A Escassez de Mão-de-Obra Qualificada e o Impacto no Setor da Construção em Cabo Verde

PorArmindo Duarte,28 jul 2025 7:48

Armindo Duarte  - Economista/Consultor
Armindo Duarte - Economista/Consultor

A construção é um dos principais impulsionadores da economia de qualquer país, na medida em que cria empregos, gera rendimentos e contribui para a riqueza do país. A qualidade das infraestruturas é um dos indicadores que é utilizado pelas instituições internacionais para avaliar o nível de desenvolvimento económico e social de qualquer país.

A construção em Cabo Verde registou um boom de crescimento de 37,9% no período 2017/2019, contraiu 14,3% no período 2020/2022 devido aos efeitos da pandemia da Covid -19 e registou uma relativa estabilização no período 2023/2024, ao contrair apenas 2,7%, na sequência do plano de recuperação económica implementado pelo governo no período pós-pandemia.

O fraco desempenho da construção em análise, reflete o fraco investimento feito no setor, numa conjuntura marcada pelo aumento dos custos de fatores de produção (principalmente associado ao aumento dos preços das importações, porque a maior parte dos materiais usados no setor são importados), aliado a escassez de mão-de-obra, uma procura interna mais moderada e a incerteza decorrente das tensões comerciais e geopolíticas.

No período 2017/2024, a construção em Cabo Verde contribuiu com 42,8% para o desenvolvimento do setor indústria e 4% para a formação do PIB, respetivamente, o que demonstra a importância que o setor tem na economia do país. Finalmente, a construção tem sido um dos principais geradores de emprego em Cabo Verde, tendo o setor empregue 21.935 trabalhadores, em termos médios, no período 2017/24, correspondendo a 54,5% do emprego do setor secundário e 11,3% da população ativa do país. A importância da construção não se limita apenas aos seus efeitos diretos sobre a atividade económica, mas também tem efeitos no estímulo da atividade e do emprego em muitos setores produtivos que atuam como fornecedores de bens intermédios para o setor da construção, como são os casos do saneamento, eletricidade, climatização, marcenaria industrial, etc.. Finalmente, a construção contribui para o aumento das receitas do estado, porque o setor paga impostos.

A mão-de-obra qualificada é crucial para o desenvolvimento da economia do país, em geral, e para o setor da construção civil, em particular. Com efeito, profissionais qualificados garantem que os projetos sejam implementados com eficiência, precisão e segurança. Não existem dados sobre o déficit de mão-de-obra qualificada no setor. O INE informou que somente agora é que irá efetuar um estudo sobre esta problemática. No entanto, contactando profissionais do setor, a maioria afirma que a Escassez de Mão-de-Obra é transversal a toda a economia cabo-verdiana, os seus efeitos já são visíveis, atingindo com maior incidência os setores da construção, hotelaria, turismo e transportes. A escassez de mão-de-obra tem impactado projetos em Cabo Verde, levando empresas a buscar soluções criativas para garantir a conclusão oportuna e eficiente de suas obras. A falta de mão-de-obra qualificada impacta negativamente a economia de qualquer país, impactando, de forma significativa, o setor da construção civil, na medida em que provoca atrasos em projetos, aumenta os custos, compromete a qualidade das construções, dificulta a inovação e modernização do setor e impede que as empresas se mantenham competitivas no mercado.

I. Causas da escassez de mão-de-obra qualificada

Os factores que estão na origem da escassez de mão-de-obra no país são os seguintes:

a) Quando os sistemas educacionais não oferecem programas técnicos e vocacionais adequados para preparar os jovens para as exigências do setor, aliado a ausência de investimentos em centros de formação e a falta de currículos atualizados que incluam novas práticas sustentáveis e tecnologias, agravam o problema.

b) Muitas vezes, os profissionais qualificados são atraídos por melhores condições de trabalho oferecidas por outros segmentos, como salários mais altos e oportunidades de crescimento profissional. A Globalização simplifica a migração para os países onde a procura por mão-de-obra qualificada é alta e as condições mais favoráveis (veja-se o caso da emigração em massa de Cabo Verde para a Europa nos últimos anos, com maior incidência Portugal).

c) Muitos trabalhadores experientes estão se aposentando e não há jovens suficientes entrando para substituir essa mão-de-obra. Com a saída desses profissionais, se perde mão-de-obra, o conhecimento e a expertise que eles oferecem. Sem programas eficazes de transferência de conhecimento e sem atrair novos talentos, a construção civil enfrenta desafios crescentes para manter a eficiência e qualidade.

