“Temos a missão de servir, no caso da Ribeira Grande, os munícipes, e o governo, os cabo-verdianos”

PorAntónio Monteiro,28 jan 2023 9:38

Nelson Moreira, presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande de Santiago
Nelson Moreira, presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande de Santiago

Nas vésperas do Dia do Município, que se comemora na próxima terça-feira (31), o edil ribeira-grandense faz um balanço positivo do seu mandato, apontando a pobreza, a dispersão territorial, a seca prolongada, a requalificação ambiental e urbana, o custo da patrimonialidade e a baixa arrecadação de receitas próprias como factores que têm dificultado a implementação da sua agenda governamental. Nelson Moreira regozija-se com a retoma “dentro de dias” das obras da Orla Marítima que, nas suas palavras, irá capitalizar ainda mais a zona classificada Património Mundial.

Na última entrevista que concedeu a este jornal enumerou o défice habitacional, o desemprego jovem e a questão do saneamento como os principais desafios para o município. Como está a situação neste momento?

Os desafios ainda são enormes, nomeadamente a pobreza, a dispersão do território, a seca prolongada, a requalificação ambiental e urbana e temos o custo da patrimonialidade. Outro grande desafio é a baixa arrecadação de receitas próprias. Temos também algumas incertezas a nível da geopolítica. Tudo isso dificultou de certa forma nossa implementação da agenda governativa municipal.

A nível do défice habitacional no município que passos já foram dados para colmatar esta lacuna?

Neste momento, tendo em conta os parcos recursos do município, o défice habitacional ainda continua a ser um dos grandes desafios, porque, como o défice é elevado, e a arrecadação diminuta, esta situação dificulta ainda mais a sua resolução. Vamos continuar a trabalhar junto dos nossos parceiros, nomeadamente o governo e outras entidades para debelar este problema. Tratando-se de um problema estrutural, não será fácil resolvê-lo num curto espaço de tempo.

Na mesma entrevista, há um ano, disse que o objectivo da Câmara era criar novas centralidades para tirar a pressão sobre o Centro Histórico da Cidade Velha. Vejo que o projecto não saiu ainda da gaveta.

Efectivamente estamos a avaliar a situação, ao mesmo tempo que continuamos a falar com os nossos parceiros, nomeadamente alguns herdeiros para fazerem encontro de contas. Mesmo a nível legal, com as infraestruturações, a Câmara conseguiu sempre alguns lotes de terreno. A título de exemplo, numa das parcerias com um privado conseguimos algum terreno onde seráconstruído o novo Centro de Saúde e, em princípio, uma nova zona administrativa. Mas ainda a dimensão dos terrenos não é a desejável, mas continuaremos a trabalhar para conseguirmos mais terrenos.

A CMRGS assinou recentemente um novo contrato-programa com o ministério do Turismo no valor de 32 mil contos para a retoma das obras da Orla Marítima. Por que se tornou necessária a assinatura de um novo contrato, se este projecto já tinha financiamento?

É que inicialmente a CMRGS tinha assinado um contrato-programa em 2019, mas, com a pandemia e devido à inflação provocada pela guerra na Ucrânia, os valores do contrato revelaram-se desfasados no tempo. Então houve necessidade de actualizar o contrato para a retoma e conclusão das obras da Orla Marítima.

Quando arrancarão os trabalhos?

Assinamos o contrato no dia 19 de Janeiro. Acredito que nos próximos dias será feito o desembolso, o empreiteiro já está encaminhado e, portanto, é uma questão de dias.

Que mais-valia e competitividade a Orla Marítima irá trazer ao destino Cidade Velha?

Bom, vai ser mais uma infraestrutura de certa atractividade que irá permitir alguma dinâmica económica, pois trata-se de um lugar com uma vista magnífica para o mar. Acho que irá atrair muitos visitantes não só nacionais como turistas estrangeiros que vão justamente permitir essa dinâmica económica.

À Cidade Velha não têm faltado pojectos. No mês de Janeiro do ano passado, para capitalizar ainda mais o valor do sítio histórico, o ministro da Cultura apresentou três projectos avaliados em 17 mil contos. Que impacto tiveram?

Acho que não sou a pessoa mais indicada para falar desses projectos, pois não foram assinados directamente com a Câmara. Então, para não dar informações desfasadas, remetia esta questão para o ministério da Cultura, ou para o Instituto do Património Cultural. O que podemos responder neste momento são os projectos que foram canalizados para a Câmara e que fazemos a gestão directa.

No âmbito do Programa Operacional do Turismo (POT), financiado pelo Banco Mundial e pelo Governo em cerca de 1,7 milhões de dólares há um vasto programa de requalificação ambiental e urbana da Cidade Velha. Quando é que arrancam as obras?

