Mindelo recebe por estes dias a primeira edição da Globe40, uma regata da classe 40 (até 12,19 metros), organizada pela Sirius Events. A Baía do Porto Grande é porto de abrigo dos seis veleiros participantes, marcando o primeiro stop over de uma prova que vai dar a volta ao mundo até Março do próximo ano, combinando performance desportiva, aventura, promoção e sensibilização para a protecção dos mares.
Manfred Ramspacher, da Sirius, lembra que os preparativos começaram há três anos, após o anúncio oficial, em Junho de 2019. A pandemia acabou por baralhar as contas e atrasar a concretização.
“Há dois eventos náuticos internacionais que já têm uma grande historia, mais de 30 e 40 anos. Um evento francês, Vendée Globe, uma volta ao mundo em solitário, com barcos de 60 pés, que tem imenso sucesso. O segundo é a Ocean Race, que é uma volta ao mundo com etapas e tripulações, em barcos de 60 a 70 pés”, lembra.
“Os barcos de 40 pés são mais acessíveis, em termos financeiros, para amadores competentes que já fizeram várias travessias oceânicas. Também são mais acessíveis desportivamente. Os barcos são bons, mas são menos duros, fisicamente, do que os barcos da Ocean Race, que necessitam de tripulações de oito pessoas”, acrescenta.
Tanto a Vendée Globe, como a Ocean Race, são pensadas para velejadores profissionais. Ao invés, a Globe40 está aberta a amadores experientes. O carácter inédito da regata é reforçado pelo facto de esta ser a primeira a ter partida offshore em África.
A prova começou a 26 de Junho, da Baía de Tânger, estreito de Gibraltar. A primeira etapa ligou Marrocos a Cabo Verde, via Madeira e Canárias. A tripulação japonesa do veleiro Milai, Masa Suzuki e Koji Nakagawa, percorreu as 1.884 milhas em 7 dias, 2 horas e 25 minutos, à velocidade média de 11,06 nós.
“Foram mais ou menos 4 mil quilómetros. Foi uma oportunidade para as tripulações subirem a potência, afinarem os barcos, afinarem as coisas. Foi um grande sucesso, porque as condições foram muito boas e ainda bem, porque a segunda etapa, que vai ser a maior etapa desta volta, será de sete mil milhas, mais ou menos 14 mil quilómetros”, avalia Manfred Ramspacher, lembrando que o anticiclone de Santa Helena obrigará a frota a aproximar-se da costa brasileira, rumando depois a sul do cabo da Boa Esperança, para então subir às Maurícias.
Cabo Verde surge na rota da Globe 40 com a vontade de fazer diferente, “uma etapa que nunca foi feita”, nas palavras do promotor. “Cabo Verde é um destino cada vez mais lógico”, acredita Ramspacher.
Divulgar o potencial
Mindelo é, desde há muito, ponto de passagem e paragem de velejadores, para alguns dias de descanso ou reparação de avarias, mas a Globe40, agora, e a Ocean Race, a médio prazo, sugerem uma mudança de perfil, com a expectativa de maior dinamização da economia local e aumento da exposição mediática.
“A Globe40 não é apenas uma regata de competição. O lado desportivo existe, obviamente, mas também tem a vontade de descobrir os países e cada etapa vai ser objecto de uma reportagem de 26 minutos, um terço sobre a regata e dois terços sobre o país”, refere o CEO da Sirius Events.
“A Polinésia Francesa e Cabo Verde têm 99% de água do mar, então, têm problemas idênticos. A Globe40 quer fazer esta ligação e fazer descobrir um país que não é apenas um país turístico, com água quente e capacidade hoteleira”, garante.
Porque facilitam a chegada de peças e staff de forma rápida, as ligações aéreas directas a Lisboa são uma vantagem competitiva de São Vicente.
“Do ponto de vista da logística, não é nada mau. Obviamente que nenhum local é totalmente perfeito, mas para um evento da nossa dimensão é bastante bom”, analisa Manfred.
A criação de um estaleiro naval especializado em veleiros ou a adequação da Cabnave para embarcações do tipo são melhorias possíveis.
“Concordamos sobre o facto de que São Vicente, em especial, tem todas as qualidades para receber uma etapa recorrente da Globe40. Há vários tipos de etapas, etapas em grandes cidades e há etapas de charme, como Mindelo. São pequenas cidades que têm todas as qualidades, exotismo e capacidades de acolhimento. Para nós é uma boa hipótese repetirmos aqui, nas próximas edições, a nossa estada em Cabo Verde”, antecipa.
As potencialidades de Cabo Verde, e da ilha do Monte Cara em particular, para acolher corridas offshore – eventos oceânicos de longa distância – são corroboradas por Joe Harris, um dos skippers da Globe40.
“Absolutamente. Consigo imaginar muitas corridas a quererem vir a Cabo Verde. Penso que toda a gente está a ter uma óptima experiência. Uma coisa que acho que o país precisa é de um equipamento para tirar os navios da água, no caso de teres um problema abaixo da linha da água. É algo que qualquer porto que queira receber grandes corridas deve ter”, comenta.
Também Micah Davis, skipper do Amhas, está empolgado com a passagem pelo Mindelo.
“Tivemos um final [de etapa] excitante, à noite. Estamos muito contentes por estar no Mindelo. Estamos a adorar. As pessoas são fantásticas, a comida é maravilhosa, a música é incrível, o tempo é muito bom. É fantástico velejar barcos assim com ventos alísios. É um destino perfeito para corridas offshore”, assegura.
Depois de São Vicente, por onde fica até dia 17, a regata visitará Maurícias, Auckland (Nova Zelândia), Taiti (Polinésia Francesa), Ushuaia (Argentina), Recife (Brasil), Granada (Espanha) e por fim Lorient (França), onde deverá chegar em Março do próximo ano.
*com Lourdes Fortes
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1076 de 13 de Julho de 2022.