O adiamento da cobrança de vistos de curta duração surge a pedido dos operadores que vendem os pacotes turísticos para Cabo Verde, explicou ao Expresso das Ilhas o ministro da Administração Interna, Paulo Rocha. “A decisão de isenção de vistos ocorrerá por via de Resolução do Conselho de Ministros e se materializará a partir do próximo mês de Maio, a pedido dos operadores turísticos, uma vez que a época turística se inicia nessa altura”.
A lei 19/IX/2017, que estabelece a isenção de vistos “para períodos de estada de curta duração, até ao máximo de 30 (trinta) dias” foi publicada no Boletim Oficial em Dezembro do ano passado entrou, como diz o próprio texto, em vigor a 1 de Janeiro de 2018 e suscitou críticas vindas de vários sectores.
Victor Fidalgo foi dos primeiros a criticar a medida anunciada pelo governo. “Seria bom para Cabo Verde que essa proposta de lei não avançasse. Repare, o governo está a ver esta problemática de forma errada”, afirmou Fidalgo numa entrevista ao Expresso das Ilhas. “Já não estamos nos anos 80, onde o número de estrangeiros que entrava em Cabo Verde andava à volta de 20 mil, 30 mil, era uma coisa marginal e o turismo não estava na ordem do dia da agenda económica do governo, ou seja, não fazia parte das preocupações fundamentais. A partir dos anos 90, com mudanças fundamentais de vários paradigmas, nomeadamente no domínio económico, o turismo começou a merecer a atenção e tornou-se mesmo no sector que oferecia melhores perspectivas de crescimento. A partir de 2000, claramente, transformou-se no motor da nossa economia. Em 2016 recebemos 598 mil turistas estrangeiros [números do Banco de Cabo Verde e do INE], portanto, já não estamos a falar da simples passagem de estrangeiros, é uma questão económica, são pessoas que vêm para passar 5, 7 ou 10 dias, numa certa localidade”.
Também José Maria Neves criticou esta medida. Para o antigo primeiro-ministro, desde o início das negociações para a Parceria Especial entre Cabo Verde e União Europeia “ficou muito claro, desde a hora zero, que a Parceria só faria sentido se Cabo Verde estivesse devidamente ancorado na CEDEAO. Aliás, a importância geoestratégica de Cabo Verde passa pela sua inserção activa na região oeste africana. Esta é a pedra basilar do nosso relacionamento com a Europa e o Mundo”.
É com base nestas explicações que José Maria Neves entende como “uma medida absurda” a decisão do governo. “Nem os Europeus, eventualmente apanhados de surpresa, entenderão esta medida”, reforçava.
As declarações de Neves motivaram uma reacção por parte do governo. Na altura, Fernando Elísio Freire, ministro da Presidência do Conselho de Ministros rebateu as críticas de José Maria Neves. Segundo explicou Elísio Freire, o “que o Primeiro-ministro anunciou é que o governo está a trabalhar para conceder isenção de vistos a cidadãos da União Europeia. E nós, o que achamos absurdo, é que as pessoas não tenham compreendido o alcance e o quão estruturante ela é”.
O ministro adiantou igualmente que esta medida está incluída no acordo de parceria especial que vem sendo negociado há vários anos entre Cabo Verde e a União Europeia. “Esta é uma medida que faz parte do acordo de Parceria Especial, está dentro do pilar mobilidade, e trará para Cabo Verde vantagens enormes. A primeira é que o nosso país terá portos e aeroportos securizados e modernos. Permitirá ao país estar ligado a uma região e a uma economia dinâmica, mas isso reforça ainda a nossa posição a nível da CEDEAO e, em terceiro lugar, não haverá nenhuma quebra de receitas muito pelo contrário”.
Apoio internacional
Apesar de polémica a medida de isentar de vistos os cidadãos da União Europeia e do Reino Unido conseguiu apoios a nível internacional. Um dos apoiantes da medida foi Jaime Mayaki, vice-director do Programa Regional para África, da Organização Mundial de Turismo (OMT).
“O ‘visa free’ é uma oportunidade para qualquer país”, disse aquando da sua participação no IV Fórum Mundial de Desenvolvimento Económico Local que decorreu, no ano passado, na Praia. Mayaki acrescentou que tanto do seu ponto de vista pessoal como no da OMT, limitar o movimento das pessoas é negativo não só de um ponto de vista social e humano, como económico.
Na realidade, tudo o que contribua para facilitar a mobilidade – incluindo o visto electrónico – deve ser visto como um activo.
Por isso, e salvaguardando que a muito criticada questão da reciprocidade deve ser discutida a um nível político, do ponto de vista do turismo esta é uma “boa medida”, considerou.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 841 de 10 de Janeiro de 2017.