Segundo o estudo "Covid-19 na África: um caminho difícil para a recuperação", mais de 50% das crianças nascidas em África não tem existência legal por falta de registo, serviços que foram perturbados ou interrompidos durante a pandemia.
Estimativas dos autores indicam que o número ultrapassará 100 milhões de crianças sem registo até 2030 se não houver investimento neste serviço público.
Actualmente, o registo de nascimento é gratuito em apenas quatro dos 24 países da África Ocidental e Central, pelo que os custos podem desincentivar o seu uso e prejudicar a campanha de vacinação contra a covid-19.
Sem registo civil, os cidadãos não têm documentos de identificação nem acesso aos serviços de saúde públicos, o que, por consequência, pode inviabilizar o acesso à imunização.
Na África do Sul, estima-se que 15,3 milhões de pessoas não estejam registadas oficialmente, o que pode excluir quase 30% da população da vacinação, indica o estudo.
Por outro lado, apenas oito países (Argélia, Cabo Verde, Egipto, Maurícias, São Tomé e Príncipe, Seicheles, África do Sul e Tunísia) têm um sistema universal de registo de óbitos.
O estudo cita a Organização Mundial de Saúde, que estima que o número de casos de infecção e mortes associadas à covid-19 no continente estão bastante acima do que é notificado oficialmente.
A insuficiência nos registos civis tem impacto nas medidas e políticas para controlar a pandemia ou avaliar os resultados, avisam os autores.
"Enquanto não houver dados relevantes e robustos, é muito difícil definir uma política pública e avaliar se ela está a ir na direcção certa. É por isso que criámos o Índice Ibrahim de Governação Africana e temos defendido constantemente no últimos 10 anos o investimento nos sistemas de registo civil", afirmou a directora executiva da Fundação Mo Ibrahim, Nathalie Delapalme.
Cabo Verde é o país africano com melhor desempenho nesta área, tendo Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Angola e Guiné Equatorial registado melhorias desde 2010.
O estudo "Covid-19 na África: um caminho difícil para a recuperação" consiste numa análise da Fundação dos dados do Índice Ibrahim de Governação Africana (IIAG) nas áreas da saúde, sociedade e economia.
Cuidados de saúde mais acessíveis, maior preparação para futuras pandemias, investimento na educação e sistemas de apoio social, combate à discriminação de género, promoção da liberdade de imprensa e do acesso à Internet, alargamento das redes eléctricas e infra-estruturas de transporte no continente são os desafios identificados.
Os autores avaliam o desempenho de cada país africano na última década para assinalar os problemas e fazer sugestões sobre onde os governos devem concentrar os esforços na recuperação da pandemia de covid-19.
"O impacto da covid-19 trouxe à tona um espectro de desafios complexos de governação que as nações africanas enfrentam", vincou o presidente da Fundação, o empresário e filantropo sudanês Mo Ibrahim, que espera que o estudo ajude políticos, sector privado e sociedade civil a "colocar África de volta no caminho da recuperação".