II . Impactos Económicos

Os impactos económicos que a escassez de mão-de-obra qualificada provoca na construção são os seguintes:

a) A falta de trabalhadores suficientes pode provocar a atrasos na conclusão de obras, gerando prejuízos financeiros e afetando prazos.

b) Com menos profissionais disponíveis, aumenta a procura por mão-de-obra, aumenta os salários e, consequentemente, os custos de construção.

c) A falta de profissionais qualificados pode resultar em obras com menor segurança e com menor durabilidade.

d) A escassez de mão-de-obra qualificada dificulta a adoção de novas tecnologias e processos, o que impede a modernização do setor.

e) Finalmente, empresas terão dificuldades em encontrar e reter profissionais qualificados e, consequentemente, podem ter problemas em ser competitivas.

Todos os pontos anteriormente referidos impactam negativamente o Setor Construção e, consequentemente, a contribuição do mesmo para o desenvolvimento do Setor Indústria, para a Riqueza Nacional e para o Emprego.

III. Soluções e Medidas para Mitigar o Problema da Escassez de Mão-de-Obra

Tendo em conta as consequências nefastas que tem para a economia do país, torna-se crucial que as autoridades do país, em parceria com outros Parceiros Sociais (Câmaras Municipais, Instituto de emprego e Formação Profissional, Associações Profissionais, Escolas Técnicas, Câmaras de Comércio, etc.), implementem, um conjunto de medidas de política económica que têm como objetivo mitigar os seus efeitos a nível do setor e consequentemente a nível da economia nacional. De entre essas medidas, recomenda-se as seguintes: valorização da profissões, investimento em formação, parcerias entre empresas e instituições de ensino, incentivos fiscais e promoção de projetos locais. Para tal deve-se:

a) Criar condições para atração e retenção de talentos, assentes em melhores salários e melhores condições no ambiente de trabalho. Por sua vez, torna-se necessário valorizar as profissões da construção civil, mostrando que existem oportunidades de carreira promissoras e com um papel importante no desenvolvimento económico.

b) Investir na formação profissional inicial e na formação contínua para qualificar novos trabalhadores e atualizar os conhecimentos dos profissionais já existentes. Cabo Verde detém uma população jovem, o que representa uma vantagem competitiva no mercado do trabalho, quando comparado com os países desenvolvidos, cuja população é envelhecida. A taxa de desemprego no país é baixa, cerca de 8% em 2024. No entanto, o desemprego jovem (faixa etária dos 15-35 anos) é muito elevado no país, cerca de 20,1% da população jovem (15-35 anos), atingindo com maior incidência, a faixa etária dos 15-25 anos, que representa cerca de 55,4% do desemprego jovem. A utilização eficiente e eficaz deste recurso precioso poderá constituir um fator crítico de sucesso que deve ser utilizado para mitigar a escassez de mão-de-obra no país, em geral, e no setor da construção civil, em particular. Para o efeito, deve-se priorizar a aposta na formação contínua da população jovem que está desempregada, qualificando-a para o mercado de trabalho, tendo sempre como objetivo principal, a mitigação dos problemas da escassez de mão-de-obra no país. Caso a mão-de obra no país não for suficiente para a resolução do problema da escassez de mão-de-obra, complementarmente, deve-se recorrer à mão-de-obra da CEDEAO (costa ocidental africana, com destaque para os Palops), tendo em conta que nos seus países de origem auferem salários e condições no ambiente de trabalhoinferiores aos praticados em Cabo Verde.

c) Estabelecer parcerias entre Empresas e Universidades, Instituto de Emprego e Formação Profissional, Escolas Técnicas e Outros Instituições de Ensino, tendo por objetivo facilitar a formação de mão-de-obra qualificada e direcionada para as necessidades reais do mercado.

d) As autoridades do país devem empreender políticas assentes na oferta de incentivos fiscais para apoiar as empresas que investem em formação profissional e contratação de mão-de-obra qualificada.

e) O Governo deve criar condições de financiamento favoráveis para empresas que priorizem a automação e a inovação tecnológica no setor.

f) Finalmente, o Governo Central e as Câmaras Municipais devem estabelecer parcerias, visando promover projetos de construção a nível local, política essa que poderá ajudar a fixar trabalhadores e revitalizar as comunidades locais.

Conclusões

Em suma, a Escassez de Mão-de-Obra na Construção é um Desafio Complexo e Multifacetado que requer uma abordagem holística e colaborativa para ser solucionada. À medida que a procura por projetos de construção continua a crescer, torna-se crucial que as empresas e os governos trabalhem juntos para desenvolver soluções sustentáveis, que garantem uma oferta adequada de mão-de-obra, no futuro. Com investimentos em formação, educação, e tecnologia, podemos mitigar os desafios da mão-de obra em Cabo Verde.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1234 de 23 de Julho de 2025.

Concorda? Discorda? Dê-nos a sua opinião. Comente ou partilhe este artigo.

Autoria:Armindo Duarte,28 jul 2025 7:48

Editado porSara Almeida  em  28 jul 2025 8:08

pub.
pub
pub.

Últimas no site

    Últimas na secção

      Populares na secção

        Populares no site

          pub.