Neste momento o projecto que está em curso ou que vai ser financiado pelo Banco Mundial e pelo governo de Cabo Verde tem a ver com alguma requalificação da Cidade Velha, porque qualquer visitante que chega à Cidade Velha salta-lhe à vista que a entrada no sítio histórico não é das melhores, mesmo o acesso. Então, há necessidade de requalificar toda a Rua Calhau para limitar um pouco o tráfico dentro do sítio histórico. Para isso há necessidade da construção da circular que liga Bota Rama/Barragem de Salineiro para criar novas centralidades e aliviar a pressão de veículos pesados no Centro Histórico da Cidade Velha. De facto, há um engajamento do ministro do Turismo nestes projectos [Plano de Salvaguarda da Cidade Velha; Requalificação do Centro Histórico (Largo da Rua Calhau, Pelourinho, Rua Banana e Rua Carreira); Requalificação do Bairro de São Sebastião e acesso pedonal à Fortaleza Real de São Filipe] mas na nossa modesta opinião entendemos que de maneira nenhuma deve-se condicionar as acções de requalificação da Cidade Velha ao Plano de Salvaguarda, considerando que não estamos a começar do zero, porque já temos alguns instrumentos de gestão e podia-se perfeitamente avançar com as obras. Mas pelo menos há abertura do ministro do Turismo e de outros ministros no sentido de se ver essa possibilidade. Entendemos também que qualquer intervenção na Cidade Velha terá que ser célere, tendo em conta que estamos numa cidade Património Mundial e que abrange uma área relativamente pequena. Também entendemos que as obras poderão acontecer numa forma faseada, programada, localizada, nas áreas mais críticas.

Ainda nada arrancou?

Ainda nada arrancou. Por isso é que eu tenho dito que o prazo deve ser encurtado, porque, de acordo com o cronograma, esse financiamento poderá só acontecer em 2025. Por isso, o prazo é demasiado longo, mas pelo menos, como disse atrás, há sensibilidade e abertura para encurtarmos esse prazo. Porque as expectativas dos ribeira-grandenses, dos santiaguenses e dos cabo-verdianos estão elevados em relação à Cidade Velha que é Património Mundial da Humanidade. Então há a necessidade de acelerarmos os passos para que essas obras aconteçam a curto prazo. Porque, se já temos um orçamento e se já temos um financiador, não podemos adiar as obras para daqui a um ano e tal, a dois anos.

Temos a informação de que a Sé Catedral vai ser reconstruída. Segundo um especialista corre-se o risco de cometer uma grande asneira. Qual a sua opinião sobre este projecto? Foi consultado?

Neste momento, de acordo com o ministro da Cultura, já há um projecto para ser submetido ao financiamento. Mas não tenho detalhes específicos do projecto. Na minha modesta opinião, entendo que os monumentos devem ter vida. Ou seja, devemos conservar e preservar os monumentos, mas também dá-los vida, porque só as quatro paredes da Sé Catedral, não são, até certo ponto, atractivos. Por isso, acho que é necessário realizar um fórum para debater as várias opiniões sobre o assunto, auscultar os especialistas na matéria para se poder encontrar a melhor solução. Mas entendo também que há-que dar vida aos monumentos e acredito que a sua reconstrução poderá ser também uma mais-valia para a Cidade Velha. Agora é necessário avaliar os custos e os benefícios.

Como tem sido o relacionamento entre o Governo Central e a CMRGS, tratando-se de uma Câmara de cor política diferente?

A nível do relacionamento não temos motivos de queixa. Considero que é uma relação boa. Vamos continuar a trabalhar, pois temos a missão de servir, no caso da Ribeira Grande, os munícipes, e o governo os cabo-verdianos. Entendo que há necessidade de racionalizar ao máximo os recursos que são dos cabo-verdianos no sentido de contribuir para o desenvolvimento do município e de Cabo Verde, porque caso a Cidade Velha conseguir atingir um novo patamar de desenvolvimento, estamos ao mesmo tempo a contribuir para o desenvolvimento de Cabo Verde. Por isso, da nossa parte trabalharemos no sentido de continuar a preservar essa relação institucional para o bem dos munícipes da Ribeira Grande.

Que projectos tem em carteira até o final do mandato?

Neste momento temos vários projectos, nomeadamente a nível da requalificação, a nível da infraestruturação desportiva, a nível da formação, entre outros. Temos vários outros projectos em curso. Mas neste momento a nossa maior dificuldade tem a ver com a arrecadação de receitas para a implementação desses projectos em diversas áreas. A arrecadação de recursos não tem ajudado na implementação da nossa agenda, mas acreditamos que até 2024 conseguiremos implementar grande parte desses projectos.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1104 de 25 de Janeiro de 2023.

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Autoria:António Monteiro,28 jan 2023 9:38

Editado porJorge Montezinho  em  30 jan 2023 12:09

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