Parceiros apoiam Plano de Retoma do sector privado

PorAndre Amaral,5 mar 2022 8:15

Parceiros sociais e governo estiveram reunidos, na sexta-feira, 25 de Fevereiro, para mais uma ronda de negociações de concertação social. Plano de Retoma do sector privado e revisão do Código Laboral foram os temas em agenda. Parceiros sociais temem consequências que a guerra na Ucrânia pode trazer para Cabo Verde.

Governo e parceiros sociais estiveram reunidos na passada sexta-feira em sede de concertação social.

Após o encontro, o ministro das Finanças, Olavo Correia, referiu que houve “uma forte convergência de pontos vista” entre governo, patronato e sindicatos.

“Os conselheiros manifestaram todo o seu engajamento no sentido de Cabo Verde fazer uma retoma sustentável da economia, cujo Plano de Retoma foi bem avaliado e aprovado por unanimidade”, apontou o ministro num post no Facebook.

Segundo Olavo Correia, o Plano de Retoma para o sector privado cria condições para uma recuperação rápida “com apoio às empresas para se reinventarem, com agilidade, capacidade de inovação e proatividade”, num contexto, ainda de incertezas e “exigente em termos de políticas de crescimento sustentável”.

Os parceiros sociais, apontou ainda o ministro das Finanças, mostraram a sua determinação em “se adaptarem aos novos contextos para viabilizar as grandes linhas e orientações estratégicas sectoriais” nos domínios da transição energética, do turismo, da transformação da agricultura, da nova política industrial, do comércio, da economia azul, da económica digital e das indústrias criativas.

“Em termos de objectivos, esta concertação de forças visa sobretudo reforçar o clima de confiança dos agentes económicos e libertar o potencial de crescimento da economia com aceleração da transformação e diversificação da economia com foco na inclusão económica, financeira, social e digital para reduzir a pobreza e acelerar a promoção do trabalho digno e o empreendedorismo”, apontou Olavo Correia.

José Manuel Vaz, presidente da CCSL, em conversa com o Expresso das Ilhas defende que “esta última reunião do Conselho de Concertação Social, foi um encontro muito importante, uma reunião muito concorrida e participativa”.

O programa de retoma, defendeu este sindicalista, “é importante”, porque o governo, aquando do surgimento da COVID-19, “chamou os parceiros sociais para analisarmos e decidirmos os passos a serem dados e foi tomado um conjunto de medidas que vieram a ter reflexos positivos no combate à covid”. Assim, defendeu José Manuel Vaz, o governo voltou a chamar os parceiros para apresentar o programa de retoma “o que é muito importante, porque o governo sempre teve em conta os parceiros sociais. Por isso, demos o nosso apoio ao programa e sugerimos algumas ideias para a sua melhoria”.

Também a secretária-geral da UNTC-CS, Joaquina Almeida, se mostrou favorável ao plano de retoma apresentado pelo governo.

“A UNTC-CS aprovou e apoia o plano de retoma do sector privado”, disse Joaquina Almeida ao Expresso das Ilhas.

Segundo esta dirigente sindical, a UNTC-CS tem “todo o interesse em que o sector privado esteja forte e robusto, porque com isso os trabalhares saem a ganhar”.

No entanto, Joaquina Almeida não deixa de destacar aquele que acha que é um ponto que causa estranheza à central sindical que dirige. “A única parte negativa é que o plano de retoma não é inclusivo e aí é que colocamos um ponto de interrogação”, diz.

“Cabo Verde tem um universo de dez mil empresas de todas as dimensões. Como é que o governo, dessas dez mil empresas, vai beneficiar apenas 633? Isso significa que ficam para trás mais de 9 mil empresas”, acusa.

“O governo deve criar condições para que os privados, todos sem excepção, tenham acesso ao crédito em condições favoráveis e o governo deve conceder algumas facilidades fiscais aos privados nesta fase de retoma”, acrescenta.

Do lado do patronato Jorge Maurício, presidente da Câmara de Comércio de Barlavento, também concorda que a reunião acabou com resultados positivos.

“Todos os parceiros estiveram de acordo com os pontos que foram apresentados, principalmente com a necessidade de discutir o plano de retoma em sede de concertação social”, referiu em declarações ao Expresso das Ilhas.

“É necessário retomar actividade e o plano ajuda nesse aspecto com financiamento tanto de tesouraria como de investimento”, defende Jorge Maurício.

Agora, com a retoma da economia em vista, é tempo de pensar na diversificação da economia nacional, defende o presidente da Câmara de Comércio do Barlavento. “A retoma de actividade não pode ser feita só com as actividades que já existiam antes. E aqui temos de falar em áreas como a aquacultura e pesca à escala industrial, reactivar o sector imobiliário, uma agricultura de escala industrial para abastecer não só os mercados turísticos, mas também a exportação. Temos de pensar numa lógica de mercado internacional e de internacionalização dos nossos investimentos. Há também a questão da indústria ligeira que teria como objectivo diminuir o peso das nossas importações”, referiu.

Para que esta retoma se torne uma realidade é necessário que o sector bancário assuma um papel preponderante, disse Jorge Maurício.

“Num período pós-moratória é preciso manter as taxas de juro que foram Contratualizadas. Os bancos comerciais devem ter um papel activo para viabilizar aquilo que chamamos de bureau de crédito, que é importantíssimo e que tem o objectivo muito claro de produzir relatórios com todas as informações necessárias para formalizar o investimento e a análise de crédito”.

