de presentes aos cerca de 1300 alunos, entre os 6 e os 14 anos, da escola.

A iniciativa partiu de Susana Gramilho, uma madeirense há muito apaixonada por Cabo Verde, que lançou, em Janeiro, a campanha “Juntos por Sorrisos” com a qual angariou cerca de 25 toneladas de “brinquedos, roupas, livros infantis e material escolar”, tudo exclusivamente “para o dia das crianças”.

Do arquipélago da Madeira, os presentes viajaram para o arquipélago de Cabo Verde, num transporte garantido com o patrocínio do Grupo Sousa.

Já em solo cabo-verdiano, uma parceria estabelecida com a Cruz Vermelha de Cabo Verde, permitiu gerir a distribuição.

Neste dia 31 de Maio, depois de Ponta de Água, comitiva e mais prendas seguiram para o Jardim Infantil da Cruz Vermelha na Praia, onde 73 crianças foram presenteadas. No dia seguinte, 1 de Junho, Dia Mundial da Criança, foi a vez dos cerca de 1150 alunos da Escola do Ensino Básico Júlia da Costa, em Achada de São Filipe, receberem prendas, numa manhã marcada também por actividades lúdicas e criativas.

Cabe agora à Cruz Vermelha de Cabo Verde, “parceiro forte e incansável” continuar a gerir os resultados da campanha.

Finda esta sua estadia por terras de Cabo Verde, Susana partiu satisfeita. “As crianças estão felizes, os sorrisos estão nas crianças, vou de coração cheio”, disse.

Paixão por Cabo Verde

Ainda antes da sua primeira vinda a Cabo Verde já o país, do “pouco que conhecia dos meios de comunicação “, despertara a atenção e curiosidade de Susana Gramilho.

“Sentiauma quase necessidade de conhecer este país”, conta. Veio então, pela primeira vez em 2014 ou 2015, e desde então não parou de voltar.

“Essa ligação, ou essa vontade de conhecer Cabo Verde foi crescendo”, diz, contabilizando em quase uma dezena as vezes que por cá passou.

“Sou portuguesa, mas, como costumo dizer, que o meu coração é cabo-verdiano”, confessa, admitindo inclusive ter dificuldade de explicar racionalmente esta tão grande afeição. “Certamente, em alguma outra vida, já passei por aqui”, diz, meio a sério, meio a brincar.

O ponto de paragem tem sido sempre Santiago, que é, portanto, a ilha com a qual criou “mais raízes”, com excepção de uma passagem, no ano passado pela Boa Vista onde participou num Encontro Internacional de Parceiros. Pretende, no futuro, e quando surgir uma oportunidade conhecer as outras ilhas. “Sinto uma grande vontade e necessidade, enquanto representante deste magnífico arquipélago, de conhecer as outras ilhas”, confessa.

Cabo-verdianos na Madeira

Foi esta paixão por Cabo Verde que a levou a tomar uma iniciativa, há já alguns anos, que a aproximaria ainda mais deste arquipélago.

“Literalmente fui bater à porta da Embaixada [de Cabo Verde em Lisboa], apresentando essa minha grande vontade, que veio dessa minha ligação extraordinária que eu sinto com Cabo Verde”, de ser Cônsul Honorária e “representar este povo magnífico”, recorda.

A sua manifestação de interesse foi bem recebida, o processo andou – “é um processo que envolve alguma burocracia” – e no ano passado (2023) foi feita a nomeação oficial.

Foi nesse ano também que, como referido, viajou para a Boa Vista, para “entrega da carta-patente”, naquela que foi a sua primeira deslocação no cargo honorário.

Como Cônsul Honorária de Cabo Verde na Ilha da Madeira, Susana Gramilho tem tentado agregar todos os cabo-verdianos. “Juntos somos mais fortes”, diz.

Assim, de forma não protocolar, criou um grupo no Whatsapp onde se vão juntando os cabo-verdianos residentes naquele arquipélago português. Palavra passa palavra, neste momento são cerca de cem, mas Susana acredita que deverão haver muito mais residentes, embora não saiba quantos.

A ideia é continuar a expandir o grupo, criando sinergias para um maior apoio.

Quanto ao perfil dos cabo-verdianos que escolhem esse outro arquipélago para morar, Susana Gramilho começa por destacar que são “muito bem vistos e estão bem integrados”.

São considerados cidadão que migram “em busca de melhores condições de vida, e trabalham em prol disso”, e que são, ademais, “honestos, dedicados e empenhados.”

Com a sua função algo facilitada por causa dessa boa percepção, o objectivo da Cônsul Honorária é “obviamente, contribuir para que as coisas continuem” assim.

Aliás, Susana já recebeu inclusive pedidos de mão de obra cabo-verdiana, fruto dessa boa imagem junto aos madeirenses.

Quanto às áreas económicas onde se encontram mais cabo-verdianos, em primeiro surgem a hotelaria e a restauração, mas também há “um número na área das pescas” e, cada vez mais, também na agricultura.

Macaronésia

Susana Gramilho é professora do primeiro ciclo, desde 2002 e tem trabalhado em projectos de promoção do sucesso escolar. Faz também gestão de mercado imobiliário, é escritora, cônsul honorária e é ainda, por último, presidente da Associação de Promoção da Macaronésia da Madeira.

