A cantora e compositora encolheu o dia 15 de Abril - mês pressupostamente dedicado à música em Cabo Verde – para de novo se mostrar à ilha de Santiago.
Porém, o que queria sublinhar – a mais do lançamento do disco – é sobretudo o poder do arriscar, perseguir e traçar caminhos com focos bem definidos quando de música falamos.
E como os nossos jovens precisam, pois se o poeta um dia terá dito “em cada esquina um amigo”, adaptando a Cabo Verde, quase que diria – em cada esquina um novo/potencial músico.
Senão vejamos:
Ellah Barbosa há pouco mais de meia dúzia de anos fazia os palcos dos espaços musicais e restaurantes da cidade. Aí claramente demarca-se sobretudo pela sua voz – num timbre falso-doce, muito linear e sempre muito natural. A voz de Ellah na verdade embrulha-se n`ela num bucólico considerável. É o tipo de cantora que canta “sem esforço” …
Mas, voltando ao arriscar da artista – ao sentir que a sua voz podia abrir asas e voar …muda-se para Lisboa onde dá logo nas vistas.
Por entre trabalhos com Dino Santiago e Branko, conhece Madonna que a convida para tournée. As aprendizagens multiplicam-se e a valorização enquanto artista é cada vez maior.
Ellah cresce, ganha status de palco, e torna-se numa frontman marcante.
Show após shows, tours após tours e várias participações com músicos de renome é o momento de oferecer-nos o seu primeiro disco. Talvez fizesse sentido fazê-lo em palcos internacionais…, mas não. Ellah prefere lançá-lo em Cabo Verde na ilha que canta docemente, chamando-o “Santiago di meu”
Porém não para o arriscar. É desafiada pelo colectivo de produtoras recém-criado e que se dedica a espetáculos conceptuais e intimistas e…Ellah aceita. Porque não, se o colectivo 5th Stage Sessions também arrisca para trazer novos conceitos aos nossos palcos?
Chega então a parte da banda. A linha da coerência continua a cozer os planos de Ellah. Para acompanhá-la no espetáculo. Dois jovens músicos foram os escolhidos: a criativa guitarra de Phil Araújo, que apesar dos seus vinte e poucos anos já traz com ele uma mistura de liberdade e alma (talvez a que recolheu da Fender com que tocou e que já vinha de músicos de renome da geração dos seus pais/avós). Phil Araújo arriscou e fez com que o risco de Ellah fosse nulo.
Se Phil Araújo trazia a criatividade e liberdade, Héber Santos trouxe a racionalidade da programação electrónica e as sonoridades das teclas que fizeram a cama musical para a guitarra de Phill e os poemas de Ellah.
Ellah, arriscou e mostrou que o arriscar/confiar faz parte do processo musical. As zonas de conforto já não existem na música, e os músicos que insistem neste vácuo, deverão questionar-se com valente introspeções. O mundo da música é rápido e requer adaptações e revoluções.
E assim o mostrou Ellah Barbosa, que na sua poesia falou-nos dos caminhos que traçou, de amor e admiração, de lugares e acima de tudo “di si Santiago” num misto em doses certas de tradição e contemporâneo, em estética marcante. Sim – é possível e necessário o risco para a (r)evolução da nossa música. Para nós, para a geração mais nova, para a partilha e para que as coisas não aconteçam sempre da mesma maneira – para uma música Cabo-verdiana urbana e mundial…
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1064 de 20 de Abril de 2022.