Na cimeira do Mercosul, em que hoje participarão os chefes de Estado do bloco sul-americano, estas deverão ser algumas das posições defendidas, já indiciadas nos discursos dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos países-membros na segunda-feira.
"As tentativas de relançar o Mercosul têm alcances limitados nos quais convergem tanto situações económicas, globais e regionais, quanto convergências e divergências ideológicas. Enquanto o Mercosul não conseguiu avanços em outras negociações extrarregionais, a União Europeia não conseguiu superar as objeções de países como França e Irlanda", disse à Lusa o analista internacional argentino Rosendo Fraga.
"Com protecionismos de um lado e de outro, são poucas as possibilidades de avanço no acordo comercial Mercosul-União Europeia", observou.
Nas reuniões prévias à Cimeira, os discursos dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos países membros do Mercosul, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai mostraram as diferenças.
A Argentina, que transmite hoje a Presidência semestral ao bloco ao Brasil, apontou assimetrias que desatualizam o acordo fechado em Junho de 2019, mas nunca ratificado dos dois lados do Atlântico.
O acordo foi fechado quando Brasil e Argentina tinham governos de direita, favoráveis ao comércio livre, postura que mudou em Dezembro de 2019 na Argentina e em Janeiro de 2023 no Brasil. Paraguai e Uruguai são ainda governados pela direita e não têm indústrias a serem protegidas.
"O acordo Mercosul-União Europeia, tal como foi fechado em 2019, reflete um esforço desigual entre os blocos assimétricos e não responde ao cenário internacional actual", criticou o chanceler argentino, Santiago Cafiero, ilustrando a assimetria.
"O Mercosul acaba com tarifas para 95% das exportações europeias de bens agrícolas, enquanto a União Europeia só acaba para 82% das suas importações agrícolas de países do Mercosul e, para a maior parte do restante, oferece apenas cotas ou preferências fixas", comparou.
Para o ministro argentino, "as novas condições em matéria ambiental" por parte da Europa são "impossíveis de serem cumpridas".
De qualquer forma, Santiago Cafiero valorizou o vínculo entre o Mercosul e a União Europeia como "um sinal político necessário num contexto internacional de conflito e de incertezas crescentes" e que "o acordo pode funcionar para catalisar investimentos em setores estratégicos"
"Mas, para que tenha bons resultados, é necessário atualizar os textos", avisou.
O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, quem assume a Presidência temporária do bloco, foi mais pragmático, deixando as críticas do Brasil para o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quem discursa hoje no plenário do Mercosul.
"Acima de tudo, buscaremos fazer com que os acordos comerciais sejam benéficos para todos", prometeu Vieira em relação à Presidência brasileira do bloco até Dezembro.
"Pretendemos trabalhar intensamente com aqueles parceiros cujas negociações encontram-se em etapa avançada, como a União Europeia", apontou o ministro brasileiro, confirmando que "em alguns dias", o Brasil "pretende apresentar para exame de todos uma contraproposta de reação à carta adicional da União Europeia, com o intuito de destravar a negociação birregional".
A contraproposta à União Europeia será primeiro apresentada aos parceiros do Mercosul. Depois das considerações de Argentina, Paraguai e Uruguai, o texto comum será encaminhado à União Europeia. O objectivo é que seja apresentado antes da Cimeira da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC) e da União Europeia, em Bruxelas, nos próximos dias 17 e 18.
A Argentina tem preocupações com a competitividade de pequenas e médias empresas. O Brasil não aceita a possibilidade de sanções aos países que não cumprirem com as novas cláusulas ambientais. Nesse ponto, o Paraguai, em plena expansão da fronteira agrícola, acompanha o Brasil que também quer alterar o capítulo de compras governamentais que prejudica as empresas brasileiras.
O Uruguai questiona a paralisia do Mercosul: "em relação à União Europeia, ao terminar esta Presidência (argentina), constatamos que não tivemos nenhum avanço na negociação", criticou o ministro uruguaio, Francisco Bustillo.
"Dos 20 blocos de integração no mundo, o Mercosul é o que menos comércio exterior tem em relação ao seu Produto Interno Bruto. A relação exportações versus PIB é de 14,9% enquanto a média no mundo é de 33%. Na União Europeia, por exemplo, é de 51%", compara à Lusa o consultor argentino em negócios internacionais, Marcelo Elizondo, um dos maiores especialistas sobre Mercosul.