Esta é uma das três Associações já constituídas, nos quatro arquipélagos que constituem a região insular, faltando apenas os Açores para completar o cenário. Quando esse outro arquipélago, português, tiver a sua Associação homologa, a ideia é criar uma confederação de associações.

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Manuela Andrade e Susana Gramilho, vice-presidente e presidente da APMM, respectivamente

“Uma confederação já nos irá atribuir certamente uma figura jurídica de maior presença”, avança.

Entretanto, a Associação de Promoção da Macaronésia de Cabo Verde, já foi criada, lembra Susana, e tem neste momento como presidente o antigo ministro Vítor Borges.

Pretende-se com estas Associações promover, todas as componentes que formam a Macaronésia.

“O conceito de Macaronésia, que surgiu muito na base da biodiversidade comum, que nos une, mas eu acredito que a Macaronésia é muito mais do que a simples biodiversidade. Nós, enquanto quatro pilares de um Atlântico, Madeira, Cabo Verde, Açores e Canárias, em vez de sermos olhados como um copo meio vazio, porque somos insulares e deparamo-nos com muitas dificuldades perante essa insularidade, devemos ser olhados como um copo meio cheio, e acredito que muito pode advir de bom para todos os arquipélagos, inclusive para Cabo Verde, a partir da Macaronésia”, explica.

A Associação tem assim um objectivo generalista, que visa promover várias vertentes, da natural, à cultural, passando pela educativa, mas também pela económica e empresarial.

“Enquanto quatro arquipélagos do Atlântico, temos certamente muitas oportunidades de desenvolvimento estando mais próximos e temos de valorizar este nosso posicionamento em prol de outros benefícios bem maiores”, observa, confessando que um dos seus objectivos é ver instituído o Dia Mundial da Macaronésia.

1 Festival e 1 Livro

Entre as actividades da Associação, e fazendo a ponte com o seu cargo honorário, foi organizado, por iniciativa da própria Susana Gramilho, um Festival Cultural de Cabo Verde na Ilha da Madeira, que arrancou no mês de Abril e com encerramento no dia 8 de Junho.

Durante estes dois meses, várias manifestações artísticas, das artes plásticas à literatura, mas também música e cinema, passaram pelo Festival.

A gastronomia não poderia deixar de estar presente. E entre os vários momentos Susana destaca “um momento pedagógico muito bonito em que as crianças, depois de visitarem a exposição patente, pintaram uma tela ao som da morna”. Destaca também o lançamento de um livro infantil da autoria da escritora cabo-verdiana Manuela Vieira, residente na Ilha da Madeira. E “como cereja no topo do bolo deste festival”, foi ontem, 4 de Junho, exibido o documentário da Cesária Évora no Teatro Municipal do Funchal.

O Festival, avança, contou com o apoio da Embaixada de Cabo Verde em Lisboa, do Centro Cultural de Cabo Verde, também em Lisboa, e da Secretaria Regional de Turismo e Cultura na região autónoma da Madeira.

Enquanto isso decorria, no outro lado da Macaronésia, deste lado, era também lançado, a 31 de Maio (ver edição 1174 do EI) o livro infantil “Macaronésia Trocada por Miúdos”, da autoria de Susana.

Um livro, que conforme a autora, “é exactamente como diz o nome. É explicar de uma forma muito simples, muito acessível às crianças, o que é a Macaronésia, para que tenham uma noção simples do que é. Parece uma palavra até um pouco difícil de pronunciar, mas que eles, crianças, que serão os homens do dia de amanhã, tenham noção do que é e que plantemos essa semente, para que o conceito de Macaronésia possa crescer cada vez mais e de forma saudável e empenhada”, narra.

Feito este primeiro lançamento, passa-se o pleonasmo, em Cabo Verde, o livro, “obviamente” irá ser também apresentado nos restantes arquipélagos

“Já estou a tratar, mas ainda não tenho datas marcadas”, avança.

Nas Canárias será lançada uma versão em espanhol, que aliás já está a ser tratada pela editora, 7.ª Dimensão.

Entretanto, a nível de ilustrações, cuja responsabilidade esteve a cargo de Roberto Macedo Alves, da editora 7.ª Dimensão, a obra é também muito apelativa e a escritora mostra-se satisfeita. “Modéstia à parte, eu acho que está incrível. Ele conseguiu passar para o papel tudo aquilo que me ia na alma e no coração, e eu estou extremamente feliz com o resultado final”.

E assim se promove um pouco mais a Macaronésia, começando por Cabo Verde, e unindo estes quatro pilares do Atlântico…

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“A Macaronésia trocada por miúdos”

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Susana Gramilho lançou, no passado dia 31 de Maio, em Cabo Verde, o seu livro infantil “A Macaronésia trocada por miúdos”, com apresentação de Natacha Magalhães. O livro, que visa explicar a Macaronésia às crianças através de imagens, explora os quatro arquipélagos que compõem a região (Cabo Verde, Madeira, Açores e Canárias) e destaca a importância da biodiversidade e preservação. Publicado pela editora Sétima Dimensão, a obra conta com ilustrações de artistas coordenados por Roberto Macedo Alves e apoio da Câmara Municipal do Funchal.  

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1175 de 5 de Junho de 2024.

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Autoria:Sara Almeida,8 jun 2024 8:43

Editado porJorge Montezinho  em  9 jun 2024 9:56

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