Revisão do Código Laboral

Outro ponto que foi discutido na reunião de sexta-feira foi a possibilidade de uma revisão do Código Laboral.

No encontro entre o governo e os parceiros sociais foi apresentado um estudo, realizado por consultores externos, que faz o “Diagnóstico profundo da Aplicação do Código Laboral de Cabo Verde, desde a sua Aprovação até ao Momento de Revisão”.

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“Para sua aprovação, o Conselho vai voltar a reunir-se no prazo de dois meses, sendo certo o consenso sobre a contribuição positiva que o Código Laboral tem dado para o desenvolvimento da economia, mas também a necessidade de ajustamentos pontuais relativos sobretudo aos direitos e garantias dos trabalhadores face a situações de redução do mercado de trabalho”, apontou Olavo Correia, que anunciou ainda que está prevista a assinatura do acordo de Concertação Estratégica de 2021/2026, “através do qual os parceiros sociais pretendem dotar o país de mecanismos mais eficazes para a gestão dos efeitos da pandemia e das novas tensões económicas e sociais que ameaçam a estabilidade de Cabo Verde”.

Para a UNTC-CS, a “concertação social tinha recomendado, em 2017, que o governo antes de alterar ou flexibilizar a legislação laboral deveria mandar fazer um estudo e teria de ser a concertação social a analisar e a decidir. Foi-nos apresentado esse estudo e a conclusão e recomendação do estudo é que não se deve proceder, nos próximos anos, a qualquer alteração”.

Já a CCSL aponta que a revisão do Código Laboral “é um aspecto que tem preocupado a nossa central sindical. Normalmente, quando se levam para o Conselho de Concertação Social propostas que têm a ver com o Código Laboral pensa-se logo no corte ou retirada de direitos dos trabalhadores”.

Reconhecendo que a central sindical que lidera foi para esta reunião “com um pouco de desconfiança”, José Manuel Vaz disse ter ficado satisfeito por o estudo apontar “que não há necessidade de alteração profunda do Código. Poderá haver sim uma alteração pontual”.

Já do lado do patronato a visão é diferente.

“É preciso termos um código com objectivos diferentes”, disse Jorge Maurício, recordando que nas versões anteriores da legislação laboral “a grande preocupação do Código Laboral era preservar, garantir os empregos”.

Mas agora, defende este representante das entidades patronais, “temos de ter a perspectiva clara de ter um código facilitador para promover novos empregos, para promover a criação de novas empresas e novos investimentos”.

Se isso não acontecer, explicou ao Expresso das Ilhas, “se não tivermos um Código Laboral com esta perspectiva promotora de negócios, mais empregos, novos empregos, mais economia digital, nunca sairemos do ciclo de criação de emprego que nós temos actualmente”.

Jorge Maurício defende que Cabo Verde está integrado “num novo mundo, numa nova ordem económica e social e nós entendemos que é necessário um Código Laboral mais promotor do negócio e mais facilitador das relações laborais entre o patronato e os trabalhadores”, sem descurar, assegurou, “a manutenção do emprego e a salvaguarda dos interesses dos trabalhadores, porque isso também não pode estar em causa. Mas podemos fazem mais e melhor”.

Impactos da guerra na Ucrânia

Questionados sobre os impactos que a guerra na Ucrânia pode ter na economia nacional, os três paceiros sociais defendem que Cabo Verde está numa posição fragilizada.

“Quando a economia mundial tem uma pequena constipação a economia cabo-verdiana adoece de forma grave, porque nós somos um país importador”, diz Jorge Maurício.

“90 ou 95% do que consumimos é importado. Por isso, toda a inflação de fora é importada para cá”, reforça.

Os primeiros impactos já se fazem mesmo sentir “a nível dos preços dos combustíveis, vamos sentir a nível dos preços dos cereais, uma vez que mais de 70% dos cereais que consumimos em Cabo Verde são importados da Rússia”.

“Ainda não podemos dizer qual vai ser esse impacto, mas vai haver com certeza subida de preços dos combustíveis, dos cereais, dos transportes e, com isto, vai haver mais inflação. Com mais inflação é natural que haja subida das taxas de juro e por arrasto o dinheiro fica mais caro, o que torna mais difícil fazer investimentos. Poderá haver contracção da economia. Não estamos a viver tempos fáceis”, apontou.

Também o presidente da CCSL comentou a situação que se vive no Leste da Europa. “Nós estamos a analisar e a acompanhar com preocupação a situação [da Ucrânia] que tem os seus efeitos directos e indirectos no nosso país, que é bastante pequeno, frágil, dependente dos apoios, ajudas e da economia internacional”.

Para a CCSL a guerra na Ucrânia “é algo que, de facto, nos preocupa a todos e devemos acompanhar com serenidade”.

Joaquina Almeida, secretária-geral da UNTC-CS, refere que Cabo Verde, estando “num mundo globalizado”, sente qualquer “alteração a nível internacional”.

“Eu não sei se a mudança de preço que houve nos combustíveis já é o início da crise que vamos sentir. Mas estamos conscientes que as coisas poderão ficar muito mais difíceis em termos económicos e financeiros, porque não sabemos se esta guerra irá parar ou se se irá intensificar. Estamos preocupados, porque Cabo Verde irá sentir todo e qualquer impacto que vier. Estamos preocupados e a classe laboral irá sofrer consequências”, concluiu. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1057 de 2 de Março de 2022.

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Autoria:Andre Amaral,5 mar 2022 8:15

Editado porA Redacção  em  5 mar 2022 17:40

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