Lançada há mais de uma década pelo Presidente chinês, Xi Jinping, a campanha atingiu em 2024 um número recorde de 889.000 funcionários do regime, segundo dados divulgados pela Comissão Central de Inspeção e Disciplina - órgão máximo anticorrupção do Partido Comunista Chinês (PCC).
Este número representa um aumento de quase 50% em relação à média anual de cerca de 600.000 entre 2018 e 2023.
O 'think tank' Gavekal Dragonomics previu que o número continuará a crescer, destacando o alargamento do escrutínio a novos setores, como finanças, energia, saúde e infraestruturas, bem como para níveis mais baixos da administração pública, incluindo funcionários do PCC nas aldeias, além dos níveis provincial e municipal.
"O foco em mais sectores e mais funcionários vai resultar em mais casos - tendência que parece destinada a continuar", vaticinou.
A campanha anticorrupção foi lançada em 2012 e é hoje considerada a mais persistente e ampla na história da China comunista.
Um dos primeiros alvos foi o ex chefe da Segurança Zhou Yongkang, que outrora tutelou os tribunais, polícia e os serviços de informação, e acabou por ser punido com prisão perpétua, tornando-se no mais alto líder da China condenado por corrupção desde a fundação da República Popular, em 1949.
Da lista faz também parte Bo Xilai, estrela em ascensão da política chinesa que caiu em desgraça, num caso que envolveu o homicídio de um advogado britânico.
Altas patentes do exército -- só no ano passado dois ministros da Defesa foram colocados sob investigação -- e centenas de quadros de nível ministerial ou superior foram também expulsos do PCC e punidos com prisão perpétua ou pena de morte.
Em Janeiro passado, Xi advertiu que "a corrupção continua a aumentar" e é a "maior ameaça" para o regime.
"A campanha anticorrupção é a única forma de quebrar os ciclos de governação e caos, prosperidade e declínio", apontou.
A Gavekal Dragonomics advertiu para os efeitos de paralisia na burocracia chinesa, à medida que os funcionários evitam tomar decisões suscetíveis de os expor ao escrutínio.
Xi tem aludido a este problema, queixando-se do 'formalismo' e do 'burocratismo' no Governo.
Documentos do Comité Permanente do Politburo do PCC, a cúpula do poder na China, mencionam agora as "três distinções" para tranquilizar os funcionários de que não serão punidos por erros honestos, visando "incentivá-los a adoptar uma postura pioneira e a demonstrar iniciativa no trabalho".
Isto surge numa altura em que Pequim enceta um plano estratégico para dominar tecnologias emergentes, visando ultrapassar os Estados Unidos na corrida pela supremacia tecnológica.
"Os cautelosos fundos de investimento apoiados pelo Estado estão relutantes em investir em empresas tecnológicas de alto risco. Se os funcionários que gerem os fundos estatais ficarem mais preocupados com o facto de as perdas financeiras convidarem ao escrutínio, tornar-se-ão ainda mais conservadores nas suas decisões de investimento", apontou o grupo de reflexão.
Pequim adotou em 2024 um pacote de medidas de apoio ao sector imobiliário, mergulhado numa prolongada crise. Uma das medidas visa encorajar as autoridades locais a comprar aos promotores unidades habitacionais não vendidas.
"O risco é que os funcionários locais utilizem esta ferramenta com moderação para evitar o escrutínio posterior", notou a Gavekal Dragonomics.
"É possível que, ao dar prioridade política à estabilização do crescimento, o Governo central tenha dado aos funcionários de nível operacional o incentivo de que necessitam para agir. Mas também é possível que o receio [de serem punidos] se sobreponha a todos os outros fatores e que os funcionários locais não consigam, mais uma vez, apoiar a economia", acrescentou.