E agora, Brasil?

PorEurídice Monteiro,23 out 2018 6:30

1

​À sombra do ex-presidente Lula da Silva (ainda na prisão), e jogando na defensiva, o novo candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) à Presidência da República do Brasil, Fernando Haddad, teve dificuldade em descolar durante a primeira volta do seu voo inaugural da Prefeitura de São Paulo ao Palácio do Planalto em Brasília, ficando aquém dos prognósticos (29,28% dos votos). Com efeito, o candidato do Partido Social Liberal (PSL), Jair Bolsonaro, conseguiu obter vantagem através de uma estratégia de ataque direcionado aos opositores nas redes sociais e de aproveitamento do sentimento antipetista que tem sido propagado pelo Brasil. Só por pouco este não foi eleito à primeira, alcançando entretanto uma margem maior do que aquela que se poderia imaginar (46,03% dos votos).

A festa ainda não acabou. A luz não apagou, nem o povo sumiu. Contudo, a noite esfiou um pouco mais para o Partido dos Trabalhadores que tem pelas mãos a difícil tarefa de unir as forças do que apelida de campo democrático. O resultado do primeiro turno das eleições brasileiras deixou Jair Bolsonaro com mais fôlego para seguir a sua viagem presidencial e, por razões que o próprio PT bem conhece e que não tem conseguido desmontar, este candidato continua à frente e com grande hipótese de consagrar a vitória no segundo turno, marcado para o dia 28 de Outubro. É uma viagem turbulenta, pois nos anos recentes Brasil tem estado a um passo da instabilidade política e social generalizada, tanto por causa da perda de confiança política no PT que se viu envolto em casos de captura pela corrupção (inclusivamente do ex-presidente Lula), como devido à crescente manifestação popular de apoio a partidos da extrema-direita.

Realce-se que foi só a partir de Fernando Henrique Cardoso (FHC), 34° presidente brasileiro (1 de janeiro de 1995 a 1 de janeiro de 2003, Partido da Social Democracia Brasileira [PSDB]), que o Brasil experimentou um período de estabilização política, com os seus presidentes eleitos a conseguirem renovar o seu mandato, desempenhando a função presidencial durante dois mandatos consecutivos (4+4anos). Assim, o mandato do Presidente da República do Brasil passou a ser de quatro anos com direito a uma disputa pela reeleição (ao contrário de um mandato de 5 anos sem reeleição).

Para além de Fernando Henrique Cardoso e Juscelino Kubitschek, JK, (21° presidente brasileiro, entre 31 de janeiro de 1956 e 31 de janeiro de 1961, num mandato de cinco anos), também Luiz Inácio Lula da Silva (35° presidente brasileiro, entre 1 de janeiro de 2003 e 1 de janeiro de 2011, pelo Partido dos Trabalhadores [PT]) encontra-se na tão pequena lista de presidentes civis que conseguiram exercer a função presidencial até ao fim do termo, tendo somente FHC e Lula sido reeleitos para um segundo mandado.

A recente onda de turbulência atingiu tenuemente o sistema brasileiro em Junho de 2013, não tendo posto em causa a reeleição de Dilma Rousseff em Outubro de 2014, mas não permitiu que esta chegasse ao fim do seu segundo mandado. Assim, a 36ª presidenta brasileira (1 de janeiro de 2011 a 31 de Agosto de 2016, pelo Partido dos Trabalhadores [PT]) viu o seu mandato bruscamente interrompido por um processo de impeachment.

Desde a proclamação darepúblicaem 1889, o presidencialismo é o sistema de governo adoptado no Brasil (com excepção do período de 1961-1963, quando o parlamentarismo foi experimentado naquele país, durante o instável governo de João Goulart [Jango]). Durante a primeira república (1889-1930 [41 anos de duração]) havia uma estrutura oligárquica da política, dando lugar ao Estado Novo e à era de Getúlio Vargas (1930-1946 [16 anos de duração]), que começou com a revolução de 1930 e foi-se tornando ditatorial. A segunda república (1946-1964) foi bastante marcante na história política brasileira, com presidentes enigmáticos como Eurico Gaspar Dutra; Getúlio Vargas (novamente no comando enquanto 17° presidente brasileiro, entre 31 de janeiro de 1951 e 24 de agosto de 1954, quando suicidou na sequência das pressões políticas que vinham do atentado contra o jornalista Carlos Lacerda); Juscelino Kubitschek, com a sua agenda de modernização do Brasil, obras futuristas e a invenção da nova capital, em Brasília; Jânio Quadros; Ranieri Mazzilli; João Goulart (que foi vice-presidente de Juscelino e Jânio), 24° presidente brasileiro, e viria a ser deposto por um golpe militar de 1964, devido a medidas que preocuparam vários dos chefes militares, nomeadamente a diplomacia do não-alinhamento materializado através da manutenção de boas relações externas com os EUA (durante a era do presidente democrata John Kennedy) e uma certa cortesia aos comunistas da então União Soviética. Essa deriva esquerdista foi travada pelo Regime Militar, instalado entre 1 de abril de 1964 e 15 de março de 1985 (21 anos de duração, 25º-30º presidentes).

O retorno da democracia, em 1985, deu lugar a uma Nova República, com a eleição de Tancredo Neves (que contudo morreu antes da tomada de posse), o primeiro presidente pós-regime militar. Tinha sido eleito pelo voto indirecto, mas acabou por adoecer, morrendo na véspera de sua posse, permitindo o empossamento de José Sarney, 31° presidente brasileiro (15 de março de 1985 a 15 de março de 1990). Seguiu-lhe Fernando Collor, 32° presidente brasileiro (15 de março de 1990 a 29 de dezembro de 1992); Itamar Franco, 33° presidente brasileiro (29 de dezembro de 1992 a 1 de janeiro de 1995); Fernando Henrique Cardoso; Luiz Inácio Lula da Silva; Dilma Rousseff; Michel Temer. No dia 28 de Outubro, será a vez daquele país conhecer o seu 38° presidente.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 881 de 17 de Outubro de 2018.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Eurídice Monteiro,23 out 2018 6:30

Editado porNuno Andrade Ferreira  em  29 out 2018 16:21

1

pub.

pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.