Esse repositório é também ativo e atuante ao nível internacional, participando em redes de mobilidade docente para ensino, divulgação da investigação, chegando, muitas vezes, a dirigir essas redes.
Pese embora essa evolução, os docentes da Uni-CV têm assistido, com muita preocupação, aos sucessivos estádios de estagnação na sua carreira e as correspondentes consequências. Decorrente disso não é surpreendente um quadro de pessoal docente em que, à exceção de um único professor associado, todos os restantes professores doutorados da Uni-CV são professores auxiliares, o que colide legalmente com os estatutos da carreira em vigor; registando-se que, uma parte significativa dos docentes na categoria de professor auxiliar vêm desempenhando tarefas que são reservadas aos professores titulares, concretamente, a preparação de programas; a coordenação pedagógica; a coordenação científica; a orientação de docentes, estudantes e alunos de pós-graduação; a definição dos projetos científicos; a participação em júris de provas e concursos públicos; a participação nas atividades do conselho científico da respetiva área de conhecimento.
Denota-se que as entidades responsáveis, desde as diversas equipas reitorais até à superintendência do Ministério da Educação, não têm priorizado a criação de condições para o cumprimento das promoções e progressões, em tempo útil e oportuno, que são um direito consagrado na lei, mantendo-se os docentes e investigadores estagnados na carreira.
Deste modo, ainda se verifica a situação, desprestigiante para a Uni-CV e para o país, de não haver paridade de categorias entre os académicos de Cabo Verde e os seus homólogos estrangeiros, situação que se torna absurda no caso de reitores, vice-reitores, presidentes de unidades orgânicas, diretores de cursos de pós-graduação ou diretores de investigação, uma vez que esses cargos e funções são desempenhados nas instituições parceiras por professores catedráticos (titulares) e associados.
Este contexto de circunstâncias tem estado na ordem das agendas reivindicativas da classe docente nos últimos anos e demandava a revitalização da Associação dos Docentes e Investigadores da Universidade de Cabo Verde (ADIUNICV), criada em 2014, entretanto, inativa durante anos por conta de vicissitudes diversas. Enquanto única organização dos docentes e investigadores da Uni-CV, esta associação tem por fins defender o livre, digno e qualificado exercício das atividades de ensino, investigação e extensão universitária, colaborar no desenvolvimento e aperfeiçoamento da organização da docência, pugnar pela gestão democrática da Uni-CV, devendo, conforme estipulado no seu estatuto:
a) Defender os direitos, interesses e prerrogativas dos docentes e investigadores e, especialmente, reivindicar as condições adequadas ao exercício das tarefas de docência e investigação;
b) Promover um ambiente de estudo, debate e questionamento de problemas concernentes à vida académica e à sociedade em geral através da realização de eventos científicos sobre temáticas da atualidade;
c) Zelar pela função social, dignidade e prestígio da docência, contribuindo para a promoção da formação profissional e o aperfeiçoamento técnico pedagógico dos docentes/investigadores da Uni-CV;
d) Colaborar na defesa de valores éticos e morais, especialmente aqueles relativos aos princípios da liberdade de pensamento e consciência, da igualdade, da solidariedade e de defesa dos direitos humanos;
e) Promover diligências junto dos poderes competentes visando a valorização do trabalho académico e da carreira dos docentes/investigadores;
f) Contribuir para a defesa de uma participação plena e efetiva dos docentes/investigadores nos processos decisórios da Uni-CV;
g) Promover e reforçar a integração e a solidariedade entre os docentes/investigadores da Uni-CV, de modo a fomentar uma consciência profissional e de classe;
h) Promover intercâmbio científico, cultural e social com instituições congéneres, nacionais, estrangeiras ou internacionais;
i) Estabelecer parcerias com organizações que partilham a mesma visão e confluem para os mesmos objetivos da Associação; e
j) Representar os seus associados junto da Uni-CV e de outras entidades.
Na persecução destes objetivos se fundamentam as linhas estratégicas de nova largada formalizada no passado dia 16 de novembro do ano corrente. Os corpos sociais empossados têm o desafio de fixar a presença da ADIUNICV no panorama universitário nacional e, decorrente deste feito, trabalhar continuamente para o seu enraizamento. A metodologia desse trabalho sustenta-se no envolvimento participativo com o intuito de promover um compromisso autêntico, optimizador da ação; na aplicação de valores democráticos, a fim de desenvolver atitudes críticas no seio da associação; e no reforço da contribuição simultânea para o desenvolvimento da investigação científica e para a transformação social.
Na escala macro-societal, a nova equipa dirigente ambiciona a apresentação da ADIUNICV como uma plataforma comunicacional a partir da qual a sociedade poderá inteirar e beneficiar dos feitos e dos desafios da docência e da investigação feitas pelos seus membros. Na escala meso/institucional, o propósito é constituir a ADIUNICV como uma «unidade de diferenças» capaz de representar os seus membros com sentido ético, comprometimento, e justeza, perante os outros públicos da academia, no combate pelo desenvolvimento e pela modernização da Uni-CV. Na escala micro/individual, o objetivo desta equipa é o reforço anímico do sentido de dignidade pessoal do docente e do investigador e a promoção de iniciativas propiciadores de intensificação da profissionalização e da emancipação critica dos seus associados.
Contudo, os novos corpos sociais têm presente que, o espaço universitário cabo-verdiano se configurou, na sua génese, como um espaço em que a «vocação para a ciência» foi enquadrada pela «vocação para a política», e que este estado de coisas se tem tornado anacrónico e desafiante à medida que se impõe nas decisões políticas nacionais a necessidade de articular, de forma prática, a ciência com o desenvolvimento. O trabalho científico requer mais intensamente a autonomização da esfera académica, entendida não como fechamento, mas como assunção plena e livre de uma criatividade criadora e socialmente responsável. Porém, disso é decorrente a efetivação dos académicos, cientistas e investigadores como agentes do saber/poder.
Neste sentido, a reativação da ADIUNICV é uma oportunidade de responder a necessidade de alinhamento entre agentes, organizações/instituições e subsistemas sociais que tomam o ensino superior como horizonte de operações. Se as oportunidades são imensas, e a evolução e a complexificação das valências dos docentes e investigadores da Uni-CV constituem as principais forças da reativada associação, como ponto mais fraco a seu desfavor aparece a descrença na cultura associativa entre os académicos, enquanto a principal ameaça advém do facto da Uni-CV comportar um campo académico estruturado pelo individualismo egocêntrico.
Os estímulos/desafios são, seguramente, multidimensionais, e fazem da reativação da ADIUNICV uma empreitada ainda mais aliciante.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1148 de 29 de Novembro de 2023.