Essas terão sido as razões que motivaram a Declaração de política de comunicações e informação do estado de Cabo Verde (Resolução n.º 13/2005 de 25 de abril) e a publicação do Decreto-legislativo n.º 7/2005, de 24 de novembro. O objetivo central a substituição do modelo de monopólio pelo da concorrência.
Foi instalado um regulador independente face ao poder político e às empresas do setor, e fixada a garantia da separação total e efetiva das funções de regulação das competências ligadas à propriedade.
Foi desencadeado um processo de negociações com a CV Telecom. Este processo, muito conturbado, teve início em 2005 e só em 2016 teve desfecho à vista com as partes a fixarem as linhas de entendimento possível. Isso porque, nessa altura, a PT já não detinha o controlo de gestão da CV Telecom.
A operadora histórica e incumbente, a CV Telecom, durante todo o tempo em que foi gerida e dominada pela Portugal Telecom, seu principal interlocutor, resistiu estoicamente à quebra do monopólio.
2. A regulação – seus efeitos e suas limitações
Os esforços do governo e da reguladora no sentido de realizar todas as iniciativas consequentes da liberalização do mercado das telecomunicações perduram há 14 anos. E é de justiça relevar o papel preponderante da ANAC neste processo.
A ANAC, criada efetivamente, em junho de 2006, acabou por fazer um trabalho relevante no sentido de atenuar os efeitos nefastos do regime monopolista do setor, dentro dos condicionalismos e das limitações existentes. Vale aqui destacar o constrangimento de peso e a maior falha estratégica do Estado de Cabo Verde neste percurso: a instalação de um regime de monopólio privado absolutamente solto no mercado e sem uma competente autoridade reguladora.
Esta autoridade surgiu 10 anos após a instalação do monopólio, quando o mercado das telecomunicações em Cabo Verde já era fortemente caracterizado pelo exercício de poder dominante da operadora histórica e incumbente, o Grupo CVT, conferido pelo controlo absoluto das infraestruturas de telecomunicações, essenciais e não replicáveis.
Ademais, a nascente reguladora, inexperiente, com parcos recursos humanos e financeiros e ténue conhecimento na matéria, lidava com uma CVT escudada e defendida pela Portugal Telecom, pujante no que respeita a recursos financeiros e humanos e com acesso fácil a consultorias internacionais de renome, quando se tratava de defender o monopólio. Isso tornava mais difícil a tarefa de regulação.
Estudos credíveis revelam que, empresas como a CVT, com um longo histórico de integração vertical e que possuem uma estrutura de integração vertical já “calcinada” são irrefutavelmente resistentes ao leque de decisões granulares que visam minimizar as preocupações em matéria de concorrência.
De todo o modo, a atividade reguladora possível e a entrada no mercado de outros operadores constituem fatores determinantes do salto qualitativo verificado no setor, caracterizado por uma baixa significativa de custos de acesso e por uma maior diversidade de serviços.
Todavia, os resultados estão longe de serem satisfatórios. O CONTRATO DE CONCESSÃO AINDA NÃO FOI NEGOCIADO.
1. As lições do processo e do percurso
A criação da CV Telecom a e sua privatização através da alienação de parte considerável do seu capital social foi uma medida positiva e de alcance estratégico. Com efeito, preconizava um desenvolvimento acelerado e de qualidade das telecomunicações, e permitia, por via do modelo de privatização adotado, uma participação acionista diversificada, de natureza individual e entidades/empresas públicas e privadas, nacionais e estrangeiras.
Foram tomadas fortes medidas de proteção do sector, considerado estratégico, nomeadamente mecanismos de resgate do controle da empresa, em última instância e caso necessário, destacando-se:
Ainda assim, acabou por efetivar a venda/transferência da participação que detinha na CVT à empresa brasileira - a Oi, à revelia da própria CVT e do estado.
Esteve bem o Estado de Cabo Verde ao alienar somente 40% da CVT e ao introduzir o acordo parassocial, um instrumento que veio a permitir, mais tarde, o resgate do controle da empresa, devido ao comportamento inadequado da PT.
A dependência técnica e tecnológica da PT, bloqueada por um contrato de assistência técnica, foi completamente nocivo para o desenvolvimento tecnológico da empresa e para os interesses do Estado pelas seguintes razões:
Resulta disso a atual precária capacidade do país em banda larga, apontada como um dos principais constrangimentos ao desenvolvimento das TIC e da economia;
De fato, nestes moldes, o contrato instaurou e manteve um regime muito vantajoso para a PT enquanto a CVT se viu inibida de aceder a qualquer outro provedor de serviço ou fornecedor equivalentes por um custo menor.
A concessão dos serviços públicos de telecomunicações, que se seguiu à privatização, foi uma medida de política certa e oportuna. Contudo, o regime de monopólio e o modelo adotados foram prejudiciais para o mercado e para o desenvolvimento do setor.
A constituição da República estipula que os poderes públicos devem garantir as condições de realização da democracia económica, assegurando, designadamente a igualdade de condições de estabelecimento e de atividade entre os agentes económicos e a sã̃ concorrência. Embora não proíba expressamente o monopólio convencional, este não se compagina com a premissa da concorrência.
É de admitir a interpretação de ressalva em relação à vedação do monopólio natural. Na verdade, este pode ser visto como algo positivo para o mercado, se entendido como aquele que decorre da impossibilidade física da mesma atividade económica ser realizada por mais de um agente. Tal ocorre na circunstância em que a maximização de resultados e a eficiência de recursos apenas são alcançadas quando a exploração se dá em regime de exclusividade.
Em Cabo Verde, como a nível global, as infraestruturas de telecomunicações de base e não replicáveis envolvem custos de investimento de tal forma elevados que não há como estabelecer competição na sua gestão e exploração. A sua duplicação é, senão impossível, pelo menos irracional do ponto de vista económico, financeiro e até urbanístico. Por isso, a sua exploração e gestão podem ser caracterizadas como sendo de monopólio natural, o que não impede a pluralidade de prestadores de serviços que necessitam dessa infraestrutura.
Sobre a concessão feita, é importante fazer as seguintes considerações:
As lições que se podem retirar dos vinte e três anos e quatro meses do percurso da concessão dos serviços públicos de telecomunicações sugerem que: